Ricky Hiraoka

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Reportagem

'Comi borboleta na Dinamarca': Daniela Filomeno tornou paixão em trabalho

No comando do CNN Viagem e Gastronomia, programa que chega a superar a audiência da GloboNews, a jornalista Daniela Filomeno conquistou um objetivo que muitos sonham em alcançar: transformou uma paixão em trabalho. Enquanto trabalhava com comunicação corporativa, ela mantinha um blog para falar de turismo e restaurante que serviu de embrião para a atração de TV que já está em sua oitava temporada na CNN Brasil.

Daniela conversou com a coluna sobre sua rotina de trabalho, os perrengues e as experiências inusitadas que vive durante as viagens e deu dicas de destinos que devem bombar em breve.

Quantos dias por ano, você passa viajando para gravar os episódios do programa?
Eu nunca parei para contar exatamente quantos dias passo viajando. Muitas pessoas acham que viajo mais do que realmente viajo, principalmente porque todo final de semana estou na TV, escrevendo matérias para o site ou postando conteúdos nas redes sociais. Além disso, há uma percepção de que a nossa vida é apenas aquilo que aparece no Instagram, mas muitas vezes estou em casa, acompanhando notícias e postando conteúdos sobre viagens.

O grande desafio, especialmente para nós, mulheres que trabalhamos e temos família, é encontrar esse equilíbrio: estar presente na vida dos nossos filhos, honrar nossas escolhas profissionais e nos sentirmos realizadas. Para mim, o trabalho é uma grande fonte de realização pessoal. Hoje, eu tenho um marido que me apoia e filhos que entendem e respeitam essa escolha. E no fim, acredito que o mais importante é que todos fiquem felizes, inclusive nós mesmas.

Viver viajando é tão glamouroso como todo mundo pensa?
Viajar é realmente uma delícia, e ter isso como trabalho é um privilégio. Mas, assim como enfrentamos perrengues nas férias, trabalhando não é diferente. Pelo contrário, quando é trabalho, tudo fica mais intenso. São muitos quilômetros percorridos, vários compromissos, horários apertados. Eu acordo muito cedo, preciso me maquiar, me arrumar, preparar meu figurino e, muitas vezes, vou dormir muito tarde. Além disso, tento aproveitar ao máximo cada viagem, encaixando o maior número de pautas e atividades em poucos dias para conseguir voltar logo para casa, para os meus filhos e minha família.

Todo esse glamour que aparece na TV pode não ser a retratação exata da realidade, mas, sim, vivo a experiência, me conecto com pessoas interessantes, degusto boas comidas e vivencio momento especiais. Por isso, considero um superprivilégio. Quando gosto muito de um destino, sempre tento voltar depois com a minha família, de férias, para realmente curtir o lugar com mais calma. Essa é a chance de viver o destino de forma diferente e, muitas vezes, é nesse momento que consigo aproveitar tudo o que eu tentei transmitir para o público durante as gravações.

Daniela Filomeno em Provence
Daniela Filomeno em Provence Imagem: Arquivo Pessoal

Qual a história mais inusitada que você já viveu numa viagem?
Uma das experiências mais impressionantes e inusitadas que vivi foi no restaurante Alchemist, em Copenhague, que é um dos melhores do mundo, premiado com estrelas Michelin. Ele é comandado por um jovem chef que entrega muito mais do que uma refeição --é uma experiência sensorial e artística completa.

O restaurante conta com uma equipe gigantesca que inclui atores de teatro, cenógrafos e designers gráficos, tudo para criar uma narrativa única durante o serviço, que pode durar até cinco horas. O menu é uma verdadeira crítica à gastronomia atual, abordando temas como o impacto ambiental da alimentação, a forma como cultivamos nossos ingredientes e até projetos inovadores, como o desenvolvimento de pães para a Nasa ou soluções que podem mitigar a fome através da ingestão de insetos.

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Duas coisas me marcaram muito nessa visita. A primeira foi o fato de o chef ter aberto o restaurante exclusivamente para nós —fui a única comensal durante toda a refeição. E a segunda foi ter provado algo totalmente inesperado: uma borboleta. Ela estava crocante, com a aparência perfeita de uma borboleta, mas, claro, completamente transformada em sabor e textura. Saí de lá impactada. Passei horas em silêncio, digerindo não só a comida, mas tudo o que vivi ali. É uma experiência que provoca reflexão sobre arte, criatividade e os limites da gastronomia. Muita gente critica sem ter ido, questionando o tempo de serviço ou a quantidade de pratos, mas a verdade é que o Alchemist vai muito além de um restaurante —ele entrega um conceito, uma história. E essa visita, sem dúvida, foi uma grande contribuição para o meu repertório gastronômico e pessoal.

Daniela Filomeno Cristo
Daniela Filomeno Cristo Imagem: Arquivo Pessoal

Qual o maior perrengue que você já teve durante as gravações?
Eu sou motivo de chacota na minha equipe porque sempre acontece algo com o meu figurino. Já teve uma búfala que mastigou minha roupa e uma mala que rolou barranco abaixo --só fui achar no final do dia! Recentemente, por exemplo, na Argélia, tivemos um grande choque cultural e histórico. Estávamos gravando, quando, no meio da filmagem, as autoridades entenderam que não poderíamos mais continuar. Acabamos ficando sem poder sair do navio, o que foi uma experiência bem inusitada. Percebo que, em países onde a cultura é muito diferente da nossa e quanto mais para o Oriente vamos, esses desafios aumentam. Especialmente em lugares onde o governo é mais fechado, as restrições para a imprensa também acompanham.

Quando viajamos, inevitavelmente, conhecemos outras culturas e outros modos de ver o mundo e a vida. Que aprendizados você teve em suas andanças mundo afora?
Para mim, viajar é uma grande lição de humildade. É uma oportunidade de entender o quão imenso é o mundo e como existem culturas, religiões e formas de viver completamente diferentes daquilo que conhecemos e acreditamos. Muitas vezes, achamos que nossa visão de mundo é a regra, mas, quando nos deparamos com outras culturas, percebemos que o que chamamos de "exótico" é apenas o "diferente" aos nossos olhos.

Um exemplo disso é a cultura ocidental, que, embora seja a nossa referência, representa apenas uma parcela pequena da população mundial. Se olharmos percentualmente, nós é que somos os exóticos, não eles. Essa percepção transforma a forma como enxergamos o outro: passamos a respeitar mais, a julgar menos e a reconhecer que o mundo é muito maior do que imaginamos. Por isso, viajar não é apenas um lazer, é uma forma de aprendizado profundo, que nos ensina a sermos mais humildes e abertos às diferenças.

Muita gente diz que o Instagram estragou a experiência de viajar. Qual sua visão sobre isso?
Eu acredito que o Instagram trouxe duas faces para a experiência de viajar. Por um lado, ele democratizou o acesso à informação e inspirou muita gente a conhecer lugares que talvez nunca tivessem pensado em visitar. As redes sociais criaram um desejo de descoberta e possibilitaram que culturas, paisagens e destinos incríveis fossem compartilhados em tempo real. Por outro lado, o excesso de preocupação em registrar o "momento perfeito" pode realmente estragar a experiência. Muitas vezes, as pessoas estão tão focadas na foto ideal ou no conteúdo que querem postar, que deixam de viver o lugar de verdade --de sentir a cultura, de observar, de se conectar com o ambiente.

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Para mim, o equilíbrio é a chave. É possível usar o Instagram para compartilhar momentos incríveis e inspirar outras pessoas, sem deixar que isso tire a essência da viagem. Viajar é sobre vivenciar algo autêntico, e nada substitui a conexão real com o lugar e com as pessoas. Esse é o tipo de experiência que, muitas vezes, nem cabe em uma foto.

Daniela Filomeno em gravação na Noruega
Daniela Filomeno em gravação na Noruega Imagem: Arquivo Pessoal

Qual foi o destino mais luxuoso que você visitou?
Eu já fui a muitos hotéis cinco estrelas, lugares incríveis que poderiam ser considerados um luxo. Agora, a última vez que disse "isso é o verdadeiro luxo" foi em um barco subindo o Tapajós, paramos em uma praia de rio e fizemos uma piracaia que o chef Saulo montou em plena praia deserta, com mesas e luz de velas. Eu olhei para o meu marido e disse: isso é luxo para mim.

Que destinos que ainda não são tão conhecidos, mas que vão virar hype nos próximos anos?
No Brasil, os Lençóis Maranhenses são um destino fascinante em que aposto muito, principalmente Santo Amaro do Maranhão e Atins. As Chapadas também, principalmente, a dos Veadeiros, que tem um povo gentil, boa comida e ótimas trilhas. Já fora do Brasil, a ilha de Ischia, na Itália, é um destino que até tenho receio de indicar, na contramão da lotada e sofisticada Capri.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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