Como a vitória de 'Ainda Estou Aqui' no Oscar impacta o cinema nacional?
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Após anos de espera, finalmente, conseguimos um Oscar! O Brasil foi premiado com a estatueta de melhor filme internacional com "Ainda Estou Aqui". A visibilidade e a chancela do Oscar devem trazer transformações na indústria audiovisual brasileira nos próximos anos. A coluna conversou com profissionais que trabalham com cinema em diferentes segmentos para saber as expectativas para o cinema nacional nesse momento pós-Oscar.
Gloria Pires, atriz

Além do prazer de aplaudir esse feito histórico, celebrando o talento de Fernanda Torres e Walter Salles, [com a vitória no Oscar] é urgente trazer a temática dos direitos não reconhecidos aos atores e intérpretes do audiovisual. Imaginem que, por esse desempenho que chama a atenção na maior premiação do cinema comercial, Fernanda Torres não participará de forma alguma dos lucros que essa obra gerará quando for exibida em diversas plataformas porque, atualmente, não há remuneração posterior aos criadores, incluindo atrizes e atores.
A meu ver, nada é mais incongruente que isso. É surreal pensar que ela, como acontece com todos os atores, não receberá nenhum valor: nem nos streamings, nem nas TVs abertas, nem nas fechadas, YouTube! É fundamental que os intérpretes recebam seus direitos para que toda a indústria se beneficie também economicamente. Além disso, é urgente a regulação atrasadíssima do VOD, que protege o nosso produto e nossos produtores e políticas que tragam a capacitação. É fundamental ouvir a demanda do mercado, mantendo a indústria que já existe.
Cao Hamburger, diretor de 'O Ano que Meus Pais Saíram de Férias', indicado pelo Brasil para representar o país como melhor filme internacional no Oscar de 2008

Prêmios e festivais são importantes para o mercado cinematográfico do ponto de vista comercial e acaba influenciando também políticas públicas que estimulam a produção em todo o mundo. Na minha opinião, não há competição, não há melhor isso, ou melhor aquilo, tudo muito subjetivo, diferente do futebol ou outros esportes competitivos. Mas entrando no clima de cabeça, o Oscar pode ser comparado a Copa do Mundo de futebol. A vitória de "Ainda estou aqui" é comparável com o que aconteceu em 1958, quando o Brasil conquistou a primeira Copa do Mundo. Agora acabou o estigma de vira-lata que persegue o cinema brasileiro. E, assim como no futebol, vai abrir a porteira e seremos bi, tri, tetra, penta Oscar's winners no futuro.
Lázaro Ramos, ator

A vitória no Oscar representa o reconhecimento dos talentos que temos e aponta para um cenário que podemos fazer muita bilheteria e ainda ter um filme que traga reflexões. Representa a importância de ter uma estrutura para fazer uma campanha para uma premiação como o Oscar e para os festivais, porque 'Ainda Estou Aqui' teve esse desempenho porque teve um investimento financeiro. Para além de tudo, reforça a relação do público brasileiro com seu cinema.
Mayra Lucas, produtora e diretora-geral da Glaz

Estamos num momento ímpar da nossa indústria, onde público e crítica se encontram numa grande torcida pelo Brasil. Não existe direita X esquerda. Está todo mundo junto. É também um excelente momento para ampliarmos na sociedade o debate pela regulamentação do streaming, para solidificar os investimentos e desenvolvimento do nosso cinema e trazer cada vez mais visibilidade para a nossa cultura, nosso povo, nosso jeito único de influenciar o mundo. Somos uma presença gigante na Internet e temos tudo, menos investimentos, para ser uma presença constante no mercado mundial de audiovisual. Nosso país é imenso, pulsante, complexo, e como disse Fernanda: é uma pena para o mundo não saber o que a gente sabe. Podemos mudar isso, e a janela para mudança é agora.
Ingrid Guimarães, atriz

A vitória de 'Ainda Estou Aqui' traz pra gente algo perdido em tempos sombrios: a estima da nossa cultura. Tá na hora do brasileiro voltar a amar a cultura brasileira e entender como somos únicos, diversos, originais. O cinema brasileiro é potente. O Brasil gosta de se ver na tela. Que essa vitória traga mais incentivo pro nosso cinema e principalmente leve cada vez mais o público de volta para sala de cinema.
Daniel Ribeiro, diretor e roteirista de "Hoje Não Quero Voltar Sozinho", indicado pelo Brasil para representar o país como melhor filme internacional no Oscar 2015

Não sei se é possível que haja uma grande transformação na indústria, mas acredito que esta seja uma oportunidade para discutirmos o preconceito que o cinema brasileiro sofre dentro do próprio país. A história do nosso cinema sempre foi feita de ciclos, que começam com promissores incentivos governamentais, resultam positivamente em reconhecimento internacional, mas são invariavelmente seguidos por desmontes dos mecanismos de fomento à cultura, sempre amparados por preconceitos e pela demonização dos artistas brasileiros. Nesse sentido, a premiação no Oscar, que é um dos maiores prêmios que um filme pode receber no imaginário popular, contribuem imensamente para o debate no Brasil sobre a importância e a relevância do cinema brasileiro para a nossa cultura, permitindo que o incentivo à produção audiovisual se torne algo permanente, sem estar sujeito às mudanças de governo.
Simone Oliveira, diretora de produção criativa da produtora A Fábrica

A vitória no Oscar não apenas traz prestígio, mas pode trazer mudanças significativas na indústria cinematográfica brasileira, desde o aumento de investimentos até a diversificação de gêneros e produções regionais. Além disso, eleva a autoestima nacional, com os brasileiros querendo se ver representados nas telas, gerando uma demanda crescente por produções que reflitam a nossa cultura. O sucesso de "Ainda Estou Aqui" está resgatando memórias nacionais adormecidas e valorizando nossa arte e nossas histórias.
Gustavo Melo, produtor e sócio da Boutique Filmes

A trajetória de 'Ainda Estou Aqui' abre um novo mercado para nós em nível de interesse dos sales agent, das distribuidoras, dos investidores internacionais. A pergunta é o que mais vem desse mercado que está gerando esse acontecimento cinematográfico que é 'Ainda Estou Aqui'. Isso gera uma janela de oportunidades para gente e temos que responder a essa oportunidade com projetos sólidos, bem estruturados, originais sejam de novas vozes ou de talentos reconhecidos, mas que sejam autênticos com sabor das nossas histórias. A nossa indústria audiovisual precisa estar bem estruturada em termos de políticas públicas para estruturar bons modelos de negócio, porque o investidor internacional olha isso.
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