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"O Palestrante" satiriza mundo corporativo no Brasil que quer voltar a rir
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Como fazer comédia e como rir de si mesmo quando a situação é de um certo desespero? Quando sua vida é mediana, ou medíocre, seu trabalho é burocrático e as cobranças (de um chefe machista que faz piadas sem graça o tempo todo) te impedem de ter vida social e até mesmo conseguir tempo para almoçar. E quando tudo piora, pois você foi abandonado e seu casamento acabou sem aviso prévio e também sem aviso prévio ficou sabendo de sua demissão?
Em um país em que milhares de pessoas estão desempregadas, em plena crise política e financeira e, por que não, também existencial, não é difícil encontrar quem se viu há pouco tempo ou está em uma das situações acima. E como ir ao cinema e rir disso tudo? Talvez só mesmo com a ajuda de um palestrante motivacional, ou, para ser mais contemporâneo, as lições de um coach.
Este é o desafio que Fábio Porchat encarou ao escrever o roteiro de "O Palestrante", longa que estreia nesta semana e que traz o ator e comediante também atuando, pela primeira vez, ao lado de Dani Calabresa.
Na verdade, e na trama, quem acaba virando um palestrante é o próprio Porchat, que, vive o atrapalhado, mas carismático, Guilherme. Ele já passou por tudo descrito aqui acima e tem de ir de São Paulo para o Rio de Janeiro para assinar os documentos de sua demissão. Durante o voo, ele está triste, sem rumo, deprimido, mas, em um desses lances quase mágicos dos roteiros de comédia, conhece alguém (o sempre ótimo Evandro Mesquista) que lhe diz a o óbvio: "É preciso viver antes de morrer". Até então, Guilherme, que um dia já foi um cara divertido e "tequilero", estava vivendo no piloto automático.
Quando desembarca no Rio, Guilherme encontra alguém com uma placa: Marcelo Gouveia, aguardado para dar uma palestra em um hotel de campo em Itaipava, contratado por Denise (Dani Calabresa) para tentar motivar os funcionários de sua empresa, a Trino, que é responsável pela "brilhante" ideia da criação da tomada de três pinos.
A partir daí, as situações se tornam cada vez mais divertidas, embaladas por uma direção correta de Marcelo Antunez (de "Polícia Federal: A Lei é Para Todos" e de "Até que a Sorte nos Separe 3"), pelo roteiro simples, mas competente e perspicaz, de Porchat e pelo ótimo elenco, cujo núcleo principal já vale nossa ida ao cinema. Além de Porchat e Calabresa, que garantem também os momentos de comédia romântica da história, Antonio Tabet, Miá Mello, Paulo Vieira, Otávio Muller, Maria Clara Gueiros, entre outros, fazem com que lembremos porque a comédia é um gênero tão amado do brasileiro, mesmo em tempos de crise nos cinemas e do gênero.
Ainda que tenha sido filmado em 2018, "O Palestrante" tem ótimas sacadas sobre a atual situação de crise do trabalho e das relações contemporâneas. Não há a situação do já famigerado home office, mas as dinâmicas motivacionais e a crise de uma empresa que, na verdade quer "motivar" seus funcionários a trabalharem mais e felizes sem reclamar, já virou um clássico do nosso mundo corporativo.
Assim como já se tornou clássico e um personagem da sociedade brasileira, o personagem do coach. Quem nunca ouviu falar em coach quântico está desatualizado e merece uma palestra. E são estas sacadas de Porchat aliadas às performances dos atores que fazem de "O Palestrante" o que ele pretende ser: despretensioso, leve e feito para se rir de situações tantas vezes patéticas.
"Eu acho que este filme veio em boa hora porque a gente está na hora errada. Eu acho que o Brasil está num momento super difícil, político, eleição, pandemia.. Está todo mundo muito separado, brigado, gritando, nervoso. Este é um filme que não tem polêmica, política. É um filme para se divertir, para juntar a família do zap que se perdeu. Para mim é um filme que você vai ver para se divertir, esquecer dos problemas da vida, sair do cinema e falar: vamos comer uma pizza? Tem coisa melhor? Um filme para a gente dar risada, sem medo, e rir junto. O momento é da gente ir ao cinema junto. Porque faz diferença, né? Você ver uma comédia sozinha em casa e você juntar 200 pessoas num cinema e dar risada junto. Esta experiência do junto, de dar risada junto que eu sinto que o palestrante tem", comentou Porchat com esta colunista durante uma conversa na rádio Band News FM.
É clichê afirmar? É. Mas é fato que a comédia, e os comediantes, sempre atentos às dinâmicas sociais, têm a capacidade de fazer nos rir de momentos deprimentes e fazer com que, ao batermos no fundo do poço feito o personagem de Porchat, voltemos com a energia do humor para conseguir rir de nossas próprias misérias. Estamos, o cinema brasileiro, o Brasil e o brasileiro, precisando.
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