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Roberto Sadovski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'Tudo em Todo o Lugar' dispara como favorito em Oscar ainda sem identidade

Michelle Yeoh em "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo" - Diamond
Michelle Yeoh em 'Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo' Imagem: Diamond

Colunista do UOL

24/01/2023 19h40

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Com gloriosas 11 indicações ao Oscar, inclusive melhor filme e direção, "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo" se torna o favorito para ser consagrado na festa que acontece no próximo dia 12 de março. A pergunta que fica no ar, contudo, é: alguém ainda dá bola para o Oscar?

Bom, sim e não. Entre todas as premiações cinematográficas, o Oscar ainda é a de maior relevância. O reconhecimento da Academia tem peso comercial, o que é imprescindível em uma temporada em que a esmagadora maioria das produções não encontrou seu público e afundou nas bilheterias.

O outro lado da questão, porém, deixa o cenário turvo. Há muito o Oscar perdeu seu brilho, perdeu o impacto como termômetro, se não de qualidade, mas de expressividade. Assistir a um "filme vencedor do Oscar" significava encontrar uma obra singular, um trabalho que, de certa forma, radiografava um momento da cultura pop.

Em uma história de acertos e erros, é impossível ignorar a estatura de um filme como "O Poderoso Chefão". Ou "Sindicato de Ladrões". "Operação França". "Lawrence da Arábia". "Perdidos na Noite". "O Silêncio dos Inocentes". "Titanic"! Trabalhos que vão além do teste do tempo. Produções que moldaram o cinema. Filmes com assinatura, sucessos atemporais.

Nos últimos anos, porém, o Oscar perdeu esse peso. Não que a estatueta tenha ido para filmes indignos. Talvez uma palavra melhor aqui seja "esquecíveis". Gosto de "A Forma da Água", acho "Birdman" um triunfo fora da curva, e "Parasita" acendeu a esperança de ver o Oscar buscando uma relevância perdida.

Mas fica difícil defender uma premiação que coloca em seu pedestal mais nobre filmes somente ok como "Argo" ou "Spotlight", como "O Artista" ou "O Discurso do Rei". Eu não sou o maior fã de "Moonlight" mas é inegável seu peso artístico e social. Agora, "Green Book" e "No Ritmo do Coração" escolhidos como melhor filme são uma piada de mau gosto.

O que nos leva à festa desse ano. Sem apontar acertos ou ausências (cadê "RRR"?), os indicados mostram uma cerimônia incerta de onde pisar. "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo", que provavelmente leva o Oscar de melhor filme, é o modelo perfeito para onde a Academia pode seguir.

O filme dos Daniels é um empreendimento independente, produzido pela irretocável A24, de orçamento modesto e criatividade ao máximo. Tornou-se sucesso de público e tem o carinho da indústria, efeito potencializado pelo bom mocismo de Michelle Yeoh, Jamie Lee Curtis e Ke Huy Quan. É o filme certo na hora certa, sua provável vitória não vai torcer nenhum nariz.

Outros indicados mostram os frutos de uma maior internacionalização dos membros da Academia. Se o alemão "Nada de Novo no Front" seria uma escolha óbvia, mesmo com a surpresa de suas nove indicações, o vencedor de Cannes do ano passado, "Triângulo da Tristeza", é um movimento ousado e bem-vindo.

"Avatar: O Caminho da Água" e "Top Gun: Maverick" garantiram seu lugar entre os indicados por representar o cinemão em sua essência, filmes de qualidade que cumpriram a função em levar o público de volta aos cinemas. Nessa mesma categoria é possível incluir "Elvis", um sucesso global que não esconde a assinatura muito peculiar de seu diretor.

O grupo seleto dos indicados a melhor filme é completado por "Entre Mulheres" (um filme que absolutamente ninguém viu), "Os Fabelmans" (que deve garantir o terceiro Oscar de direção a Steven Spielberg), "Os Banshees de Inisherin" e "TÁR", de Todd Field. Em um mundo perfeito, este drama encabeçado por Cate Blanchett seria o campeão indiscutível da cerimônia deste ano.

É cinema maduro, poderoso, que não faz absolutamente nenhuma concessão. Uma personagem complexa conduzindo uma história sobre uma personalidade lapidada, submersa e, por fim, consumida pela arte. Não importa o vencedor, "TÁR" é o filme do Oscar 2023 que vai sobreviver ao teste do tempo. É um começo.