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Lucas Pasin

REPORTAGEM

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Chefe do núcleo investigativo da Globo é demitido sob suspeita de corrupção

A âncora do Jornal Nacional, Renata Vasconcellos, e ex-chefe de jornalismo investigativo da Globo, Tyndaro Menezes, no Emmy 2017 - Divulgação/Emmy
A âncora do Jornal Nacional, Renata Vasconcellos, e ex-chefe de jornalismo investigativo da Globo, Tyndaro Menezes, no Emmy 2017 Imagem: Divulgação/Emmy

Lucas Pasin e Igor Mello

Do UOL, no Rio

18/05/2022 14h15Atualizada em 18/05/2022 19h40

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Tyndaro Menezes, ex-chefe do núcleo de jornalismo investigativo da TV Globo, é investigado pelo MPRJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) por envolvimento com Ângelo Ribeiro de Almeida Júnior, denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro na compra de insumos médicos. Menezes foi demitido ontem. Almeida Júnior é ex-titular da Delegacia Fazendária fluminense. Em um trecho das conversas obtidas pelo MPRJ, o delegado diz que Menezes deve "receber sua parte em dinheiro" apesar de "não integrar nenhuma empresa".

Os trechos das conversas que citam ligação entre o jornalista e o delegado estão em um documento do MPRJ a que o UOL teve acesso e serão encaminhados, nos próximos dias, ao Ministério Público Federal, para investigação. Segundo apontamento do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) no documento, "o envolvimento de Tyndaro Menezes com o denunciado Ângelo Ribeiro fica ainda mais evidente no e-mail abaixo, enviado pelo denunciado a pessoa não identificada, onde ele expressamente afirma que iria repartir com o jornalista parcela do valor recebido."

E-mail anexado em documento de denúncia contra Ângelo Ribeiro de Almeida Júnior - Reprodução - Reprodução
E-mail anexado em documento de denúncia contra Ângelo Ribeiro de Almeida Júnior
Imagem: Reprodução

Tyndaro Menezes é, segundo o MPRJ, apresentado como Tyn no e-mail. "Mas precisei ser recepcionado pela outra ponta da operação, para com sorte, ficar com 1% do valor de nota de compra. Se ainda fosse de venda. Ah! E dividir com Tyn obviamente", diz o trecho destacado no documento do MPRJ.


De acordo com a investigação, em curso desde 2018, há conversas por aplicativos de celulares que também deixam clara a parceria no meio empresarial do delegado denunciado e Tyndaro Menezes. As conversas mencionam negócios com a Rede D'Or, Sérgio Côrtes - ex-secretário de Saúde da gestão Sérgio Cabral (MDB), entre 2007 e 2013, preso e condenado por lavagem de dinheiro, corrupção e evasão de divisas - e o cunhado de Côrtes, Sérgio Vianna.

"No contexto em que fala sobre compra de insumos médicos e sobre "SC" (Sergio Cortês) e família serem atravessadores de uma empresa de São Paulo, Ângelo fala que Tyndaro Menezes não integraria nenhuma empresa, mas, ainda assim, 'seria prestigiado'", informa o documento.

Conversa anexada em documento que denuncia  Ângelo Ribeiro de Almeida Júnior - Reprodução - Reprodução
Conversa anexada em documento que denuncia Ângelo Ribeiro de Almeida Júnior
Imagem: Reprodução

Afastamento e pedido de prisão

A denúncia do MPRJ foi aceita pelo juiz Marcello Rubiolli, da 1ª Vara Criminal Especializada da Capital, e se tornou pública no dia 12 de maio. Nela, o empresário Arthur César de Menezes Soares Filho, conhecido como Rei Arthur, e o delegado Ângelo Ribeiro de Almeida Junior são apontados como partes em uma ação de corrupção e lavagem de dinheiro. O MPRJ pediu a prisão preventiva do primeiro acusado, mas ele está foragido.

Arthur César de Menezes Soares Filho é acusado do pagamento de propina de R$ 2 milhões, em 2014, a Ângelo Ribeiro de Almeida Junior, que comandou a Delegacia Fazendária entre 2008 e 2015.

"Analisando-se o teor das conversas travadas entre o denunciado Ângelo Ribeiro e as diversas pessoas apontadas acima, é possível perceber, como já explicitado no pedido de prisão preventiva, os inúmeros contatos e a influência que ele exerce em diversas esferas, tanto no setor público como no privado", aponta o documento do MP. "Tais diálogos e demais provas apontaram possível necessidade de desdobramento de investigação por indícios de outras atividades criminosas desconexas com as aqui narradas."

Ângelo Ribeiro foi afastado do cargo de delegado da Polícia Civil e também da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), para onde estava cedido. Ele atuava como assessor da presidência, desde 2016, e havia sido levado pelo ex-presidente Jorge Picciani (MDB-RJ), morto em maio de 2021. O delegado perdeu o porte de arma e está proibido de frequentar a Alerj, mas não houve pedido de prisão nem para ele, nem para Tyndaro Menezes.

A demissão do jornalista foi confirmada pela TV Globo ontem à noite. A emissora, no entanto, disse que não comenta questões que possam envolver compliance, responsável por tratar de denúncias, conflitos de interesse, fraudes, subornos e desvios de conduta, entre outros assuntos.

O UOL tenta contato com Tyndaro Menezes e Ângelo Ribeiro para comentarem a investigação. O espaço segue aberto.

Passagem na Globo

Tyndaro Menezes coleciona diversos prêmios por reportagens ao lado de nomes como Tim Lopes, Cristina Guimarães, Flávio Fachel e Renata Lyra. Ele recebeu o Emmy pela cobertura do ataque da Polícia Militar ao Complexo do Alemão.

O jornalista começou como office boy pagando contas da emissora, como luz e água. Em entrevista para o blog Revista Plano, ele contou que foi a partir daí que resolveu fazer faculdade — ao mesmo tempo, cavando outros cargos dentro da emissora até parar no jornalismo investigativo.