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Diretor da série do PCC se assustou com o poder da facção

Macarrão, ex-dirigente do PCC - Divulgação
Macarrão, ex-dirigente do PCC Imagem: Divulgação

Fernanda Talarico

De Splash, em São Paulo

05/06/2022 04h00

O PCC é uma das facções criminosas mais famosas da América do Sul e, criada após o massacre do Carandiru, em outubro de 1992, se mantém organizada até hoje. Com tantas histórias, relatos e curiosidades, a minissérie documental "PCC: Poder Secreto" chegou à HBO Max nesta semana. Ao longo de quatro episódios, a produção desmistifica a organização e mostra quem são as pessoas que estão por trás e também quem são aqueles que tiveram seus destinos cruzados por ela.

Baseada no livro "Irmãos: uma história do PCC", de Gabriel Feltran, a série tem a direção de Joel Zito Araújo. Mesmo com tantos relatos chocantes e violentos expostos pela série, o diretor contou a Splash que o que mais o assustou durante o processo da de criação foi "o poder do PCC na periferia de SP''.

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"A facção é parte da vida cotidiana, e é até mesmo parte da cultura local de milhões de pessoas. A ideologia do PCC é uma das referências dos jovens nas comunidades. E influencia até mesmo a produção musical, a linguagem, e o comportamento dos jovens", explica.

Para ele, esta influência só existe por se tratar literalmente de uma facção organizada. "Desde o Marcola, o PCC procura se impor nas periferias pelas ideias, pelo assistencialismo, por ter a maioria dos seus integrantes com origem nas comunidades e saberem bem as dores e problemas de seus lugares de nascimento. Eles se alimentam da postura de muitos policiais que só aparecem como agentes repressores. E isto me impressionou muito, especialmente depois de ter morado por 17 anos no Rio de Janeiro e acompanhado a guerra nas comunidades cariocas e a violência das milícias e das diferentes facções criminosas."

"PCC: Poder Secreto" conta com a participação de diferentes pessoas que foram membros da facção, além de agentes do Estado que acabaram se envolvendo em investigações de crimes do grupo. Em seus depoimentos, eles relatam detalhes do funcionamento, da hierarquia e até mesmo das burocracias que acontecem.

Com tantos "segredos" revelados, era de se esperar que houvesse algum tipo de represália por parte de membros que não compactuam com a produção da série. No entanto, segundo Araújo, não houve nenhum tipo de ameaça. "A série é um trabalho de análise sobre um fenômeno social e político, não é uma série de denúncias de nenhuma pessoa ou grupo, seja criminoso ou policial. Evitamos o personalismo." Para ele, foi importante deixar claro para o entrevistado qual era o motivo da conversa e o objetivo do documentário.

"Fomos, o tempo todo, no 'papo reto', com todos e todas que entrevistamos não teve enrolação. Sabemos, como diz um entrevistado, que 'a palavra não faz curva na cadeia'. E deixamos claro, tanto para o PCC quanto para os agentes do Estado, que buscaremos um equilíbrio nos relatos e nas narrativas."

Um dos grandes nomes da organização que está presente na série é Orlando Mota Jr, o Macarrão, ex-dirigente do PCC. Suas declarações, segundo Joel Zito Araújo, foram as que mais o impressionaram, dada a quantidade de detalhes relatados por ele. Em contrapartida, o diretor diz que faltou à produção conseguir um depoimento exclusivo de Marcola, um dos principais líderes da facção. "Apesar da concordância dele, não foi possível incluir. Espero que a série tenha continuidade e que isto aconteça", lamentou.

Quanto à importância de "PCC: Poder Secreto", Araújo acredita que ela é capaz de "ajudar o Brasil a refletir sobre o equívoco do encarceramento em massa, sobre a desumanidade no tratamento dos presos". "Tudo isto só faz o PCC crescer, só aumenta o número de quadros da facção. Temos que ter uma política de respeito ao direito dos presos, e uma condenação da violência policial nas periferias."

Tratar com violência um jovem que vende um pacote de maconha, e até mesmo exterminá-lo por isto, só aumenta a revolta e a força do PCC.