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Mauricio Stycer

Amor de Mãe: Autora e diretor dizem o que esperar de uma novela sem vilões

A dupla por trás de "Amor de Mãe", o diretor José luiz Villamarim e a autora Manuela Dias  - Estevam Avellar/Globo
A dupla por trás de "Amor de Mãe", o diretor José luiz Villamarim e a autora Manuela Dias Imagem: Estevam Avellar/Globo

Colunista do UOL

25/11/2019 05h01

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Resumo da notícia

  • "Amor de Mãe" estreia nesta segunda-feira (25) na Globo, no horário das 21h, no lugar de "A Dona do Pedaço"
  • A novela é escrita por Manuela Dias e dirigida por José Luiz Villamarim, a mesma dupla por trás da minissérie "Justiça" (2016)
  • "O vilão é a vida", diz Manuela sobre o fato de a novela não girar em torno de um vilão tradicional
  • As protagonistas são três mulheres, a babá Lurdes (Regina Casé), a advogada Vitória (Taís Araujo) e a dona de restaurante Thelma (Adriana Esteves)
  • O diretor promete uma trama realista, sem truques, mas com um toque "artesanal"

Uma das autoras mais promissoras dos últimos tempos associada a um dos diretores mais sofisticados. Manuela Dias e José Luiz Villamarim, a dupla de "Justiça" (2016), foi escalada pela Globo para a tarefa de ocupar o seu horário mais nobre, o da novela das 21h. Eles trocam ideias e desenvolvem o projeto de "Amor de Mãe" há quase três anos. Hoje é o dia de ver o primeiro capítulo na TV.

A cena de abertura, que assisti numa sala de edição na Globo, é um bom cartão de visitas de Villamarim. A babá Lurdes (Regina Casé) é entrevistada para um emprego pela advogada Vitória (Taís Araujo). Enquanto o espectador ouve a conversa, a câmera permanece fechada na babá, sem mostrar a advogada. A referência do diretor é o filme "Eu, Daniel Blake" (2016), de Ken Loach.

"Gosto de filmar desse jeito. Daí a noção do realismo. Não fico fazendo truque. A solução não está na montagem, está no set, na hora de fazer. A Regina está ali, não tem o lado de cá para acertar. O erro vai entrar, se for o caso", explica o diretor ao UOL.

"Eu estou na Globo há 22 anos para chegar nesta segunda-feira", diz Manuela. "Sou uma noveleira, amo novela, me lembro do último capítulo de 'Guerra dos Sexos' (1983), eu chorando, com 7 anos, falando pra minha mãe que ia sentir saudades dos personagens, que nunca mais ia vê-los".

Manuela colaborou com Geraldo Carneiro em "Faça Sua História" (2008), com Mauro Wilson em "Aline" (2009-11) e com Duca Rachid e Thelma Guedes em "Cordel Encantado" (2011) e "Joia Rara" (2013).

As três protagonistas da trama: Thelma (Adriana Esteves), Lurdes (Regina Casé) e Vitória (Taís Araújo) - Globo/João Cotta - Globo/João Cotta
As três protagonistas da trama: Vitória (Taís Araújo), Lurdes (Regina Casé) e Thelma (Adriana Esteves)
Imagem: Globo/João Cotta

Além de Lurdes e Vitória, que surgem na primeira cena, uma terceira mãe, Thelma (Adriana Esteves), forma o tripé de "Amor de Mãe". Trata-se de uma novela que não tem um vilão como condutor do arco dramático. "O vilão é a vida", realça a autora.

"Esse é um princípio da dramaturgia da novela. Ela não tem vilão. Gosto de personagens pluridimensionais. É difícil você dizer que os personagens desta novela são totalmente bons ou totalmente maus. Não tem nenhum. Todos têm nuances, tem complexidades", observa.

"Assim, além da maternidade, da questão da estratificação social, a novela fala muito sobre isso, sobre pessoas muito boas que também cometem erros horríveis. As minhas três protagonistas cometeram erros horríveis. A gente vai descobrir ao longo da novela. E isso não faz com que elas deixem de ser boas", diz Manuela.

Mesmo Álvaro, o personagem de Irandhir Santos, o mais malévolo da trama, não é maniqueísta. "Ele comete maldades, mas não é o condutor da história", diz Villamarim. "Considero um grande desafio em matéria de dramaturgia. A pessoa espera o vilão. Teve gente que leu (a sinopse) e falou: não tem um vilão!"

Outros autores, como Manoel Carlos e Licia Manzo, por exemplo, já escreveram novelas sem ter um vilão conduzindo a história, lembra o diretor. Mas é raro.

A ausência de um vilão no centro da trama é uma questão essencial em "Amor de Mãe", frisa Manuela. "Esse é o meu ponto de vista sobre a vida. Deste ponto de vista nasce tudo. Não existe vilão. Quer dizer, existem. Pessoas muito egoístas, que fazem coisas horríveis. Estes são os vilões. Mas mesmo as pessoas com os piores defeitos do mundo, como a Cersei, de 'Game of Thrones', têm alguém."

Acrescenta a autora: "Hoje em dia, numa época de muito pouca tolerância, é importante a gente conseguir ver isso. A complexidade das pessoas. A nossa própria complexidade. Até num sentido de legalização da nossa complexidade. Às vezes, a gente tem inveja de alguém. Normal, né? Mas aí você logo quer criminalizar esse sentimento porque você não pode sentir inveja, porque inveja é uma coisa ruim."

Codiretor de "Avenida Brasil" (2012), ao lado de Amora Mautner, sob direção artística de Ricardo Waddington, Villamarim se dedicou nos últimos sete anos à direção de algumas das melhores minisséries que a Globo exibiu no período, como "O Canto da Sereia" (2013), "Amores Roubados" (2014), "Justiça" e "Nada Será como Antes" (2016), além das superséries "O Rebu" (2014) e "Onde Nascem os Fortes" (2018).

"Baseado nas séries que eu fiz, eu sei é possível fazer uma coisa mais artesanal. Montei uma estratégia para fazer uma novela que entre aspas não tenha a gramática da novela, que eu já fiz e deu certo. Me interessa fazer uma coisa com a 'mise en scène' (a encenação) mandando mais que as câmeras", diz o diretor.

Isso significa gravar com no máximo duas câmeras, e não quatro, como é praxe, usar uma iluminação mais geral, sem preocupação com o close, e ter cenários os mais realistas possível. "Não precisa estar ali filmando close, close, close. A gente não precisa disso mais. A televisão já tem uma qualidade. A gente precisa conversar com o espectador. A minha ideia é que ele nem perceba", explica Villamarim.

Regina Casé como Lurdes em "Amor de Mãe" - Divulgação/TV Globo - Divulgação/TV Globo
Regina Casé como Lurdes em "Amor de Mãe"
Imagem: Divulgação/TV Globo
O que esperar da história? "A minha heroína não é linda, maravilhosa, a Barbie. A minha heroína é a babá", reforça Manuela. "A novela é uma louvação a essa mãe guerreira, a esta luta pala vida. É isso que me comove, esse ser humano na luta para ficar vivo, para ser bom", diz.

Prossegue Manuela: "Eu vejo as pessoas querendo ser boas na vida. Foder com o outro, desculpe a expressão, é muito pequeno. No fundo, as pessoas querem ser bacanas, querem ser respeitadas, querem desenvolver suas individualidades. Mas tem muita falta de oportunidade, é muito difícil, muito pouca ferramenta e por aí vai."

E é a autora que completa: "E tem a emoção, além da questão da humanidade. Porque eu realmente não escrevo com a minha cabeça e não quero comunicar com nenhuma cabeça. Eu escrevo com o meu coração e com as minhas vísceras e quero comunicar com o coração e com as vísceras tuas. Acho que a transformação vem pelo coração, não pela cabeça".

Viajei ao Rio a convite da Globo.

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