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Luciana Bugni

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bebê Alice nos lembra que por trás do meme poderiam estar nossos filhos

 Alice e Fernanda Montenegro para o Itaú: publicidade é uma coisa, meme é outra - Reprodução / Internet
Alice e Fernanda Montenegro para o Itaú: publicidade é uma coisa, meme é outra Imagem: Reprodução / Internet

Colunista do UOL

07/01/2022 04h00

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Email inválido

Conheci Alice via WhatsApp em algum momento da pandemia eterna: uma menina fofa, que pronuncia palavras difíceis em português com maestria. Meu filho, que vai fazer cinco anos, não tem uma dicção tão boa quanto a dela, que ainda é apenas um bebê. Uma graça, daquelas que dá vontade de ver e rever e mostrar para os outros.

Não à toa, sua mãe, Morgana Secco, tem mais de 3 milhões de seguidores no Instagram. Quem resiste ao charme de Alice? Eu que não. O Itaú e outras marcas também perceberam o potencial da garota e Morgana assinou alguns contratos nos últimos tempos. Na mais famosa delas, do banco, Alice engata um diálogo com nada menos que Fernanda Montenegro. O resultado já dá para imaginar: é enternecedor.

Acontece que depois da propaganda, começaram a pipocar memes com a menina. Alguns, segundo a mãe, são engraçados. Outros de cunho político ou religioso — e a família não aprovou nenhum deles.

Há ainda o oportunismo de algumas marcas que não firmaram contrato com Morgana e mesmo assim usam a imagem do bebê para vender seus produtos. Absurdo.

Morgana foi às redes reclamar dos memes que ela julgou abusivos e pedir que as pessoas não compartilhassem coisas assim. Fiquei imaginando o que aconteceria comigo caso alguém estivesse compartilhando alguma das centenas (milhares) de fotos que fiz do meu filho nesses quase dois anos em casa. Enviei indiscriminadamente por WhatsApp fotos dele fazendo as mais fofas caretas (sou mãe, acho fofo, ué). E se alguém associasse essa careta a algo que não eu concordasse? E se alguém tentasse lucrar com isso? Eu seria muito menos educada do que foi Morgana em seu vídeo simpático.

Memes de criança: vale a pena mesmo?

A discussão me lembrou a menina Chloe, eternizada com seu olhar de reprovação que você vê aqui acima aos 2 anos, em 2013. Chloe virou símbolo para expressar aquilo que a gente não gosta. Hoje, quando fui escrever esse texto, me choquei ao contabilizar que a menina cresceu — e aos 10 anos pode não achar tão legal estar exposta em tudo que é canto da internet.

Porém, descobri que ela aprova, sim: seu meme foi leiloado recentemente e ela disse "isso é muito legal", segundo sua mãe.

Culpar Morgana pelo abuso de imagem que pode estar sendo feito com Alice após a propaganda do Itaú é leviano. "Dizer que a culpa é minha é como dizer que se a mulher saiu de casa com roupa curta merece ser abusada", ela definiu acertadamente.

Quase todo mundo expõe seus filhos menores nas redes ou WhatsApp e perde o controle da imagem deles.

O mínimo que podemos fazer com os memes indesejados de Alice, é o que gostaríamos que fizessem por nós, caso nossos filhos estivessem em uma situação semelhante. Exatamente como Morgana pediu: não compartilhar.

Crucificar a mãe que se sentiu invadida é cruel. Como se ela fosse obrigada a deixar-nos usar a fofura de Alice como bem entendêssemos apenas porque ela e sua mãe são pessoas públicas. Se Chloe e sua mãe estão lucrando com o leilão do meme e se sentem bem com isso, tudo bem. Mas quem tem que decidir o que será feito da ternurinha de Alice são os responsáveis por ela. E não o tribunal da internet — apesar desses acharem que são responsáveis por tudo. Você pode discordar de mim no Instagram.

Tem mais sobre isso nessa ótima matéria da Ana Bardella.