Dia Mundial do Livro: mas o que é um livro?

Ora, é um punhado de páginas com letras impressas agrupadas por meio de cola ou costura e, normalmente, abraçadas por um papel mais resistente, às vezes cartonado. Pode ter muitos formatos, mas o mais comum é que seja retangular e tenha 14 por 21 centímetros.

A primeira definição apresentada pelo dicionário Houaiss que tenho em mãos segue essa linha. É uma "coleção de folhas escritas, coberta com capa, com páginas ordenadas, que são coladas ou costuradas".

Respostas erradas? De forma alguma. Mas, convenhamos, miseravelmente insuficientes.

Temos ainda os livros que se organizam dentro de arquivos digitais e os que, gravados, ecoam em nossos ouvidos. Isso sem falar nos formatos antigos, alguns deles bastante diferentes dos calhamaços que encontramos hoje pelas livrarias.

Penso nos rolos de papiro, por exemplo, sempre fascinantes. Meses atrás, no Museu da História da Arte de Viena, passei bons minutos diante de fragmentos de um Livro dos Mortos com mais de 2.250 anos. Incrível como essas relíquias hipnotizam a gente.

Reduzir o livro a uma traquitana qualquer é um crime contra esse camarada grandioso que mudou a história humana. Até aqui estamos na superfície, na carcaça, não na sua essência.

Insisto: o que é um livro?

Dia 23 de abril se comemora o Dia Mundial do Livro, data escolhida por tocar em pontos da biografia de Inca Garcilaso de la Vega, William Shakespeare e Miguel de Cervantes. Com esses nomes a coisa começa a ficar mais interessante.

Romancistas, poetas, dramaturgos, filósofos, cronistas, contadores de causos e provocadores de diferentes estirpes. Por meio dos livros que uma série de homens e mulheres formidáveis —e outros tantos desprezíveis, que sempre existiram aos montes— levaram suas ideias e histórias adiante. Fizeram com que pensamentos deixassem suas cabeças e chegassem a outras pessoas em diferentes lugares do espaço e do tempo.

O que é um livro? A plataforma para a transmissão de diferentes formas de conhecimento, dos discursos cristalinos às ficções mais inventivas. Conhecimento fundamental para forjar, elaborar e solidificar a complexa e muitas vezes contraditória teia de ideias que constituem o que chamamos de humanidade.

Olhamos para o livro: a pilha de folhas agrupadas e protegidas pela capa. Sabemos, porém, que o livro de verdade, o que realmente importa, é o que consta nessas páginas e a forma como isso pode ecoar entre diferentes leitores.

Não é por acaso que se trata do símbolo favorito para arder nas mãos de trogloditas. Qualquer autoritarismo costuma ostentar sua força proibindo romances, banindo autores, vandalizando bibliotecas, dificultando a circulação ou, de forma mais banal, acendendo fogueiras para transformar em cinza o que tanto temem.

O que é um livro? Uma ameaça para tiranos.

Nem tudo é épico, nem tudo é grandioso, no entanto.

A página em branco acolhe qualquer coisa, e estão aí os livros de proselitismo religioso, autoajuda barata, enrolação motivacional e animaizinhos descoloridos para comprovar que um livro não deve ser festejado automaticamente apenas por existir.

Um livro também pode ser de uma banalidade tamanha que sequer mereceria ser chamado de livro.

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