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REPORTAGEM

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O escritor que precisou marcar Zico em campo: papo com Marcelo Moutinho

Colunista do UOL

30/04/2021 08h58

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Na 77ª edição do podcast da Página Cinco:

- Entrevista com o escritor Marcelo Moutinho, que acaba de lançar "A Lua na Caixa d'Água" (Malê).

- "Terra Dividida", de Eltânia André (Laranja Original), "Vende-se um Elefante Triste", de João Gabriel (Produções do Ó), e "A Decodificadora", de Walter Isaacson (Intrínseca), nos lançamentos.

Alguns destaques da entrevista:

A caixa d'água de Aldir Blanc

A crônica faz um pouco isso: olha para onde ninguém está olhando, olha para onde a luz não está batendo forte, olha para a pequeneza.

Cronista quarentenado

Pro trabalho do cronista que se pretende quase um etnógrafo da vida urbana, é muito difícil. Pra mim, pessoalmente, também é muito difícil. Tenho uma vida muito vinculada à experiência da troca. Acho que a rua é o ambiente de excelência do que a gente chama de encruzilhada. Para o pessoal do candomblé, a encruzilhada é o lugar do mistério, mas é o lugar do encontro. É na rua que a vida acontece.

Afeto

Sempre fui um pouco refratário ao que chamo da literatura do cinismo [...]. Meu olhar como cronista e como contista é um olhar afetivo. Mesmo com os personagens absolutamente ficcionais, por mais que em algum momento tenham ações de mau-caratismo ou até de canalhice mesmo, me interessa procurar o que é humano, demasiadamente humano, ali. Essa é uma busca que está na minha vida e acabou reverberando no escritor.

Pai da Lia

Chamo a paternidade de um cavalo de pau na vida. A perspectiva muda de forma radical [...]. A Lia e a experiência da paternidade, que faço questão de viver muito, restitui esse tempo mítico da ascendência, de fazer parte de um fio que veio de algum lugar e vai para algum lugar.

Ficção na crônica

Não ia entrar num campo para jogar contra o Zico para tomar um drible desmoralizante. Ao mesmo tempo, não poderia dar-lhe uma porrada. Mas essa história é verdade. Uma vez encontrei com o Antonio Prata e comentei sobre uma história linda, sobre o pai, que ele tinha escrito para a Folha. Ele falou: nada disso aconteceu.

"Você vai marcar o Zico"

É aquele espanto. Não é uma frase do cotidiano [...]. Conforme o jogo vai desenrolando, isso vai mudando completamente. A dimensão do mito está antes, é desmontada durante o jogo e é restituída no final, quando todo mundo vai tirar foto com ele. Foi uma experiência muito interessante. Ser cronista é também estar ligado nos acontecimentos da sua vida, pensando: isso rende uma história, isso não rende uma história.

Lugar de fala e a ficção

Por gênese, ficcionalizar é imaginar mundos que não são o seu mundo. Quando escrevo, não escrevo como uma mulher, mas escrevo uma personagem mulher falando em primeira pessoa; estou imaginando essa personagem. Se o ficcionista não consegue imaginar personagens diferentes do que ele é, ele é tudo, menos um ficcionista. Acho que temos que ter cuidado com o risco de confundir o literário com a ciência social. Esses dias até o Joca [Reiners] Terron tuitou sobre isso. A literatura não é lugar de fazer ciência social. A literatura é lugar de fazer ficção. São campos diferentes, um tão importante quanto o outro, que podem se interpenetrar de vez em quando. Mas se fosse necessário lugar de fala para um ficcionista escrever um romance, a ficção científica estaria já de cara inviabilizada, só para dar o exemplo mais banal.

"Contos de Axé" e a mitologia dos orixás

Gostaria de lançar a antologia neste momento, sob esse governo. Estamos num momento em que os números comprovam que ataques contra terreiros lideram com longa folga os episódios de intolerância religiosa no país.

Brasil melhor em 2065?

Espero que sim. Apesar de que estamos há praticamente dez anos vendo esse país ser um país pior.

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