Fofão da Augusta: papel que seria de Paulo Gustavo remonta trágica história
Paulo Gustavo viveria seu primeiro papel dramático nos cinemas. O ator, morto há dois meses pela covid-19, havia se oferecido para dar vida a Ricardo Corrêa da Silva, conhecido pejorativamente como Fofão da Augusta.
Personagem marcante na vida urbana de São Paulo, a história por trás da figura enigmática foi contada pelo jornalista Chico Felitti em matéria de 2017 no BuzzFeed e virou livro em 2019, "Ricardo e Vânia", se aprofundando ainda mais na trágica vida do artista.
De onde vem o apelido
Ricardo era conhecido como Fofão da Augusta por suas bochechas inchadas, comparadas ao do personagem infantil. Ele sempre era visto pelo centro de São Paulo usando maquiagem carregada, incluindo batom vermelho e losangos desenhados nos olhos.
As modificações no rosto foram realizadas ainda na década de 1980, com injeções de silicone no rosto e na boca, a fim de se parecer com bonecas de louça chinesa. No fim de sua vida, Ricardo já estava com a pele mais flácida e as bochechas caídas.
Cabeleireiro de sucesso
Natural de Araraquara, no interior de São Paulo, Ricardo nasceu em uma família de elite que perdeu tudo. Se mudou para a capital do estado ainda jovem, pela pressão por ser gay.
Ainda no interior, Ricardo já fazia sucesso como cabeleireiro e maquiador e, em São Paulo, a história não foi diferente. Ainda nos anos 1980, ele trabalhou em renomados salões e atendeu grandes celebridades como Glória Menezes e Ana Maria Braga.
Grande amor
Nessa mesma época, Ricardo vivia um romance com Wagner, hoje Vânia, uma mulher trans que vive em Paris. Foi ao lado dela que Ricardo fez as modificações no rosto e criou grandes memórias, relatadas no livro de Felitti. O relacionamento durou 8 anos.
Foi graças à matéria de Chico que Vânia conseguiu se reencontrar, mesmo que virtualmente, com Ricardo. Os dois fizeram uma videochamada por intermédio do jornalista, após Vânia saber do estado do ex-namorado pela reportagem.
Vida nas ruas
Na segunda metade dos anos 1990, Ricardo foi despejado do apartamento onde vivia no centro de São Paulo e passou a pedir dinheiro nas ruas, distribuindo folhetos de teatro ao lado de um grupo de mais de 20 pessoas que ele maquiava da mesma forma que a si mesmo.
O grupo de "palhaços" de Ricardo dizia juntar dinheiro para montar uma peça de teatro, nunca realizada. Acabavam se apresentando na rua mesmo e gastavam o que ganhavam comendo fast food. Outros jovens do grupo também eram rapazes gays expulsos de suas casas.
Internações
Quando Chico Felitti produziu a reportagem de 2017, Ricardo estava internado pela sétima vez no Hospital das Clínicas. A maioria delas ocorreu pelas agressões físicas que sofria na rua.
Ricardo tinha constantes surtos no hospital, querendo agredir enfermeiras e precisando de sedativos. Segundo a família, ele foi diagnosticado com um caso grave de esquizofrenia.
Em 2017, Ricardo chegou a ter que amputar um dos dedos que estava infeccionado por uma miíase, isto é, quando ovos de moscas se chocam dentro da pele e as larvas começam a se alimentar da carne humana.
Em sua última internação, Ricardo estava registrado no hospital como indigente, mas com a ajuda de Chico, conseguiu ser reconhecido pelo seu nome. Chico o visitou diversas vezes para saber mais de sua história e produzir a reportagem.
Morte
Após meses internado, Ricardo foi liberado em maio de 2017, mas o relatório médico apontava que ele não tinha condições de cuidar de si próprio. Foi, então, encaminhado para um centro de acolhimento, mas ao chegar no local, se recusou a ficar.
Ele se hospedava em hotéis na região da Cracolândia e vivia com o dinheiro das ruas, mesmo tendo direito a parte da herança da mãe que morreu na época, cerca de R$ 35 mil.
Mas então, em dezembro daquele ano, Chico recebeu a notícia que mais temia: Ricardo morreu após uma parada cardíaca, aos 60 anos. Sem Paulo Gustavo entre nós, resta saber quem ainda poderá retratar a trágica vida de Ricardo nas telonas.
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