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Autora usou experiência de 14 anos em TI para bombar seus livros eróticos

A escritora Mari Sales com algumas de suas obras na Bienal do Livro de São Paulo - Divulgação
A escritora Mari Sales com algumas de suas obras na Bienal do Livro de São Paulo Imagem: Divulgação

De Splash, em São Paulo

16/07/2022 04h00

Mari Sales migrou de uma área dominantemente masculina para um universo oposto. Aos 37 anos, a mato-grossense comemora o sucesso na literatura erótica, consumida principalmente por mulheres, depois de 14 anos trabalhando com TI (tecnologia da informação).

Com seis anos de carreira como escritora, são 86 livros publicados, 17 deles no formato físico. Foram esses títulos que a levaram à Bienal do Livro de São Paulo, na última semana, onde ela pode ter contato com fãs de suas obras, tirar fotos e distribuir autógrafos.

Engana-se quem pensa que hoje a escritora não usa mais toda a experiência que adquiriu com tecnologia. Esses conhecimentos foram essenciais quando ela decidiu transformar o hobby de escrever em trabalho.

Ao migrar de sua cidade natal, Cuiabá, para Campo Grande, Mari diminuiu sua carga de trabalho e acabou recuperando os livros que ficaram acumulados enquanto ela trabalhava de 12 a 14 horas por dia. O resultado? 300 livros lidos em um ano e uma ideia.

"Quem é da TI e mexe com desenvolvimento precisa absorver como que funciona a área. Nos livros, analisei padrões. Depois que fui fazer o curso de escrita percebi que eu já tinha captado informações de estrutura de escrita do que eu li só utilizando esses mesmos padrões da TI. O framework de desenvolvimento ágil que eu usava na TI, trouxe para a escrita", conta Mari Sales em entrevista a Splash.

Comecei a escrever. Era um hobby antigo que ficou perdido por eu mexer só com números e estar em um ambiente masculino. Mari Sales

Até que o destino fez seu papel. Mari foi mandada embora do novo emprego em Campo Grande e pediu para o marido segurar as pontas durante seis meses para que ela transformasse seu hobby de publicar livros na Amazon em algo rentável.

"O não da TI foi o meu sim da escrita"

"A escrita seria minha única forma de renda. A partir dali troquei o olhar para transformar em um produto. E deu certo. Com 'Família Valentine' tudo deslanchou". conta Mari, falando sobre o primeiro livro da série, "Benjamin", em que um milionário se envolve com uma desempregada apaixonada por livros que vai organizar a biblioteca da casa da família dele.

Escrevendo romances, Mari passou a ouvir mais o seu público, que pedia por conteúdo 'hot' (erótico), principalmente depois do boom de "50 Tons de Cinza", que ela define como "o divisor de águas para tirar os romances das bancas e mandá-los para as prateleiras".

"No início, tinha muita vergonha, tanto que meu primeiro livro, 'Superando Com Amor', não tem nada de 'hot'. Ele tem uma carga dramática até mais pesada. Só que como tinha contato com leitoras de 'hot', elas me cobravam. Tinha um certo pudor pelo julgamento, por ser mãe, por achar que iria me prejudicar. Mas quando entendi que estava escrevendo romance entre adultos e para adultos, perdi totalmente isso."

mari e fã - Divulgação - Divulgação
Escritora Mari Sales posa com fã na Bienal do Livro de São Paulo
Imagem: Divulgação

Para emplacar seus livros eróticos, a escritora também adotou uma técnica que aprendeu na TI. "Minha escrita é mais enxuta, os livros são fluidos. Trouxe um pouquinho da TI, a experiência do usuário. Como tornar a leitura uma experiência agradável? Minha estratégia foi fazer capítulos mais curtos e acabar um capítulo no meio de uma cena para dar interesse para ler o próximo. Trazer um conflito só, não vários, para não precisar de grandes estruturas. Minha marca é essa."

A estratégia deu certo e Mari conquistou números bastante consideráveis na plataforma digital da Amazon, que ela também aprendeu a mexer sozinha. São 180 mil e-books baixados e 163 milhões de páginas lidas na plataforma, 16 milhões somente da série de livros da Família Valentine. Até chamar a atenção do Grupo Editorial Portal, onde tem hoje 17 livros físicos publicados.

"Consegui triplicar meus números na época da pandemia, quando tive mais tempo para analisar. Fiz a parceria com a editora e todo mundo se ajuda. Tenho um grupo de incentivo para autores, o desafio Mari Sales, em que também trocamos informações. É uma plataforma democrática. Qualquer um que tenha dinheiro ou um pouquinho de conhecimento consegue publicar, explica."

A autora também usa a plataforma para observar tendências e entregar o que o público quer. "Como minha plataforma principal hoje é a Amazon, eu olho o que está sendo lido, quais são as temáticas, e tento pegar esse elemento —que seja um mafioso, CEO, romance de escritório— e escrevo uma história com esse elemento. Somos contadores de histórias, então eu não fico limitada a um tipo. Eu quero escrever vários temas."

Marido é o maior apoiador

Apesar de admitir que a maior parte do seu público é de mulheres, Mari conta que também é lida por alguns homens, principalmente quando inclui TI nas histórias.

"Já recebi feedback de homens. É mais raro, mas existe. Eles preferem meus livros quando eu abordo a área da TI. Como eu tenho o domínio dessa área, trago experiências que já vivenciei, porque é uma forma rica de mostrar isso. Minha própria vida é uma grande experiência."

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A escritora Mari Sales autografa seus livros na Bienal do Livro de São Paulo
Imagem: Divulgação

Foi nessa área, inclusive, que ela conheceu o marido. O casal tem dois filhos e, atualmente, o parceiro é seu maior apoiador.

"Ele ficou preocupado num primeiro momento. Mas mostrei para ele minha estratégia e ele apoiou. Hoje ele é meu maior divulgador, até mesmo na família. Tem colegas de trabalho dele que quando lanço um livro ele já compartilha. Ele me ajuda a divulgar, sabe que é importante para mim, para ele e para a família inteira."

Cercada de mulheres, seja na Bienal do Livro, seja em seus papos virtuais com as leitoras, Mari diz que hoje sente que está onde sempre quis. E rechaça aqueles que falam mal de livros eróticos sem nunca terem consumido.

"É ruim? É bom? Não deveria nem ter essa questão. Tem gente que assiste futebol como hobby. Tem gente que vai ler. O bom da leitura é que exercita a mente, independentemente do que está sendo lido. Como tenho bons resultados não consigo dar tanto peso para esse preconceito. Fico até com dó [de quem critica] porque a pessoa não se permite fazer uma leitura para relaxar. "