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Renata Corrêa

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O Emmy, a pandemia e eu

Emmy Awards 2021: Michaela Coel, de "I May Destroy You" - Getty Images
Emmy Awards 2021: Michaela Coel, de 'I May Destroy You' Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

20/09/2021 04h00Atualizada em 20/09/2021 09h35

Começo a assistir a cerimônia do Emmy 2021 esperando o escapismo, as piadas ruins, os vestidos e claro - comemorar cada vitória das minhas favoritas "I May Destroy You", "Hacks" e "Mare Of Easttown". Mas infelizmente, além de ser mulher, de esquerda e roteirista, sou brasileira, e é impossível apenas curtir um entretenimento cafona onde celebridades gringas recebem uma estatueta com olhos marejados e fazem piadocas com os colegas.

Durante a premiação na categoria de "melhor programa de esquetes" o ator Ken Jeong fez uma cena onde tirava sarro dos negacionistas, falava da importância das vacinas e brincava com um frasco de ivermectina; sei que, assim como no Brasil, a indústria do entretenimento norte americana tem os seus negacionistas de estimação - só a título de curiosidade, essa semana a supermodelo Doutzen Kroes fez um post antivacina para os seus 6.8 milhões de seguidores no Instagram, sendo defendida por Gisele Bündchen nos comentários e a cantora Nicki Minaj atribuiu uma suposta mutilação escrotal de seu primo à vacinação - porém ver a maior premiação da tv norte americana ter coragem de tomar uma posição clara em defesa da ciência é um alento.

Aqui ao sul do Equador nossa indústria sofre com o negacionismo do governo, com um secretário de cultura incompetente que tem como única função desmontar políticas públicas. Enquanto muitos de nossos colegas sofrem sem segurança financeira e sem poder retomar seus trabalhos, o presidente do país está em Nova Iorque sendo barrado em um restaurante por ser negacionista e o Ministro da Saúde desdenha da eficácia das vacinas que poderiam salvar milhares de vidas e milhares de postos de trabalho. Não podemos contar com o poder público para nada que não seja ainda mais destruição.

Nossas produções resistem. Mas ainda não podemos comemorar com alegria total uma plena retomada das nossas atividades.

Mas podemos celebrar cada trabalhador do audiovisual nacional, seja em grandes produtos ou em pequenas produções independentes e de guerrilha. Celebrar cada trabalhador que não desistiu, que está passando por longas jornadas, PCRs, distanciamento, novas regras sanitárias, pequenas quarentenas, para que a cultura possa sobreviver.

Talvez falte um tempo ainda para que possamos, assim como Ken Jeong, fazer piadas na tv aberta colocando os negacionistas no seu lugar. E mais tempo ainda para termos a leveza de não precisar fazer piada com eles. Por mais que pareça distante, esse dia vai chegar, pois se existe uma coisa capaz de atravessar o horror é a força transformadora das boas histórias.

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