Como surgiu Bob Wolfenson?
Somos de uma família judia que chegou ao Brasil no período entre guerras, vinda da Europa Oriental. Portanto, Wolfenson é de família, meu nome é Roberto, mas foi num curso de inglês que fiz na adolescência minha professora me chamava de Bob. O apelido pegou.

Quando comecei a publicar fotos na imprensa assinava Roberto Wolfenson, mas era conhecido por Bob. Quis juntar os dois num só. [risos] Enfim, obviamente Bob não é à toa, acho que funcionava mais como nome artístico. Com o tempo, até minha mãe me tratava por Bob. Muita gente acha que sou gringo. Mas me sinto profundamente brasileiro até neste momento horroroso pelo qual passamos.

Como se tornou fotógrafo?
Só fui ser fotógrafo em razão da morte de meu pai, quando eu tinha 16 anos. O fato precipitou-me na busca por algo para fazer e preencher as dores da falta que ele me fazia -- e ajudar minha mãe que precisava de algum auxílio. Consegui um emprego no estúdio da Editora Abril como estagiário faz tudo. Aprendi muito, e mais que tudo, muito jovem eu já tinha um ofício. Curiosamente, eu não era apaixonado pelo que fazia. Entrei na faculdade de Ciências Sociais e fiquei dividido entre estes dois polos, me tornar um cientista social ou desenvolver meu ofício. O resultado todo mundo sabe.

Quais os retratos que marcaram seu início?
Os trabalhos que se tornaram importantes ao longo do tempo me deram algum prestígio inicial. Entre eles, os retratos da grande arquiteta Lina Bo Bardi e do artista visual Hélio Oiticica, feitos quando eu tinha 20 e poucos anos, e mais a capa do disco "Outras Palavras", de Caetano Veloso. Mas ainda nada que confirmasse "meu talento".

Quando você se mudou para Nova York, quais eram as expectativas?
Neste período, via exemplos em outros fotógrafos e me sentia sem recursos técnicos para chegar aos resultados que almejava. Eu me considerava medíocre, e resolvi tentar aprender de novo. Vendi tudo o que tinha e me mudei para Nova York. Mandei cartas para cinco fotógrafos que admirava -- sim, eram cartas. Bill King me chamou. Fiquei pouco tempo, mas o suficiente para aprender o que eu precisava.

O estúdio era uma espécie de Hollywood da fotografia, muitas modelos e atrizes em sessões trepidantes bem ao seu estilo: saltos, pulos, e malabarismos corporais"

Ficou famosa sua suposta rivalidade com o fotógrafo J.R. Duran e a disputa cordial na "Playboy". Como era o clima entre vocês?
Eu gosto de rivalidade, acho importante ter alguém que, em tese, tem os mesmos desafios que você e os resolve de uma outra maneira. Como era o caso do Duran, ele já está inscrito no panteão de grandes nomes da fotografia brasileira. Mas, na medida do possível, mantínhamos e mantemos até hoje uma cordialidade, respeito e admiração mútuos.

E a atmosfera da revista?
De muita liberdade e desafios. Eu bolava minhas historietas numa aliança com a mulher escolhida para a capa e íamos em frente meio ao sabor dos acontecimentos achando cantos, posições, expressões e nexos para aquela personagem inventada. Foi um período áureo onde os meus anseios de realização artística se confundiam aos anseios editoriais da revista.

Em 2003, você deixou a Playboy. O que houve?
Chegou alguém, não lembro o nome do sujeito, que disse: "Quem é este cara que faz o que quer aqui?" [risos]. E quis cortar minhas asinhas. Obviamente não me adequei às novas diretrizes. Em 2008, voltei a fazer por imposição da minha amiga Fernanda Young que me quis como fotógrafo do ensaio dela. Em 2013, fiz o último com a Nanda Costa que ficou no nível daqueles mais antológicos, dos anos 90/2000.

A fotografia de Sônia Braga, acima, foi feita em 1987. Atualmente, a atriz é antitabagista.

Existe alguma diferença entre a primeira vez e quando você fotografa a mesma pessoa de novo, anos depois?
Sim, tanto eu quanto o fotografado estamos diferentes. Eu não sou a mesma pessoa de quando fotografei a Maria Bethânia há 30 anos, nem ela é. Enfim, são dois momentos muito diferentes e isso vale para todos os outros a quem fotografei muitas vezes. Também por isso repito a ideia de que um bom retrato não tem a ver com a revelação de uma essência profunda da pessoa, a tal da alma. Como diz o grande fotógrafo americano Richard Avedon, "raspe a superfície e, se tivermos sorte, o que encontraremos é mais superfície".

Quais as suas maneiras de revelar a beleza das pessoas?
Em última instância, não é isso que busco. A interação e cooperação com o sujeito diante de mim é o que determina o alcance da tal beleza que, na maioria das vezes, não é especialmente ligada aos atributos físicos do fotografado.

O francês Henri Cartier-Bresson era conhecido por desprezar fotografias montadas. Dizia que os fotógrafos deveriam registrar sua imagem de forma espontânea. Você, conhecido por fotos mais produzidas, o você perguntaria para ele?
Eu diria: "Henri você é um monstro, um dos maiores artistas do século 20. Se a fotografia tem algum tributo a render a alguém, este seria para você. Em relação ao seu axioma, Bresson, entendo perfeitamente e não posso contrapor meu trabalho ao seu. De fato, não tenho estatura para tal". No entanto, gosto de uma frase do fotógrafo alemão Thomas Ruff sobre estas questões: "a diferença entre o que eu faço e o que faziam os fotógrafos alemães do começo do século 20 é que eles acreditavam que capturavam a realidade e eu acredito que crio uma imagem".

"Sorria!" ou "Faça aquele gesto novamente"? Qual das duas gera mais constrangimento?
Sempre tem. O processo em si é, muitas das vezes, ridículo, mas é o processo. Para que se possa chegar a algo que seja relevante é frequentemente necessário passarmos por estes constrangimentos.

Qual a diferença entre uma boa imagem e uma medíocre?
O tempo é senhor e vai conferindo relevância àquelas imagens que são boas. Há um mistério em como se obter uma boa imagem, apesar da objetividade da fotografia e de seu poder de quase reproduzir o real à sua semelhança, é preciso que haja alguém com ideias, talento, técnica e potência, que esteja por detrás da câmera. E isso, assim mesmo, não é garantia de que um fotógrafo com estes atributos consiga só fazer boas fotos.

Mas isto mudou com a chegada dos smartphones, não?
A fotografia com celular franqueou a muita gente a possibilidade de fotografar. Eu acho isso muito bom, da quantidade sai a qualidade. E há muita coisa em andamento que não estamos vendo e é, provavelmente, uma produção muito potente. Contudo, há poucos Fotógrafos, com F maiúsculo, porque fotografar não torna alguém fotógrafo.