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Roberto Sadovski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'Transformers' 15 anos: Um fenômeno pop que não deixou marcas no asfalto

Optimus Prime, o herói espacial de "Transformers" - Paramount
Optimus Prime, o herói espacial de 'Transformers' Imagem: Paramount

Colunista do UOL

06/07/2022 04h00

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"Transformers" chegou aos cinemas em 2007 no meio do feriado da independência, a data mais festiva nos Estados Unidos. Foi um arraso. Com US$ 29 milhões em caixa, o filme de Michael Bay tem até hoje a maior bilheteria cravada em um 4 de julho.

Quinze anos e seis filmes depois, os robôs que são "mais do que os olhos enxergam" só fazem barulho nas prateleiras de lojas de brinquedos. É um testamento do quanto a cultura pop absorve e rapidamente descarta seus produtos. A velocidade em que a série foi de sucesso absoluto a nota de rodapé impressiona.

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Robôs digitais se arrebentam em 'Transformers'
Imagem: Paramount

Não me entenda mal: Transformers é uma das propriedades intelectuais mais festejadas e lucrativas do planeta desde os anos 1980. Quando Michael Bay fez sua versão para o cinema, disparou o interesse de uma nova geração para dar uma espiada na série animada original e em décadas de brinquedos.

O consumo de massa, porém, é um animal estranho. O evento que foi "Transformers" sugeriu que outros brinquedos nostálgicos também poderiam ser transformados (sem trocadilho) em filmes de sucesso. Na prática, não foi bem assim.

"G.I. Joe - A Origem de Cobra" veio na cola de "Transformers" dois anos depois, mas ninguém deu bola. O estúdio ainda tentou aprumar o barco, sem sucesso, em "G.I. Joe - Retaliação" (2013) e ano passado com "Snake Eyes" (que sequer foi exibido nos cinemas). "Battleship", baseado em outro brinquedo da Hasbro, naufragou em 2012.

"Transformers", por sua vez, é um caso a ser estudado. Nem faz tanto tempo assim e parecia que os robôs gigantes jamais sairiam do radar da cultura pop. Suas aventuras estariam pipocando a cada par de anos, varrendo as bilheterias ao lado de tudo da Marvel, dos novos "Velozes & Furiosos" e de alguma variação de "Minions".

O filme de 2007, o primeiro e melhor sob o comando de Michael Bay, foi um colosso de US$ 700 milhões. O diretor tomou gosto pela carta branca para destruir o planeta e fez da série um projeto pessoal. Foram mais quatro filmes até 2017, dois deles faturando mais de US$ 1 bilhão cada.

A novidade em ver robôs gerados em gráficos digitais, porém, foi se esvaindo a cada novo filme. Eu consigo me lembrar de algumas partes do primeiro "Transformers". Do segundo em diante, contudo, todos são meio que a mesma coisa. Não há nenhuma personalidade, os roteiros são inchados e confusos, não há sequências de ação memoráveis.

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Megan Fox e Shia LaBeouf, porque em 'Transformers' humanos ainda são necessários
Imagem: Paramount

Quando "Transformers: O Último Cavaleiro" estreou em 2017 (esse tem Anthony Hopkins em uma cena de morte humilhante), apenas uma década depois do primeiro filme, o mundo já não dava mais bola para o caos assinado por Bay. Os números das bilheterias, a metade da aventura anterior, "Era da Extinção", mostravam que a série havia esgotado o gás.

O estúdio, claro, tratou de acionar o alarme e bolou um recomeço leve. "Bumblebee" estreou no ano seguinte com uma proposta menos intensa e mais infantil, com o design dos robôs trocando agressividade bélica por curvas mais próximas da animação dos anos 1980. Dirigido por Travis Knight, a aventura é melhor do que todas as suas antecessoras.

O público, porém, já havia migrado para outras marcas mais empolgantes. "Bumblebee" ficou aquém das expectativas. Ano que vez a série ganha outro reboot, "Transformers: Rise of the Beasts". Prevejo a venda de muitos brinquedos - robôs e bichinhos, não tem erro. Como produto, o sucesso é garantido. Como filme? Pergunte-me em doze meses.

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Bumblebee foi o único robô amigo a ganhar filme próprio
Imagem: Paramount

Em setembro de 2006 eu visitei as filmagens de "Transformers" no centro de Los Angeles. As cenas no deserto e em outras locações, como a represa Hoover e o observatório Griffith, haviam sido concluídas, bem como todo o trabalho em estúdio. Bay separou seis finais de semana para concluir a batalha climática da aventura.

Estar em um set de Michael Bay é uma experiência. Era um domingo e as ruas estavam cobertas de detritos. O diretor conversava com sua equipe e, minutos depois, uma explosão fazia zumbir os ouvidos. Figurantes se posicionavam enquanto os carrões pilotados por Shian LaBeuf e Megan Fox cruzavam as ruas apertadas.

Nenhum transformer em forma de robô estava à vista, claro. Eles seriam adicionados na pós produção: o elenco reagia a varas de dois ou três metros com esferas cromadas na ponta. Era um caos controlado em um set de rigidez marcial - mesmo que Bay fosse sempre solícito e bem-humorado ao papear comigo nos intervalos entre os takes.

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O mestre do caos: Michael Bay no set de 'Transformers'
Imagem: Paramount/Phil Bray

Às 5 da tarde em ponto as câmeras paravam de rodar. A equipe tinha de limpar todo o material cenográfico e devolver as ruas para a cidade de Los Angeles até as 6 da manhã seguinte. Ao longo da semana, Bay voltava para seu bunker em Santa Mônica para trabalhar na montagem de cenas já prontas e supervisionar o trabalho da equipe de efeitos visuais. Optimus Prime, Megatron e cia. precisavam de seu chassi digital pronto o quanto antes.

No feriado de 4 de julho de 2007, "Transformers" finalmente chegou aos cinemas e deixou sua marca. O público não se importou com o estilo histérico de Bay e a nostalgia falou mais alto, fazendo do filme um sucesso global. Foi a quinta maior bilheteria do ano, atrás de "Shrek Terceiro", "Homem-Aranha 3", "Harry Potter e a Ordem da Fênix" e "Piratas do Caribe: No Fim do Mundo".

Ao longo do caminho, porém, algo se perdeu. É natural que uma série de sucesso esgote suas ideias ao longo de sua jornada - "Shrek" e "Piratas do Caribe", só para citar exemplos imediatos, são um bom exemplo. Nenhum deles, porém, era parte de uma marca tão poderosa e tão duradoura.

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Sexy na estrada: o verdadeiro elenco de 'Transformers'
Imagem: Paramount

Talvez Michael Bay tenha ficado por muito tempo no comando da série, impedindo que novos artistas pudessem redirecionar a marca. Talvez robôs gigantes se arrebentando seja mesmo um conceito limitado. Talvez seja algo que só funcione a longo prazo nas mãos de uma criança brincando no chão do quarto.

Há quinze anos, no entanto, "Transformers" apontava o futuro do entretenimento no cinema. Efeitos visuais bacanas, elenco jovem, rock na trilha, senso de humor juvenil. Funcionou - por um tempo. Nada hoje na marca traz qualquer traço do filme de Bay. Seu futuro chegou tão rápido, fazendo tanto barulho, que piscamos o olho e ele ficou para trás.