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Por que capa de álbum de Gal Costa foi censurada pela ditadura militar

Gal Costa - Julia Rodrigues / Divulgação
Gal Costa Imagem: Julia Rodrigues / Divulgação

De Splash, em São Paulo

09/11/2022 13h01

Sexto álbum de estúdio da carreira de Gal Costa, "Índia", lançado em 1973, teve a capa censurada pela ditadura militar que vigorava no país. O disco, produzido por Gilberto Gil, era vendido envolto em um plástico azul, depois de os censuradores vetarem as imagens sensuais escolhidas pela cantora para a capa e contracapa do projeto.

Na parte da frente, Gal só de tanga vermelha, com close na parte de baixo, mostrando colares e uma saia indígena sendo retirada. Na contracapa, a foto trazia a parte de cima de Gal, com os colares cobrindo parcialmente os seios da cantora.

A censura acabou, mas alguns atos burocráticos do período não haviam sido oficialmente revertidos até poucos anos atrás. Em 2015, quando a censura à capa de "Índia" foi oficialmente derrubada, Gal Costa compartilhou a foto nas redes sociais e celebrou.

"Capa do disco Índia censurada nos anos 70 e agora liberada para nosso deleite, incluindo o meu", escreveu a cantora no Instagram. Sucessos como "Da Maior Importância" e "Índia" fazem parte do álbum.

Em 2018, em entrevista ao jornal "O Estado de S.Paulo", o diretor artístico Roberto Menescal relembrou o diálogo que teve com a censora Solange Hernandez. Ele conta que não tinha entendido por que tinha sido chamado para falar sobre o álbum de Gal, já que, a seu ver, as letras das músicas não continham mensagens que o regime autoritário tenderia a vetar.

"Ela disse que não aprovaria de jeito nenhum. 'Pô, uma artista com os seios de fora?', e eu respondi 'Mas é uma índia! Você quer que a índia esteja de sutiã?'", relatou Menescal ao jornal. O plástico azul cobrindo a capa foi o acordo fechado entre a gravadora e a censora

Contracapa do álbum 'Índia', de Gal Costa - Antonio Guerreiro/Reprodução Instagram @galcosta - Antonio Guerreiro/Reprodução Instagram @galcosta
Contracapa do álbum 'Índia', de Gal Costa
Imagem: Antonio Guerreiro/Reprodução Instagram @galcosta

No final, o tiro acabou saindo pela culatra. A gravadora espalhou a notícia de que o álbum de Gal tinha sido censurado pela ditadura, por isso a capa ia sair coberta.

Foi a primeira vez em que um disco saiu com a embalagem lacrada. Aí que todo mundo queria mesmo comprar para ver o que tinha de tão polêmico. Foi uma verdadeira corrida às lojas, demos até disco de ouro e de platina para a Gal", recorda Armando Pittigliani, que era diretor de marketing da gravadora.

General Costa?

Se dependesse de Caetano Veloso, você provavelmente não conheceria Maria da Graça Costa Penna Burgos como Gal Costa. Nas conversas para o lançamento da cantora no final dos anos 1960, uma possível leitura do nome artístico de Gal incomodava Caê.

Segundo o projeto Memórias da Ditadura, do Instituto Vladimir Herzog, Caetano Veloso se incomodava com o fato de "Gal" ser usado como abreviação para general, em plena ditadura militar. Piorava ainda mais a sua situação o fato de o então ditador presidente ser o general Artur da Costa e Silva, o general Costa, o gal. Costa.

"Caetano não gostou: Gal era abreviatura de General. E, naquele momento, Gal Costa tornava-se homônimo do então presidente Gal. Costa e Silva. Se fosse para chamar Gal, que fosse apenas Gal, sem nenhum sobrenome. Não teve jeito. A cantora gostou da proposta e surgiu assim na capa do primeiro LP, Domingo, gravado em dupla com Caetano em 1967", diz trecho de conteúdo do projeto Memórias.

De acordo com os pesquisadores, o Gal com L inicialmente seria com U, "Gau", com é mais comum na Bahia. A mudança foi obra do produtor Guilherme Araújo, que considerou que nacionalmente Gau poderia dar a impressão de ser um artista homem, não mulher.

Mas nenhuma das variações para o nome artístico, com U, com L ou sem sobrenome era como a cantora foi conhecida na juventude em Salvador. Seus amigos chamavam Maria das Graças, conta a história, de Gracinha.