Luciana Bugni

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Opinião

O que faz um bom pai? Duvivier disseca paternidade moderna em novo podcast

Quando Fernanda Lima fez o podcast sobre masculinidade (a segunda temporada do seu Zen Vergonha, que sempre recomendo aqui), Rodrigo Hilbert entrou na jogada para falar, em áudio, sobre a ausência de seu pai em casa e como isso se refletia nele.

Falei sobre isso nesta coluna, e é impressionante como homens têm desconstruído esse exemplo paterno equivocado e pautado no machismo para serem o extremo oposto com seus filhos. Bom, mas ao custo de gerações abandonadas.

Gregório Duvivier vem nesta trilha e esmiúça o conceito de "pai" em seu podcast O Pai Tá Onde?, da Audible. O texto primoroso é escrito por ele, Helena de Castro e Orlando Calheiros. Estar on parece ser fácil em tempos que até aquele que só leva no shopping de 15 em 15 dias pode fazer fotos caprichadas no Instagram e pagar de bom pai.

O negócio é saber onde anda esse moço de segunda a sexta, no horário comercial, quando o couro come no leva e traz da escola. Faz lancheira, faz almoço, faz lição e faz a vida do menor fazer sentido. Ufa.

Na bolha em que vivo, não posso dizer que existe esse tipo de pai. Gregórios e Hilberts se somam aos meus amigos que participam do pacote completo —acordam descascando manga, misturando com iogurte e salpicando aveia por cima.

Sabem o número do sapato da criança (eu não tenho a menor ideia do tamanho do pé do meu filho, preciso medir na loja), o material didático que precisa comprar, quanto custa uma flauta doce na Amazon e ainda manjam o nome daqueles jogadores de futebol japoneses da série da Netflix.

Porém, mesmo assim, há uma lacuna sobre a definição do que é ser um pai bom de verdade. Nas profundas conversas sobre esquema tático de seu time em alguma partida de 1993 em comparação com os dias atuais, não sobra espaço para homens conversarem entre eles sobre o aprimoramento da paternidade.

Outro dia, passei um tempão falando sobre isso com uma amiga, que chorou com uma comparação que só existia na cabeça dela: a de que eu sou mais paciente quando se trata de conversar com nossos filhos (não sou mais paciente que ninguém, há dias e dias para todo mundo).

Nesse papo, a gente analisou, a partir do convívio que temos com a criança uma da outra, o que podemos fazer para aprimorar nossa relação com eles e a educação que queremos dar.

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Meus amigos homens parecem estar nesse caminho. No bar, a conversa passa muito por o que fazer, especialmente quando os divorciados estão na berlinda com suas guardas compartilhadas nas costas e a responsabilidade que isso implica.

Gregório pontua inclusive que, com a notícia de que iria ser pai ecoando nos ouvidos, foi parar em uma livraria para saber o que deveria ler para executar melhor a função. Não tinha livro disponível, não. Bom, agora tem: o livro falado de Gregório, na Audible, tem mais de cinco horas de reflexão sobre o assunto.

Meu amigo Diego Olivares, do podcast 1 livro, 1 disco, 1 filme, vai ser pai no meio do ano e me indicou o conteúdo animado: "o timing justo de que eu precisava", ele disse. Tem gente querendo falar do tema (e de futebol também, que ninguém é de ferro).

Eu refuto um pouco o conceito de que mãe tem uma ligação mais intrínseca com as crias do que os caras, tratados, às vezes, como meros fornecedores de espermatozoide.

O buraco da ausência paterna para mim é uma lacuna pesada, que eu carrego há décadas com dificuldade. É muito complicado não saber direito o que há dele em mim, ou não ter memória de um diálogo adulto para saber minhas impressões sobre o cara que me criou até os 17 anos.

E olha que ele "só" morreu, como diz minha mãe. Tem pai ausente por opção, por alegação de incompetência, por preguiça, por um pouco de onipresença materna (não dá para fazer o que já foi feito, de fato, mas sempre dá para fazer antes).

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Entender o impacto da ausência da figura paterna em minha vida é um enigma que vai me acompanhar para sempre. Saber que meus amigos estão ouvindo Gregório, estudando, querendo saber mais para serem o melhor possível para seus filhos no universo machista que ainda vivemos é um alento. O mundo está cheio de desculpas do capitalismo para pais não estarem presentes.

Ser um pai decente é uma escolha diária para muita gente. Dá um alívio. Eu procuro pensar nisso cada vez que esbarro em uma foto de "paizão de Instagram" que não sabe a última vez que a criança foi ao dentista. É, talvez eu seja paciente, sim, minha amiga estava certa.

Você pode discordar de mim no Instagram.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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