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Cansativo, 'Resgate 2' só funciona para entusiastas de videogames de guerra
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Alguns canais de cinema espalhados pela internet se dedicam a esmiuçar o trabalho de dublês e de efeitos visuais em filmes antigos e contemporâneos. É sempre bacana ver gente dos bastidores da indústria se dedicando à exploração do "como eles fizeram isso?" de forma didática e elucidativa.
"Resgate 2" é perfeito para esse tipo de programa. A aventura, que repete a dobradinha Sam Hargrave na direção e Chris Hemsworth como protagonista, é uma vitrine em movimento do trabalho intrincado de centenas de especialistas em criar caos controlado como entretenimento. O nível técnico é de tirar o chapéu. Fora da "sala de aula", contudo, não há muito o que se aproveitar.
A nova missão do mercenário Tyler Rake (Hemsworth, aqui um Thor com testa franzida) é a materialização do "muito barulho por nada". A trama é uma desculpa batida para amarrar duas longas cenas de ação (com ênfase no "longas") e um clímax constrangedor. É como uma versão live action do game "Call of Duty": muita coisa explode, estamos no coração das batalhas, mas no fim é tudo inconsequente e desumanizado.
O que é uma pena. Lançado em 2020, "Resgate" não fugia de sua natureza exibicionista, mas ao menos havia ali um fiapo de personagem no qual pudéssemos jogar uma âncora. Rake tinha uma missão - resgatar o filho de um criminoso - e terminava como exército de um homem só contra uma cidade inteira, Dhaka, capital de Bangladesh. O filme tinha a consistência de um marshmallow mas era honesto em suas limitações e eficiente em suas proezas.
Esse novo capítulo, que não esconde sua disposição em se tornar série, mostra que Hargrave gostou dos elogios à sua maestria técnica e decidiu concentrar esforços unicamente nessa área. O roteiro de Joe Russo, um entusiasta assumido por armas, equipamentos e cenários de guerra, é frio e distante. Quando seres humanos importam menos que o arsenal, é compreensível que tudo se mova por pura energia cinética.
Dado como morto no final da aventura anterior, Rake é resgatado, remendado e parte para a aposentadoria involuntária. Isolado na cabana erma mais clichê da história, ele é visitado por Idris Elba (no que seria seu momento Nick Fury) e ganha uma nova missão: resgatar a ex cunhada, mantida com os filhos em cativeiro por ordem do marido criminoso em uma prisão no Leste Europeu.
Rake obviamente não está fisicamente apto para encarar o trampo. Mas o pedido veio de sua ex esposa, ele tem uma dívida para acertar com a própria consciência e, você sabe, "Dessa vez é pessoal" e tudo isso. Logo nosso herói se reconecta com a parceira Nik (Golshifteh Farahani) e invade, armado até os dentes, o que parece ser a mesma prisão que mantinha Ethan Hunt encarcerado no começo do quarto "Missão: Impossível".
Todo esse papo furado é mero contexto para "Resgate 2" chegar ao prato principal, que são suas cenas de ação. Assim como em "John Wick 4", a pancadaria aqui parece interminável. O que começa com uma infiltração silenciosa escala para uma motim na prisão, que salta para uma perseguição de carros (e motos) na floresta e num vilarejo, terminando, finalmente, com Rake enfrentando mercenários e helicópteros em um trem.
Assim como no primeiro filme, Hargrave abraça sua predileção por longos planos sequência, esticando cada cena ao máximo que a trucagem permite. O que ele também faz é evidenciar um dos grandes problemas do cinema de ação moderno, que é confundir exibicionismo com função narrativa. É o esfarelamento da linguagem cinematográfica em momentos que roubam o filme de sua urgência e dinamismo.
Essa falha fica ainda mais evidente na segunda grande cena de ação de "Resgate 2", agora na invasão de um arranha-céu em Viena. A tentativa de construir o mínimo de drama ou alguma conexão entre os personagens - o adolescente resgatado entrega sua localização para o tio terrorista - logo se perde em mais coreografias de destruição que, a certa altura, são só barulho.
Não é nenhum pecado construir uma obra cinematográfica conduzida pela ação. De "Fervura Máxima" a "Mad Max: Estrada da Fúria", não são poucos os exemplos em que uma sinopse simples estende-se de forma brilhante em uma narrativa explosiva. "Operação Invasão" tem estrutura de videogame, com "fases" exponencialmente mais difíceis, e é um espetáculo. Diretores como John Woo e George Miller entendem que a adrenalina só faz sentido quando existe risco, quando a ênfase é no elemento humano.
Sam Hargrave construiu sua carreira como coordenador de dublês, entendendo que a ação é mais uma ferramenta para contar histórias. Ele lapidou essa vocação em uma série de curta metragens antes de assumir o leme em "Resgate". Hargrave tem pulso e sabe arquitetar uma história, mas parece ignorar que são os personagens, e não o cenário, quem conecta o público a um filme. Sem personalidade, "Resgate 2" carece de impacto emocional.
Por outro lado, nos mesmos lugares em que encontramos canais sobre os bastidores do cinema, pipocam também programas sobre gameplays, e uma legião senta à frente do computador para basicamente assistir a outras pessoas jogando. Filmes como "Resgate 2", com sua fissura pelo militarismo e narrativa em constante movimento, é o mais próximo de um jogo eletrônico sem ninguém no joystick. Talvez o apelo esteja justamente aí: é uma obra que parece pertencer à tela do cinema, mas termina ideal para consumo doméstico. Bem vindo ao futuro.
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