Topo

Brasil é destaque na Bienal de Arquitetura de Veneza com instalação sobre tradições indígenas

Oca dos índios Kuikuro, do Alto Xingu - Reprodução
Oca dos índios Kuikuro, do Alto Xingu Imagem: Reprodução

29/05/2021 09h51

O Brasil tem participação importante na 17ª Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza, que abriu suas portas em 22 de maio. Além do tradicional pavilhão brasileiro, o país participa com uma videoinstalação criada pelo cineasta Takumã Kuikuro e o designer Gringo Cardia. O projeto mostra como o modo de vida dos indígenas pode contribuir na reflexão sobre o futuro da nossa maneira de viver.

A Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza é tradicionalmente uma vitrine das proezas em termos de construções e urbanismo, na qual cada país mostra a sua visão do habitat contemporâneo. Mas em suas últimas edições, os organizadores têm se preocupado muito mais com as formas de ocupar o mundo, que vão bem além dos edifícios.

Regida pela temática "Como nós viveremos juntos ?", esta edição também segue a mesma linha. Seu curador, o arquiteto libanês baseado nos Estados Unidos Hashim Sarkis, pediu aos participantes propostas para, cada um à sua maneira, atacar as causas dos conflitos e das desigualdades que assolam o planeta.

Convencido de que a cidade do futuro é a cidade que nasce da partilha de espaços comuns, Sarkis defende uma arquitetura concreta e menos monumental. "Se alguém cria espaços para se reunir, onde as pessoas passeiam, verá a vida cotidiana dos outros, lugares nos quais geralmente isso não se via e onde se vê, também, as diferenças econômicas, étnicas. Esse é o início do diálogo. A arquitetura pode ajudar a transformar" a sociedade, explicou o curador pouco antes da inauguração.

Seguindo essa linha diretriz, o Brasil é representado com "Utopias da Vida Comum" projeto que tem curadoria do estúdio colaborativo Arquitetos Associados e do designer visual Henrique Penha. As duas salas do pavilhão brasileiro acolhem espaços chamados "Futuros do passado" e "Futuros do presente", que tratam as utopias de ontem e de hoje quando o assunto é discutir as metrópoles contemporâneas.

Mas os brasileiros também estão presentes no pavilhão central da Bienal, no âmbito do projeto Future Assembly, uma iniciativa pilotada, entre outros, pelo artista Olafur Eliasson. É nesse espaço que está exposto Oca Red, uma videoinstalação fruto da colaboração entre o cineasta Takumã Kuikuro e o designer Gringo Cardia.

"Como se relacionar com o ao redor"

"A gente fez uma instalação mostrando a relação que os povos indígenas têm com o morar, com o viver junto e como se relacionar com o ao redor", explica Cardia. Habituado com projetos espetaculares, esse arquiteto de formação deixou de lado as grandes construções para se concentrar nas tradições ancestrais dos índios Kuikuro, do Alto Xingu.

"Como arquiteto, vejo que o que gente aprende com os povos da floresta é essa relação de equilíbrio entre o coletivo e o entorno, o ambiente. Eu acho que essa é a grande questão do século 21. E nossos povos indígenas vivem de forma equilibrada com isso há mais de 12 mil anos", resume.

Cardia conheceu a realidade dos moradores do Alto Xingu após uma residência na região, a convite da Paul Heritage, diretor do centro de arte e pesquisa Peoples Palace Projects, uma instituição ligada à Universidade Queen Mary de Londres, que também está por trás do projeto Oca Red. Mas foi graças às imagens e ao olhar do cineasta Takumã Kuikuro que o projeto de Veneza ganhou vida. "É muito importante mostrarmos nossa realidade. Como nós vivemos na aldeia e que nós estamos preservando e lutando pelo meio ambiente", explica o cineasta.

Imagem da instalação audiovisual apresentada na Biennale Architettura 2021 - Reprodução - Reprodução
Imagem da instalação audiovisual apresentada na Biennale Architettura 2021
Imagem: Reprodução

Kuikuro não esconde o aspecto político de sua participação em um evento internacional. "Essa instalação na Bienal de Veneza é muito importante para falar da nossa realidade e de como nós nos preocupamos com nossa terra. Como lutamos pela preservação do meio ambiente, que realmente está sendo atacado pelos fazendeiros e por esse novo governo do Brasil", acusa.

Kuarup, uma árvore e um ritual

Um dos símbolos de seu povo é representado em Veneza pelo Kuarup, tronco de árvore, mas também um ritual, que viajou até a Bienal. "O Kuarup é um ritual que todos os anos os índios fazem em referência aos mortos, como um círculo da vida", conta Cardia. "Eles transformam esse tronco com os adornos de um indígena, que fica uma mistura de natureza-homem e homem-natureza. A arquitetura, no século 21, tem que tentar fazer essa reconexão do homem, da sua casa, com o sagrado, que é a natureza em volta dele".

A 17ª Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza vai até 21 de novembro.