Topo

Pedro Antunes

John Mayer, Foo Fighters e a sensacional liberdade de apertar o fod*-se

E você já apertou o "fod*-se" hoje, como Foo Fighters e o John Mayer? - Montagem: Pedro Antunes
E você já apertou o "fod*-se" hoje, como Foo Fighters e o John Mayer? Imagem: Montagem: Pedro Antunes

Colunista do UOL

17/07/2021 07h57

Sem tempo?

  • Sabe aquela música do Capital Inicial que pergunta o que você faz quando ninguém está vendo?
  • O Foo Fighters decidiu criar covers de Bee Gees.
  • John Mayer fez um álbum de ?pop rock adulto contemporâneo?, aquele que embala as madrugadas das rádios.
  • E, em ambos os casos, o resultado é sensacional.
  • Nada como apertar o botão do "fod*-se", às vezes, não é?

Ela suspira sozinha na cama. Ele abraça o travesseiro porque é o que sobrou.

As madrugadas são reservadas aos amantes e aos solitários. Aqueles que estão com alguém, aqueles que gostariam de ter companhia e aqueles que se sentem melhor sem ninguém ao lado.

Na rádio, nestas altas horas da noite, tocam velhas canções de pop e rock leve dos anos 70 e 80, sobre amores esparramados, paixões devoradoras e solidões gélidas. É o tal gênero "adulto contemporâneo".

São canções como "(They Long to Be) Close to You" (The Carpenters), "More Than Words" (Extreme), "How Deep Is Your Love (Bee Gees) e "You're the Inspiration" (Chicago).

A partir desta sexta-feira, 16, tocam John Mayer. Desde hoje (sábado, 17), tocam Foo FIghters também.

O guitarrista e compositor sempre se viu em um lugar estranho na música, revelou ele à Billboard norte-americana. Fica no meio-termo de ser um artista pop, por lotar estádios e ter canções com estrutura definida e fácil de assimilar e cantarolar, ou aqueles músicos de jams sessions intermináveis (afinal, tem talento suficiente na guitarra para isso).

Sem ser direito um ou outro, Mayer constantemente se viu numa batalha impossível de encontrar seu eu artístico.

Mas veio a Covid-19 e as consequências da pandemia para artistas do nível "tocam em arenas e estádios" foi interessante.

Sem a pressão de seguir uma discografia linear que aumente o público e o valor dos ingressos já estratosféricos, eles fizeram o que deu na telha deles.

Em alguns casos, isso pode ser desastroso, como ocorreu com Ed Sheeran, o ruivinho preferido do pop acústico, e autor da questionável música "Bad Habits".

Em outros, o resultado é divertido, como o Foo Fighters tocando Bee Gees. Dave Grohl precisou de algum autotune para alcançar as notas agudas? Sim. Mas quem se importa?

Aliás, para interpretar os clássicos destes heróis da disco music, os Foos mudaram de nome para Dee Gees. O álbum com "You Should Be Dancing", "Night Fever", "Tragedy", "More Than A Woman" e a "Shadow Dancing", de Andy Gibb, foi lançado por conta do Record Store Day, celebrado hoje nos Estados Unidos e Europa.

Não é um álbum para ser levado a sério demais. (Quem precisa se levar a sério demais, aliás, em pleno 2021 ainda pandêmico?).

O Foo Fighters prova que o melhor a fazer, às vezes, é rir de si mesmo.

Assim como fez John Mayer em "Sob Rock", o primeiro álbum dele desde o inquieto "The Search for Everything" (2017). Um disco propositalmente de soft rock, o roquezinho leve e de boas.

Em uma entrevista bastante reveladora à Apple Music, Mayer explicou que foi justamente por "não ter ninguém olhando" que ele se sentiu confortável para fazer este álbum propositalmente brega, da arte da capa ao conteúdo das canções.

Sabe aquela música do Capital Inicial que diz: "O que você faz quando ninguém te vê fazendo"? Não é o verso mais genial da história, mas diz muito sobre a criação pandêmica e isolada.

Sem ninguém por perto, o que você faz? Mayer se soltou e fez o disco que queria, sem se importar em vender ingressos ou qualquer pressão para fazer um sucesso comercial deste lançamento.

Sabe o maior barato dessa história? As canções de "Sob Rock" são as melhores de Mayer em uma década, pelo menos.

Romântico até a ponta do fio de cabelo graciosamente desgrenhado, o artista se deixa levar por tecladinhos, sintetizadores e dores de amor. Como não amar a estética 70s/80s do vídeo de "Shot in the Dark"?

Caminhando pela perigosa linha limítrofe entre o cafona e o cool, Mayer se diverte enquanto cria músicas para embalar os solitários madrugadas adentro.

A citada "Shot in the Dark", "Why You No Love Me" e a desoladora "I Guess I Just Feel LIke" renovaram minha vontade de assistir a um show de Mayer (o que é irônico, já que a intenção não era exatamente esta).

E você, o que faz quando ninguém está vendo?

Ed Sheeran tentou ser o The Weeknd (falhou na tentativa, amigo). Dave Grohl quer ser um dos irmãos Gibb (com autotune e backing vocals segurando a bronca, podemos fazer acontecer). Mayer quer tocar na rádio de pop "adulto contemporâneo" (e está pronto para isso). E eu penso em textos pessoais demais para publicar por aqui (não que alguém se importe).

Cada um com a sua própria loucura, não é? Mas. às vezes, é importante criar coragem para apertar aquele botão vermelho, coberto por uma proteção plástica tipo os alarmes de incêndio, com as instruções: "Para ligar o fod*-se, aperte aqui". Nada mais libertador do que isso.