Flavia Guerra

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Opinião

Simples e delicioso: 'Esquema Fenício' é Wes Anderson de sempre, mas melhor

Wes Anderson é o tipo de diretor que faz sempre mais do mesmo, mas faz de maneira tão deliciosa que é impossível não ver seus novos filmes. Por mais do mesmo, entenda-se mais uma trama que nasce de uma premissa inusitada, com personagens (ou tipos) cativantes e excêntricos, que protagonizam uma história alegórica, mas que falam de assuntos muito humanos e até atuais.

Isso sem contar o estilo inconfundível de sua direção geometricamente calculada, em que os movimentos de câmera são marcados, a atuação idem, além da direção de arte, a paleta de cores e o figurino serem sempre um espetáculo à parte.

Por tudo isso, "O Esquema Fenício" é mais um típico filme de Wes, mas é também diferente. Todo o combo que faz dele um filme de Wes Anderson está na tela, mas, ao contrário de outros filmes mais truncados, como "Asteroid City", o novo longa flui suavemente.

Benicio del Toro, que protagoniza a história ao lado da jovem Mia Threapleton, é puro charme e carisma. Mia, mesmo ainda jovem, mostra maturidade para atuar não só ao lado de del Toro, mas também de outros pesos pesados como Tom Hanks, Bryan Cranston, Michael Cera, Riz Ahmed, Jeffrey Wright, Scarlett Johansson, Benedict Cumberbatch, Charlotte Gainsbourg, Willem Dafoe, Beatrice Campbell, Bill Murray, entre outros.

Cena do filme 'O Esquema Fenício'
Cena do filme 'O Esquema Fenício' Imagem: Divulgação

O roteiro, escrito com o parceiro de longa data Roman Coppola, conta a saga do magnata Zsa-zsa Korda, um dos empresários mais ricos da Europa. Ameaçado de morte constantemente e sobrevivente de vários atentados e acidentes de avião, Zsa-zsa teme que seu último projeto seja interrompido caso ele morra. Para manter o projeto "Infraestrutura fenícia terrestre e marítima de Korda" de pé, ele decide deixar toda sua fortuna para sua única filha, a jovem freira Liesl (Mia Threapleton).

Zsa-zsa é pai de mais nove garotos, entre filhos biológicos e adotados, mas é nela quem confia não só a herança, mas também o apoio para convencer os parceiros comerciais pelo mundo a aceitar continuarem no projeto, mesmo diminuindo sua margem de lucro. Isso porque sofreu um revés depois que o governo dos Estados Unidos, na figura do engomado Mr. Excaliber (Ruper Friend), tenta minar o projeto aumentando o preço dos rebites usados na grande obra, que vai transformar uma região de um país não identificado do Oriente Médio.

Ao lado de Liesl e do professor de biologia e tutor das crianças Bjorn (Michael Cera), Zsa-zsa tem de negociar com empresários, empreiteiros e criminosos e tentar mantê-los longe de seus planos.

O que parece muito leve, descompromissado e divertido pode sempre ser lido como um comentário do diretor sobre a ganância, o abuso de poder e o fato de como magnatas têm tanto, ou mais, poder hoje e sempre do que o próprio poder público. Qualquer semelhança com um mundo em que empresários se tornam presidentes e políticos se dizendo "gestores" e "não políticos" pode não ser mera coincidência.

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Cena do filme 'O Esquema Fenício'
Cena do filme 'O Esquema Fenício' Imagem: Divulgação

Wes, que não por acaso é casado com a filha de um grande empresário libanês, trata com humor temas essenciais para se (re)pensar o mundo contemporâneo. Em segundo plano, a história de reconciliação, ou até mesmo aproximação, entre pai e filha, uma vez que Liesl ficou órfã de mãe muito cedo, não conviveu com o pai e suspeita que ele a matou.

Outras figuras hilárias, outro suspeito, outras esquetes (como só Wes sabe fazer sem nos desviar da trama principal), surgem no caminho da dupla, mas é com Zsa-zsa / Del Toro e com Liesl / Mia que passamos o tempo necessário para pensar na essência tanto dos negócios quanto das relações humanas.

E, assim, Wes, mais uma vez, traz mais de seu mesmo estilo, mas diverte, provoca e encanta com sua assinatura única. "O Esquema Fenício" é despretensioso e por isso delicioso, um dos melhores Wes dos últimos anos.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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