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"Tubarão" 50 anos: o impacto no cinema


Por: Ana Claudia Paixão - via Miscelana

Para geração X, entrar no mar e pensar em duas notas musicais é o suficiente para gerar pânico. Isso porque, há 50 anos, em 20 de junho de 1975, chegava aos cinemas norte-americanos Tubarão (Jaws, no original) - um filme que ninguém esperava que se tornaria um marco. Adaptado do romance de Peter Benchley, lançado apenas um ano antes, o longa passou por uma produção conturbada, marcada por problemas técnicos, um cronograma estourado e um diretor jovem e praticamente desconhecido. No entanto, contra todas as previsões, Tubarão não apenas se tornaria o filme de maior bilheteria da história até então como inauguraria uma nova era para o cinema norte-americano: a dos blockbusters de verão. E, de quebra, lançaria ao estrelato o nome de Steven Spielberg.

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Imagem: Reprodução

A origem do projeto remonta ao sucesso editorial do livro de Benchley, que rapidamente chamou a atenção da Universal Pictures. O jornalista se inspirou em duas histórias reais para criar sua história: a notícia de um pescador capturou um enorme tubarão-branco de mais de 2 toneladas ao largo de Montauk, em Nova York, em 1964, assim como a série de ataques de tubarão de 1916 em Nova Jersey, nos Estados Unidos, onde cinco pessoas foram atacadas, e quatro morreram, causando pânico generalizado na época.

Curiosamente, foi um diretor estreando no cinema com apenas 26 anos que transformaria o livro em um filme lendário. Spielberg havia chamado alguma atenção com Encurralado (Duel, 1971), telefilme tenso e inventivo sobre um motorista perseguido por um caminhão em uma estrada deserta. Os executivos da Universal viram potencial naquele diretor para lidar com uma narrativa de suspense centrada num predador invisível. Ainda assim, Tubarão foi sua primeira experiência com um grande estúdio e com locações em mar aberto - um desafio logístico que logo se revelaria quase insuportável.

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Imagem: Reprodução

O tubarão mecânico criado para as filmagens, apelidado de "Bruce" pela equipe (em homenagem ao advogado de Spielberg), frequentemente falhava e exigia reparos constantes. Por conta disso, o diretor foi obrigado a alterar radicalmente sua abordagem: em vez de mostrar o monstro em toda sua glória, ele o sugeria com movimentos de câmera, trilha sonora e reações dos personagens. Essa limitação acabou se tornando o maior trunfo do filme. Com uma combinação de silêncio e suspense, Spielberg transformou o invisível em aterrorizante - uma técnica que ecoa Hitchcock e que redefine o terror psicológico.

A trilha composta por John Williams, com suas notas graves e repetitivas, foi outro elemento decisivo. Ela tornou-se sinônimo de perigo iminente, funcionando quase como a "voz" do tubarão. Williams venceu o Oscar pela trilha e consolidou uma das parcerias mais icônicas da história do cinema com Spielberg.

Lançado em mais de 400 salas — um número extraordinário para a época -, Tubarão foi promovido com uma campanha publicitária nacional inédita, incluindo comerciais de TV em horário nobre. Isso, somado ao boca a boca explosivo, resultou numa bilheteria que superou 470 milhões de dólares mundialmente. O filme destronou O Poderoso Chefão como a maior bilheteria da história até então, só sendo superado dois anos depois por Star Wars.

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Mais do que sucesso comercial, Tubarão teve um impacto duradouro na cultura popular. Ele gerou medo coletivo de entrar no mar, popularizou o conceito de "filme-evento" de verão e tornou-se uma referência recorrente em diversas mídias, de Os Simpsons a Stranger Things. Deu origem a várias continuações - nenhuma delas à altura - e inaugurou a noção de que um filme podia ser uma franquia, com produtos licenciados, trilha sonora marcante e exibição massiva.

Para Spielberg, Tubarão foi o passaporte definitivo para a elite de Hollywood. Ainda que ele tenha enfrentado certo ostracismo da crítica nos anos seguintes - como muitos autores de blockbusters -, hoje é reconhecido como um dos maiores cineastas de todos os tempos, e Tubarão como sua primeira obra-prima. O filme não apenas definiu sua assinatura estilística — o uso da câmera como presença subjetiva, o olhar infantil diante do fantástico, o senso de escala e de humanidade em meio ao caos - como também deu início a uma filmografia que redefiniria o cinema norte-americano nas décadas seguintes.

Cinquenta anos depois, Tubarão permanece assustador, envolvente e tecnicamente impressionante. É um caso raro de obra que nasceu de limitações técnicas e superações criativas e, com isso, moldou toda uma indústria. Se hoje o verão é dominado por superproduções, se os trailers são lançados com meses de antecedência e se os estúdios apostam em bilheterias globais como fator decisivo, tudo isso começou com um tubarão que quase não funcionava. E com um diretor que viu no medo invisível uma oportunidade de ouro para reinventar o suspense - e fazer história.

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Imagem: Divulgação

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do BOL

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