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Presidente da Palmares diz que processará Martinho da Vila por racismo

Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares -
Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares

De Splash, em São Paulo

17/08/2021 22h37

O presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, anunciou hoje que irá processar por racismo o cantor Martinho da Vila, após lhe chamar de "preto de alma branca" durante participação no programa "Roda Viva", da TV Cultura.

"Ingressarei na Justiça com ação cível por danos morais contra Martinho da Vila, que atacou a minha honra com o uso da expressão 'preto de alma branca'. Na epigrafe da ação (sendo finalizada), o ensinamento de Morgan Freeman que pretos racistas da esquerda precisam aprender", escreveu ele, no Twitter.

Ontem, a apresentadora Vera Magalhães questionou Martinho da Vila sobre os retrocessos que o Brasil teve em relação a políticas públicas focadas a população negra na educação. O músico então lamentou os passos que o país deu para trás e criticou Sérgio Camargo.

"A Fundação Palmares era uma fundação criada para tratar dos assuntos da cultura negra. Mas botaram aquele cara lá, o Camargo, um bolsonarista radical. Ele é um preto de alma branca, como se diz. No duro, ele gostaria de ser branco e se sente branco. Para ele, tem que acabar com todas as coisas de negro", disse o cantor.

A reportagem entrou em contato com a assessoria de Martinho da Vila, e aguarda retorno.

Nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em novembro de 2019 para presidir a Fundação Cultural Palmares (FCP), Sérgio Camargo foi considerado pela ONU "inapto" para ocupar o cargo, conforme revelou o colunista do UOL Jamil Chade. Em carta ao governo brasileiro, relatores da organização questionaram a condução do órgão em uma ação sem precedentes.

O documento da ONU centraliza as críticas a Camargo em duas ações: as declarações racistas feitas por ele e as mudanças estruturais promovidas em março de 2020, que eliminaram sete colegiados de interlocução da fundação com a sociedade.

Autores da carta, Tendayi Achiume, Dominique Day e Irene Khan, relatores da pasta de liberdade de expressão e Descendência Africana da ONU, avaliam que a alteração centraliza o poder e limita a participação de atores relevantes. Com a decisão, comunidades quilombolas perderam o acesso às decisões políticas da fundação.

Em resposta, o governo brasileiro afirmou que a nomeação é de "confiança", e que a expressão de suas opiniões políticas é importante para a "maturidade da democracia'". Sobre a carta, Camargo afirmou em sua rede social: "Parece que os relatores da ONU não toleram um negro livre, somente os que aceitam sua coleira".

Negação ao racismo

A presença de Camargo na fundação foi contestada antes mesmo de sua posse. Após declarações em que negava a existência do racismo no Brasil, Camargo chegou a ter a nomeação para o órgão suspensa pela Justiça em outubro de 2019. Na ocasião, a justiça, depois revertida, acatou a ação popular do advogado Hélio de Sousa Costa. Em fevereiro de 2020, o Superior Tribunal de Justiça anulou a decisão da corte. Em agosto daquele ano, um pedido da Defensoria Pública da União também foi negado.

Autodefinido "antivimista" e "inimigo do politicamente correto", Camargo ganhou notoriedade por repudiar pessoas negras reconhecidas na história brasileira, como Zumbi dos Palmares, a quem chama de "falso herói".

Dentro da fundação, chegou a excluir mais de 20 nomes da lista de Personalidades Negras da Fundação Palmares, criada em 2011 para cultivar a memória de lideranças do Brasil e do mundo. Entre os excluídos, há nomes como Leci Brandão, Milton Nascimento, Conceição Evaristo, Elza Soares, Sueli Carneiro, entre outros.