'Better Man': Robbie Williams conta sua história de maneira espetacular
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"Better Man", cinebiografia do superastro da música pop britânica Robbie Williams, tinha tudo para não funcionar. Sua vida, uma coleção de altos e baixos que espelha boa parte da trajetória de seus pares, sugeria, quando muito, uma história de redenção edificante, entrecortada pelas canções que fizeram sua fama. Mas o macaco - ou melhor, fazer do astro um símio digital -, fez toda a diferença.
Vale uma explicação. De sua infância como legítimo representante da classe operária britânica, passando pelo estouro com a boyband Take That até a fama solo estratosférica - e todo dissabor que ela trouxe -, Williams é retratado como um chimpanzé, uma construção digital esperta executada com tecnologia de captura de performance. É um tempero de estranheza que abre espaço para "Better Man" soltar as amarras do realismo e abraçar a liberdade ofertada pela fantasia.
Pode soar bizarro (e é!), pode parecer cafona (bom, é música pop...), mas o fato é que a escolha inusitada ajuda "Better Man" a transcender os limites da biografia musical para se tornar uma experiência cinematográfica exuberante, ousada e - principalmente - muito divertida. Exatamente como Williams decreta em um dos singles de seu álbum de estreia, "Life Thru a Lens", de 1997: "Let Me Entertain You", deixe-me entreter vocês. Beleza!

E é exatamente isso que "Better Man" faz melhor. O diretor Michael Gracey (de "O Rei do Show") brilhou muito ao anabolizar o clichê ascensão-queda-redenção com a personalidade ácida do astro. Bad boy com o pacote completo, Williams aqui se expõe de maneira íntima e transparente como poucos. O elemento fantástico ajuda a entender como ele enxerga a si mesmo - em suas próprias palavras, "alguém menos evoluído" - em uma jornada regida por doses cavalares de amor e ódio.
Aplausos, portanto, a Gracey por traduzir toda essa bagagem de forma tão espetacular em uma estrutura familiar e revolucionária. A coreografia dos momentos musicais é grandiosa e inusitada. A montagem traz respiro aos momentos mais íntimos e dinamismo ao escopo dos shows para milhares de pessoas. Visualmente - mas não somente - "Better Man" é épico!
É curioso como, em meio a toda parafernália narrativa e tecnológica, você esquece em 10 minutos que Robbie Williams é mostrado como um macaco. A ilusão se torna ainda mais completa quando nenhum outro personagem do filme o enxerga dessa forma. A autodepreciação transmutada em gag visual é como um segredo compartilhado por Robbie com cada pessoa na plateia - e funciona.

Este segredo, claro, não custa bananas. "Better Man" investiu cerca de US$ 110 milhões para que, entre outras coisas, a costura digital fosse imperceptível. Foi uma aposta cara, já que removeu do projeto o rosto de Robbie Williams, um de seus ativos mais preciosos, e também arriscada. Como seu sucesso mastodôntico nunca ultrapassou as fronteiras do Reino Unido, esconder o astro com uma máscara digital poderia cortar dos dois lados.
Por fim, a decisão criativa que define e eleva "Better Man" não funcionou nem em casa, muito menos no além-mar, com o filme estacionando em decepcionantes US$ 20 milhões nas bilheterias em todo o mundo. Foi um dos melhores filmes de 2024 - certamente a melhor biografia e o melhor musical - que ninguém pagou para ver.
Esse problema, claro, é dos contadores do estúdio e não respinga na excelência de "Better Man", um seríssimo candidato a filme cult que cativa na emoção, prende pelo inusitado e não tinha sequer o direito de ser tão espetacular. Colocar imediatamente uma playlist de Robbie Williams na vitrola (sou vintage, pode julgar) é consequência. Azar, portanto, de quem não viu no cinema - faça um favor a você mesmo e não seja uma dessas pessoas!
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