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Roberto Sadovski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Em nova temporada, 'The Crown' encosta no mundo real sem perder a majestade

Imelda Staunton como a Rainha Elizabeth II na quinta temporada de "The Crown" - Netflix
Imelda Staunton como a Rainha Elizabeth II na quinta temporada de 'The Crown' Imagem: Netflix

Colunista do UOL

09/11/2022 12h00

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A estreia da quinta temporada de "The Crown" chega em um momento de holofotes sobre a Família Real britânica. Com a morte da rainha Elizabeth II, encerra-se um ciclo na história moderna. A ficção teima em cutucar a realidade nas ocasiões mais oportunas.

Desde sua estreia, a série criada por Peter Morgan tem retratado o reinado de Elizabeth II como um novelão emoldurado como drama histórico.

Com quatro temporadas nas costas, a ideia triunfou com uma mistura de distanciamento cronológico com o próprio glamour exibido pelos protagonistas na corte.

A história, agora, mordeu os calcanhares da nova geração. A temporada que entra essa semana no catálogo da Netflix ganhou uma renovação em seus quadros, com Imelda Staunton assumindo o papel da Rainha - anteriormente de Claire Foy e, depois, de Olivia Colman - no que foi um dos momentos mais controversos e críticos de seu reinado: o divórcio do príncipe Charles com a princesa Diana.

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Diana (Elizabeth Debicki) e Charles (Dominic West) exibem sua felicidade artificial
Imagem: Netflix

A estrutura em "The Crown" segue inabalada. Cada episódio abraça um tema, além de contribuir com fragmentos do plot de toda a temporada. Não existe compromisso com verdade histórica a não ser o mínimo para deixar a dramatização mais empolgante. Os diálogos mordazes costurados por Morgan temperam o clima de folhetim.

No caso dos novos episódios, a realidade alimentou a ficção com fúria. Como todo escândalo de casais, existe combustível para conflitos em progressão geométrica. A adição da formalidade e das tradições da realeza britânica colaboram para deixar o pacote mais atraente.

Como desde o início de "The Crown", seu maior apelo reside na escolha do elenco. A quinta temporada traz bons acertos, como Jonathan Pryce emprestando um ar decadente a seu Príncipe Philip, marido da Rainha, e Jonny Lee Miller como o discreto primeiro-ministro John Major - que eu confesso ter demorado para lembrar da existência.

Se Dominic West talvez seja charmoso demais para dar vida a alguém tão mundano como Charles, a escolha de Elizabeth Debicki como Diana é um daqueles acertos que garantem seu lugar na história. A atriz não só acerta na postura e nos trejeitos da princesa, ela também encontra uma voz muito particular, que oscila entre a fragilidade absoluta e a determinação férrea.

É no embate do espírito livre de Diana e na preservação das tradições representada por Elizabeth que "The Crown" encontra seus melhores momentos. Mesmo contracenando ocasionalmente, é o choque entre um reino mergulhado na formalidade e a "nova" Inglaterra representada por Diana que a série encontra seu combustível.

A proximidade histórica de acontecimentos exaustivamente cobertos pela mídia removem parte do verniz de "The Crown". Percorrer os bastidores da realeza quando o mundo sequer sonhava em ser tão conectado era mais interessante do que a recriação de uma realidade que, mesmo com décadas de idade, já previa o frenesi da comunicação moderna, em especial sobre Diana.

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Elizabeth Debicki está sobrenatural em sua interpretação da princesa Diana
Imagem: Netflix

Ainda assim, a série continua irresistível ao contar, com tempero de novelão, uma história tão notória. Imelda Staunton pode até ficar levemente no banco do passageiros como Elizabeth nessa temporada, mas é um respiro necessário que reflete onde estava o olhar do público nesse momento da realeza britânica.

Claro que "The Crown" segue agora um caminho tragicamente familiar. A série esforça-se em desenvolver personagens como o bilionário egípcio Mohamed Al-Fayed (Salim Daw) e seu filho, Dodi (Khalid Abdalla), que se tornariam protagonistas dos eventos que marcaram a família real - e o mundo - irrevogavelmente.

Peter Morgan, mesmo com sua tendência para o escândalo, conduz "The Crown" com elegância, mesmo quando o assunto caminha em terreno vulgar - como as conversas íntimas de Charles com sua amante, Camilla Parker Bowles, defendida por Olivia Williams. É um caminho bem traçado para a sexta e última temporada, acelerada pelo mundo real que viu este ano o reinado de Elizabeth II chegar ao fim ao vivo e em cores. Mas essa é uma conversa para o futuro.