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Jornalistas negras lamentam morte de Glória Maria: 'Abriu portas'

Nataly Simões

Colaboração para Splash, em São Paulo

02/02/2023 12h26

Glória Maria deixou um legado para muitas jornalistas negras que decidiram seguir a carreira após vê-la brilhar na televisão.

A apresentadora da Globo, que estava afastada da programação desde dezembro, morreu hoje no Rio de Janeiro. Ela estava em tratamento da metástase de um câncer, descoberto pela primeira vez em 2019.

A colunista de Splash Aline Ramos destaca o pioneirismo e os desafios enfrentados por Glória Maria enquanto uma profissional negra:

A Glória Maria foi a primeira em muitas coisas. Ela foi a primeira repórter negra da televisão brasileira, a primeira a aparecer no Jornal Nacional e a primeira a lidar com tantas situações de racismo no trabalho.

O Mais Você da manhã desta quinta-feira (2) exibiu o trecho de uma reportagem feita por Glória Maria na década de 1980, em que ela relata ter sido impedida de entrar em um hotel por ser negra. "Preto aqui não entra", ouviu a repórter da Globo, que denunciou o caso na delegacia e em rede nacional.

Aline Ramos acrescenta que mulheres e homens negros que trabalham na imprensa ainda precisam lidar com o racismo no dia a dia, mas não abaixam a cabeça inspirados em figuras como Glória Maria.

Era esse tipo de situação que ela enfrentava no trabalho e é um desafio que muitos jornalistas enfrentam até hoje. Toda jornalista negra tem um dedinho da Glória Maria ali, que abriu portas e possibilitou o sonho.

Dedicada ao trabalho e para provar que era uma boa profissional, Glória Maria precisou renunciar, muitas vezes, à vida pessoal, conforme aponta Luciana Barreto, apresentadora da CNN Brasil.

Glória Maria enfrentou tudo isso numa trajetória de muita solidão, a custa de muita renúncia talvez de saúde física e mental. Não podemos mais permitir que outros jornalistas passem por isso.

Basília Rodrigues, analista política também da CNN, recorda que quando decidiu estudar jornalismo foi alertada pelo pai de que eram poucas as mulheres negras que se destacavam na área, mencionando Glória Maria, mas isso não a desestimulou.

A Glória Maria é um ícone para nós jornalistas negras. Ela representava a possibilidade real de uma mulher negra ser vista pela sua capacidade. Quando eu decidi fazer jornalismo, meu pai tentou me desestimular a seguir a carreira por não ter muitos jornalistas negros na televisão, a primeira que ele citou foi a Glória.

Cris Guterres, colunista de Universa e apresentadora da TV Cultura, também se espelhou em Glória Maria e teve a chance de contar isso a jornalista.

Foi vendo a Glória Maria que eu vi que podia sonhar em ser jornalista e apresentadora de televisão. Isso não tem preço e eu tive a oportunidade de contar isso para ela. Hoje, aqui em São Paulo, eu e outras jornalistas negras temos um grupo chamado 'herdeiras de Glória Maria'.