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Pedro Antunes

Após quadro depressivo, Cynthia Luz se reergue com DVD: 'Ficha não caiu'

Cynthia Luz no DVD ao vivo "Não É Só Isso" - Divulgação
Cynthia Luz no DVD ao vivo "Não É Só Isso" Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

20/12/2020 04h00

Sem tempo?

  • Cynthia Luz lançou o registro ao vivo do disco "Não É Só Isso"
  • O DVD foi lançado hoje (18) conta com as músicas do álbum de mesmo nome e uma faixa bônus com Marcelo Falcão
  • Cynthia revelou que passou por um quadro de depressão durante a pandemia
  • "Não tinha ideia do meu nível emocional. Estava há muito tempo sem produzir alguma coisa própria"
  • Ela conta também que uma entrevista de Elis Regina ajudou-a a organizar o conceito do disco

Cynthia Luz sorri, do outro lado da tela, com ohinhos brilhando, realmente. "A ficha ainda não caiu". A entrevista, realizada na terça (15), antecipava o lançamento do DVD "Não É Só Isso", o primeiro da carreira da cantora dona de uma docíssima voz rouca que flutua entre R&B e pop, transmitido ao meio-dia de hoje (18) e disponível na íntegra no YouTube e nas plataformas digitais.

"Era um sonho conseguir realizar este DVD em 2020", ela admite. Com 26 anos de idade, Cys (como é chamada entre fãs e na intimidade) cresceu em meio à popularização do formato de registros de shows ao vivo (que, até a chegada das plataformas de música digitais) eram os responsáveis por sustentarem a capenga indústria fonográfica.

Faz sentido, portanto, que Cynthia ainda fizesse questão de se ver em um formato como esse.

DVDs, aliás, ainda são ultra importantes para outros mercados, como do sertanejo, o arrocha e outros gêneros extremamente populares. No âmbito do hip-hop (e da música pop), o formato foi relegado e substituído pela furiosa necessidade de lançamento de singles, clipes, EPs, mixtapes e outros registros feitos no estúdio.

Com o ao vivo "Não é Só Isso", Cynthia Luz prova não ser uma cantora como tantas outras. Mineira e criada no interior de São Paulo, ela tem uma trajetória iniciada nos louvores das igrejas dos pais pastores, já foi chamada de rapper, tem quatro álbuns de estúdio (um com o marido, produtor e rapper Froid) lançados em três anos, possui 2,5 milhões de ouvintes no Spotify e 665 mil seguidores no canal do YouTube.

A cada novo disco, a artista mostra mais consciência de quem é, de fato, como artista. A experiência de ouvir "Do Caos ao Nirvana", álbum de 2017, por exemplo, e partir para "Não É Só Isso", o disco de inéditas lançado em setembro deste ano e transportado para o DVD, é um espanto. Maturidade estética, confiança na voz e, principalmente, autoconsciência e autocuidado.

"Não É Só Isso" foi um disco nascido crise, aliás. Ela revela ter um quadro de depressão durante a pandemia do coronavírus.

"De certa forma, todo mundo sentiu a pandemia de algum jeito. Para mim, foi muito difícil ficar sem shows. Foi uma coisa que realmente me abalou de uma forma que eu não sabia, não esperava. Eu sabia o quanto eu amava fazer shows. É a parte favorita da minha carreira, mas não imaginava que ficaria tão mal. Fiquei sem saber o que iria acontecer."

O período de "Efeito Violeta", álbum dela lançado em 2019, até aqui, foi de transformações, ela explica. Mudou tudo, da equipe que a acompanhava à cidade na qual vivia (ela deixou São Paulo e, atualmente, vive em Brasília com Froid).

Essas tantas mudanças causam um impacto natural na criação de novas canções. Imagine um artista que tinha 65 feitas músicas para o primeiro álbum (como ela contou ao UOL em 2019, em um perfil escrito por Osmar Portilho) que, três anos depois, se vê com a cabeça vazia de ideias?

"No início, eu não sabia que passava por aquilo. Mas a gente vai percebendo. Eu não tinha ideia do meu nível emocional. Estava há muito tempo sem produzir alguma coisa própria. Tive transições, mudei para Brasília, mudei de equipe. Essas mudanças não me deixavam compor. Aqui em Brasília, meu marido ficava compondo o dia inteiro. Eu tinha amigos produtores em todo o Brasil. Comecei a me mexer neste sentido."

Cynthia Luz ligou para produtores como Dallas, Neo Beats, Papatinho, Kevin e DJ Cia, e acionou Froid para começar a compor o disco. "Todo mundo se amarrou, me mandaram vários beats, várias ideias e referências para compor."

A proximidade com o Froid também ajudou na produtividade. "Desde que mudei para Brasília, a gente tem a mania de sentar no estúdio e ficar brisando. Quando ele faz um beat e achou que era a minha cara, ele passa pra mim."

Presença de Elis

Foi uma frase de Elis Regina, encontrada sem querer, que ajudou a moldar o que viria a ser "Não É Só Isso". Cynthia usou a fala na intro do álbum de estúdio. Nela, Elis fala sobre demonstrar amor enquanto pode, mas também abre o caminho para um diálogo sobre espiritualidade e como a morte não precisa significar o fim definitivo.

"Essa frase dela me trouxe inspiração inteira para o disco. Eu não estava com criatividade, estava vazia, mesmo. O disco me escolheu, mesmo, era preciso ser lançado. E aí eu corri com ele."

Cynthia brinca que "Elis Regina sempre aparece quando componho um álbum".

"Ela me trouxe esperança. Eu cresci numa família que é muito cética neste sentido. Sobre a alma, de que isso tudo, a vida, é uma coisa só. Eu nunca aceitei isso. Não acredito que a minha alma esteja aqui pela primeira vez, nem que essa seja a última passagem por aqui. Eu tenho muito o que evoluir."

Fundamentado neste pilar "Não É Só Isso" foi um disco libertador para Cynthia Luz. E, por isso, fez mais sentido, para ela, que ele fosse colocado no ar como um DVD ao vivo.

Participações e orquestra

O DVD ao vivo repassa todo o álbum "Não É Só Isso". Além da banda que gravou o álbum, Cynthia está acompanhada de uma naipe de cordas. As músicas passaram por leves mudanças para acomodar a dramaticidade da orquestra.

A música com maiores transformações foi "Paralisou", cuja interpretação no palco se tornou imensamente mais orgânica, com Cynthia em voz e piano. Arrepia até.

Os feats do álbum também participaram da gravação, realizada em Brasília em outubro: Tassia Reis (em "Perfeito é o Mar"), Ice Blue ("A Dívida"), Projota ("Como Deus Quiser") e Froid ("Vai Ver").

Marcelo Falcão está na faixa-bônus de "Não É Só Isso" só existente no DVD. Juntos, os artistas cantam uma composição criada em parceria, "Sorria".

"Sabe, deu certo", desabafa Cynthia. "Ainda me emocionei muito com o resultado. Não sabia como eu ia sentir quando o DVD estivesse pronto. O maior sonho da minha carreira era fazer um DVD. E eu fiz."