SETE VEZES JAPÃO

As descobertas e inspirações em viagens pela Terra do Sol Nascente

Fernanda Takai Curadora de Nossa na Temporada Japão

Encontro com o "Japan bug"

Demorou muito para eu conhecer o Japão. Meu irmão mais novo estava fazendo uma especialização em Tóquio e acabou sendo o maior incentivo para, finalmente, eu colocar os pés na terra dos meus avós paternos, em 2006.

A primeira vez em Tóquio é um desespero bom. Tem tanta coisa pra ver, comer, sentir. Mas a verdade é que o mega jetlag de 12 horas existe. Todo mundo avisa. Parece que tudo vai bem porque a gente está tão emocionado e impactado que vai levando. A primeira coisa é tentar se acertar. Se chegou à noite, tente dormir. Se chegou de dia, tente passar o tempo e só se renda mais tarde. As refeições nos ajudam a calibrar isso.

Ficamos bem atentos aos horários de funcionamento de museus e passeios por causa da época do ano. Destaque para a visita ao Miraikan (Museu Nacional de Ciências e Inovação), as lojas em Shibuya (especialmente a Donqui e a Tokyu Hands), a região de Harajuku (conhecida pela cenário de moda e arte de rua), o passeio de barco pela baía de Odaiba e a Rainbow Bridge.

Estivemos em Quioto (visita obrigatória pelos templos, jardins e tradição) e Himeji (por causa do castelo que é o maior e dos mais bonitos que já vi). Viajamos de shinkansen, o trem-bala — ter comprado o Japan Rail Pass foi ótimo.

Passamos a virada do ano em Naeba, na província de Niigata. Muita neve e amigos da universidade do Rafael, meu irmão. Eles foram esquiar e a gente foi junto! Só foi fácil voltar porque nossa filha tinha só 2 anos e saudade batia forte.

Estreitando laços

Havia mais para ver, claro. Em 2007, fomos a trabalho e ancorados por um evento durante a abertura da Semana de Moda do Japão. Assim como no Brasil, cantei no desfile do Ronaldo Fraga, coleção dedicada à Nara Leão, repertório do meu primeiro disco solo.

Comprei um puppet na Donqui que chamei de Pochi — anos mais tarde ele viria a ser astro do álbum "Música de Brinquedo" (com covers gravados em miniaturas de instrumentos e instrumentos de brinquedo). O selo Taiyo Record estava lançando os trabalhos do Pato Fu e fizemos apresentações para divulgá-los na Tower Records, num templo em Kagurazaka e num charmoso café em Kamakura.

Nas horas livres, conhecemos com calma o bairro de Ueno e o inesquecível Museu Ghibli, em Mitaka, no subúrbio de Tóquio. Nessa ocasião, pudemos ter mais contato com japoneses que amam e divulgam a música brasileira: jornalistas, radialistas, donos de pequenos negócios que fazem grande diferença. Fizemos um amigo pra vida toda, Itoh-san. Ele é o maior responsável por nossa carreira no país.

A ideia do meu primeiro livro infantil, 'A Gueixa e o Panda-vermelho', surgiu após uma visita ao zoo de Ueno e um passeio pelo bairro de Kaguraz, onde havia gueixas em uma Tóquio antiga.

Fernanda Takai

Nos palcos

Já com minha carreira solo lançada e repercutindo no Japão, em 2008, fui convidada a voltar para shows com o repertório do disco "Onde Brilhem Os Olhos Seus" e o Pato Fu para apresentações em cidades onde havia muitos dekasseguis — brasileiros trabalhando nas fábricas japonesas.

Foram shows em Tóquio, Hamamatsu e Toyohasi. Na capital, meu show solo aconteceu no Sogetsu Hall, e com a banda, no Club Quattro em Shibuya. Serginho Groisman estava lá, gravamos matéria pro seu programa e depois ele foi ao show e até dançou no palco com a gente!

Dessa vez, conhecemos pessoalmente a Maki Nomiya, vocalista do Pizzicato Five, banda que sempre amamos, e ela aceitou participar do show como convidada mais do que especial. Desse encontro nasceu a ideia de fazermos o EP "Maki Takai No Jetlag", que saiu apenas em edição japonesa, item raro de colecionador.

Os shows na capital estavam repletos de japoneses, mas, no interior, foi emocionante encontrar em praça pública jovens brasileiros que estavam longe de casa, numa rotina profissional pesada. A banda Trash Pour 4 foi o artista de abertura pois dividíamos alguns músicos. Desta vez, também pudemos levar parte de nossa equipe de som, luz e produção para a experiência incrível que é estar profissionalmente naquele país.

Passagem express

Dois meses depois retornaria a Tóquio (Suntory Hall) e Nagoya (Shirakawa Hall) para dois concertos junto ao pianista Marcelo Bratke e a jovem Camerata Vale Música. A programação fez parte da comemoração dos 100 anos da Imigração Japonesa ao Brasil.

Eu estava no meio da minha turnê solo, com muitas datas confirmadas, não pude esticar nem um dia sequer. Viajei 30 horas, cheguei, fui dormir. Acordei e ensaiei com todos os músicos pois no Brasil eu só tinha ensaiado com o Marcelo em São Paulo — a Camerata estava no Espírito Santo.

Fizemos um show num dia, no outro já partimos pra Nagoya. Logo em seguida, embarquei de volta ao Brasil. Foi um esforço que valeu muito a pena, me apresentei para uma plateia bem diferente que das outras vezes. Muitas empresas, diplomatas e japoneses que ainda não me conheciam. Mas zero tempo pra turismo.

O reencontro com o país

A vida passa cada vez mais rápido na medida que ficamos mais velhos... Após oito anos, enquanto estava viajando bastante no Brasil com o "Música de Brinquedo", com meus discos solo e parcerias com outros artistas — como Andy Summers (The Police) —, escrevendo livros, gravando DVDs em locações especiais, como o museu a céu aberto Inhotim, finalmente chegou a hora de voltar ao Japão.

Dessa vez, foi uma turnê acústica acompanhada de Camila Lordy (piano) e John Ulhoa (violões). Chegamos via Nagoya e pudemos conhecer um pouquinho mais da cidade. Tenho uma canção chamada Nagoya, parceria com João Donato, Maki Nomiya e John, que fala sobre uma viagem de trem pelo país, passando por várias cidades, e ela estava no repertório, assim como outras de minha carreira solo.

Passamos por um teatro lindo em Toyohashi em companhia da artista plástica Sandra Hiromoto. A cidade hospedava também a Trienal de Arte de Aichi. Depois, partimos para Yamagata, Kamakura, Tóquio e Oizumi.

Também em 2016, Itoh-san, do selo Taiyo, outra vez nos ajudou na produção dos eventos num pool entre organizadores brasileiros e japoneses. Todos muito amáveis e a gente muito feliz por essa nova oportunidade.

Entre cada cidade, fizemos passeios lindos como o templo Yamadera, uma experiência deslumbrante em Yamagata, onde conhecemos um pouco dos vinhos da região. O Café Vivement Dimanche, em Kamakura, mais uma vez nos recebeu com muito afeto.

Muitos brasileiros em Oizumi, encontros emocionantes. Em Tóquio, voltamos a uma de nossas lojas de brinquedo preferidas, a Kiddieland, em Omotesando. Visitamos a J-Wave no programa do Jim Nakahara, que é nome importante da divulgação da música brasileira por ali. Tocamos no Praça Onze, emblemático espaço que já tinha recebido até a Clara Nunes! Maki san deu uma canja com a gente, sempre simpática.

Viagem como pais-guias

Desde muito novinha, nossa filha Nina vinha se apaixonando pela cultura japonesa. Lia mangás, assistia a animes, gostava de desenhar com traços vindos da estética oriental, além de conhecer e adorar vários pratos da culinária do país. Tinha chegado a hora do seu presente de 15 anos, uma promessa feita anos atrás. Demorou, mas aconteceu: em 2018, ela iria conhecer Tóquio!

Mais uma vez eu e John, meu marido, passamos a virada do ano na capital, agora com a tarefa de pais-guias. Durante as duas semanas, escolhemos ficar em três hotéis diferentes pra conhecer melhor os arredores de cada um.

Tivemos que repetir a vista ao Ghibli Museum, zoo de Ueno, Tower Records, Odaiba, mas também conhecemos lugares que ainda não tínhamos estado como a Tokyo Tower, Palácio Imperial, Samurai Museum, Team Borderless, o bairro dos gatos Yanaka, Trick Art Museum, várias lojas em Akihabara & Nakano (paraíso dos otakus, pessoas que se interessam pela cultura pop japonesa, em especial os animes e mangás).

Foi o tempo de experimentar cada dia um prato novo, andar pelos parques, templos e ruas, entrar nas lojinhas vintage de Shimokitazawa, pegar algumas linhas de metrô pelo prazer da paisagem da superfície, visitar a iluminação especial de Natal e Ano Novo em instalações futurísticas. Entrar na agitada rua Takeshita e descobrir as lojinhas de tudo, conhecer um Cat Café, ver de novo as tranqueiras na Donqui.

Conseguimos nos encontrar com amigos que fomos fazendo ao longo dos anos, como o Willie, do Barzinho Aparecida, e outros que admiramos de longe como a Priti & Loghan do canal Japão Nosso de Cada Dia. Apesar de ter um planejamento nosso, a ideia era férias sem correria, sem pressa. Queríamos mostrar à Nina um pouco desse país que havia nos encantado desde a primeira vez.

Fui, mas volto já

Em 2019, recebi o convite da querida Lisa Ono para uma temporada nos lendários Blue Note Tokyo e Nagoya. Foram 10 apresentações totalmente esgotadas onde tocamos um repertório de lindos clássicos brasileiros e algumas surpresas no caminho.

Lisa tem uma carreira consolidada no Japão e, generosamente, convida alguns nomes do Brasil para dobradinhas especiais. Foi uma viagem bem rápida, eram duas apresentações por dia. Uma semana de trabalho em excelente companhia.

Ainda falta eu conseguir presenciar a florada dos sakuras, mas tenho certeza de que no futuro colocarei em prática meu plano quase secreto de passar uns meses viajando para outras tantas regiões do país que ainda não conheço. Alguém quer vir junto?

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