Paulo Gustavo fez o Brasil rir da ascensão e queda da classe média
Dona Hermínia, a personagem memorável de Paulo Gustavo de "Minha Mãe É Uma Peça", me fazia rir. Gritava, desesperada, diante de situações as quais não controlava. Os filhos, a vida, o ex-marido, as reuniões de condomínio. Tudo a tirava do sério.
Faz sentido, afinal, o que não nos tira do sério neste Brasil?
Humoristas, os de sucesso, têm um foco. O foco de Paulo Gustavo era a classe média, entre os tantos personagens e criações.
Essa, que ascendeu com o sucesso econômico do Brasil no início do novo século, quando o País se tornou a 6ª maior economia do mundo e que erradicou a fome por aqui.
Paulo Gustavo ria com essa classe que viu ter a conta cheia o suficiente para fazer uma viagem de família por ano, conhecia os Estados Unidos, sabia o nome de cada um dos parques da Disney e gastava o idioma aprendido em cursinhos de línguas sempre que podia: "You're welcome"
Dona Hermínia havia vivido dias melhores. O auge passara, como passou para toda a classe média brasileira. Ela vivia diante de um mundo que, aos poucos, desabava.
Lembra aquela história da "família tradicional brasileira" (escrita assim, entre aspas, mesmo)? A família de "Minha Mãe é Uma Peça" era deliciosamente o oposto disso. Quebrava padrões estéticos, sociais e culturais.
Em vez de reforçar estereótipos, as reações de Hermínia representavam uma classe que quer aceitar as transformações sociais, embora isso nem sempre seja fácil para quem cresceu em outros padrões e aspirou anos melhores do que esses que vivemos atualmente.
Houve quem ignorasse a obra de Paulo Gustavo por considerá-la popularesca. Que engano. É popular porque nasce de uma crítica daquilos que a gente vive no dia a dia.
Se os grã-finos o ignoravam, era porque se sentiam atingidos pela ascensão dessa classe média que passou a voar de avião, um privilégio antes somente dos mais endinheirados.
O problema com o humor de Paulo Gustavo tem, sim, muito de elitismo cultural velado, sim.
Sabe aquela cena de "Minha Vida em Marte", em que o personagem Aníbal (Gustavo) diz à amiga Fernanda (Mônica Martelli): "Vamos esbarrar em alguém e dizer 'sorry!'"?
É exemplo dessa deliciosa sátira do humor paulo-gustaviano. Simples, sem rodeio, mas extremamente conectado com a realidade.
Aqueles que já tinham grana para estar em Nova York se sentiam "envergonhados" pela chegada dos "novos ricos". Até desviavam a rua e paravam de falar para não serem reconhecidos por "outros brasileiros" que eu sei.
Paulo Gustavo fez o Brasil rir da ascensão e chorar a queda da classe média brasileira, enquanto esmiuçava os padrões tradicionais e debochava dos ricaços.
Genial na simplicidade. Simplesmente genial.
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