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Leo Picon pode responder processo por chamar menino de traficante em vídeo?

Imagem: Reprodução/Instagram

Felipe Pinheiro

De Spash, em São Paulo

01/09/2021 13h13

Leo Picon pode ser processado após gravar e publicar um vídeo de uma criança em Recife. Na gravação, o influenciador digital e ex-participante do "De Férias com o Ex: Brasil" filma uma criança e comenta, dentro de um carro, que ensinaria os seguidores a conversar com um traficante da capital pernambucana. Ao postar o vídeo, ele ainda escreveu: "traficante de informaciones".

A reportagem de Splash ouviu especialistas em direitos humanos, que consideraram uma série de problemas na fala de Picon. Ao se referir à criança como "traficante", por exemplo, ele pode ser processado por calúnia, além de submeter a criança a vexame e constrangimento. A assessoria do influenciador foi procurada, mas até o momento não se manifestou. Após se defender, Picon voltou às redes sociais e, pelos Stories, se desculpou pela gravação do vídeo.

Pelo artigo 138 do Código Penal — "caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime" —, a pena é de detenção de seis meses a dois anos, e multa.

O advogado e especialista em direitos humanos Ariel de Castro Alves, além de citar o código penal, afirma que pelo artigo 232 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) o influenciador "submeteu o menino a vexame público e a constrangimento".

Segundo a jornalista Maria Carolina Trevisan, especializada em cobertura de direitos humanos e colunista do UOL, existe uma evidente atitude preconceituosa.

Realmente tem que ser processado. O preconceito que está envolvido nessa fala tem a ver com o território onde ele está, um território pobre. Está caminhando uma pessoa que na cabeça dele [Leo Picon] é um traficante. O que está no inconsciente coletivo do Brasil é que em território pobre vivem traficantesMaria Carolina Trevisan.

Outros artigos previstos no ECA foram violados, segundo observa Ariel. O artigo 17 diz que "o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais".

Exposição do rosto do menino

Na gravação, Leo Picon identifica o rosto do menino — ainda que ele esteja usando máscara. "Ele expôs a imagem da criança em condições desumanas, constrangedoras e vexatórias. Precisa responder processo na vara da infância e juventude do Recife por violações ao ECA", declara o advogado.

E pode responder processo de danos morais e materiais para indenizar o menino pelas violações de direitos humanos resultantes dos atos criminosos e ilícitos dele Ariel de Castro Alves.

Picon ainda pode ter desrespeitado o artigo 227 da Constituição Federal, que diz:

"É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".

Leo Picon se defende de polêmica em vídeos no Stories; após a repercussão negativa, ele se desculpou. Imagem: Instagram/@leopicon

Outros crimes possíveis

Leo Picon ainda pode ser investigado por crime de discriminação racial, já que o menino exposto no vídeo é pardo e possivelmente nordestino.

"É um menino nordestino, tem um outro preconceito sobreposto. Em relação aos direitos da criança e do adolescente, é uma violação criminalizar uma criança porque ela é pobre. Além disso, ele identifica a criança, expõe a uma atitude vexatória, criminaliza? Isso não pode ser considerado uma brincadeira", afirma Trevisan.

Violação de direitos humanos

Algumas pessoas querem aparecer a qualquer custo, mesmo violando os direitos de outras pessoas. Mas o direito à liberdade de expressão e comunicação não pode violar direitos humanos, principalmente de crianças e adolescentes, que pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, devem receber proteção integral — Ariel de Castro Alves.

O advogado também avalia que "as redes sociais se tornaram espaços de disseminação de ódio, discriminação e outras violações de direitos humanos".

Um eventual processo pode ser proposto por representação do conselho tutelar do Recife ou pela promotoria, com base em matérias da imprensa. Caso haja determinação da Justiça, o vídeo deverá ser retirado do ar.

Por que não é brincadeira

Após a repercussão negativa do vídeo nas redes sociais, e de receber uma enxurrada de críticas, Leo Picon gravou um novo vídeo se defendendo. Ele afirmou que o trecho da gravação foi tirado de contexto, além de justificar sua atitude como "uma brincadeira".

"Foi uma brincadeira em que, obviamente, quando pega, fragmenta e coloca fora de contexto, fica fácil. É um prato feito para quem quiser me atacar, para quem quiser me descredibilizar, para quem quiser criar uma narrativa que jogue contra mim", disse o ex-participante do "De Férias".

O advogado Ariel de Castro Alves critica as explicações do influenciador digital: "Ele dizer que foi brincadeira não ameniza em nada a configuração dos crimes e violações. Mostra que ele não se arrependeu dos atos ilícitos e criminosos cometidos e que pretende continuar fazendo vídeos do mesmo tipo, com essa absurda justificativa".

Mesmo se para ele fosse brincadeira, para a criança vítima não foi brincadeira, já que ela foi exposta e estigmatizada como um traficante. Se fosse brincadeira, um vídeo de humor, ele teria que ter a autorização anterior da criança e dos pais dela para contracenar com ele na filmagem.Ariel de Castro Alves.

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