Romance gay de 'Garota do Momento' acerta no tom, mas peca em um detalhe

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Desde que estreou em novembro, não canso de dizer que "Garota do Momento" é a melhor novela que a Globo produziu nos últimos tempos. Melodramática na medida certa e fazendo releituras de clichês do gênero, a autora Alessandra Poggi e sua equipe de colaboradores criaram uma trama cativante com bons núcleos que consegue dialogar com temas atuais mesmo que a história se passe no fim da década de 1950.
Nos últimos capítulos, duas narrativas ganharam força: o drama do homossexual Érico (Silvero Pereira), que se apresenta como cantora na noite com o nome artístico de Veronica e precisa enfrentar o preconceito do filho, Carlito (Caio Cabral), que não aceita que o pai seja drag queen, e o romance entre os jovens Guto (Pedro Goifman) e Vinicius (Elvis Vittorio), que entenderam que o que existe entre eles ultrapassa a amizade. Até já rolou um beijo (tímido, vale ressaltar) entre os dois personagens.
Em comum, as duas tramas possuem a delicadeza em sua condução. Tudo foi desenvolvido com sensibilidade e com um aprofundamento que permite que o público mergulhe nas dores e nas angústias de Érico e Guto. Mas há um fator que distingue e torna uma das histórias mais verossímil e palatável que a outra: a consequência da homossexualidade na vida dos personagens. Se Guto sofre o desprezo do filho, um comportamento esperado para aquela época, Guto é totalmente acolhido por sua mãe, Anita (Maria Flor), e pelo irmão Edu (Caio Manhente), que apoiam sem questionar ou demonstrar qualquer estranhamento que o jovem namore Vinicius.

Por mais liberal e compreensiva que Anita seja e por mais que Edu ame o irmão, é pouquíssimo provável que uma mãe de família e um jovem rapaz dos anos 1950 agissem com naturalidade a respeito da orientação sexual de um parente. Se em 2025 a homossexualidade ainda é uma questão polêmica para muita gente, imagina naquela época.
Entendo que tanto Érico quanto Vinicius são usados para retratar os efeitos da homofobia em "Garota do Momento", mas havia espaço para abordar outro viés que a homossexualidade de uma pessoa causa nos outros: a readequação de expectativas de mães ao descobrir que um filho é gay. Na grande maioria das vezes, os pais passam por uma espécie de luto ao entender que um filho não é heterossexual, já que, certamente, eles nutriam sonhos baseados em uma vida heteronormativa para sua prole. Esse processo não precisa necessariamente ser marcado por preconceitos ou maus-tratos, e seria muito bom (e até educativo) ver Anita compreendendo aos poucos e respeitando a sexualidade de Guto.
Na ânsia de normalizar o romance entre dois jovens homens, o que é louvável, "Garota do Momento" perdeu a chance de desenvolver um ótimo conflito que tinha potencial de causar identificação em muitas mulheres que devem estar vivendo o processo de entender que seus filhos ou netos fazem parte da comunidade LGBTQIPNA+.
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