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Devastado por pandemia, turismo de negócios tem futuro nebuloso

Getty Images
Imagem: Getty Images

06/01/2021 09h27

A pandemia de coronavírus obrigou milhões de empresários do mundo a fazer a distância o que sempre fizeram face a face. O impacto no turismo de negócios, dizimado desde o aparecimento da Covid-19, é de difícil reversão.

O ano de 2020 foi o pior da história da aviação, na qual as viagens profissionais representam a maior fatia das vendas dos bilhetes mais caros. Na hotelaria não foi diferente - em países como a França, a clientela corporativa ocupa 70% dos quartos. Na capital Paris, cidade mais visitada do mundo, a fatia é menor, entre 36% e 50%, mas o impacto é igualmente devastador.

O especialista em turismo Mark Watkins, presidente da respeitada consultoria Coach Omnium, avalia que a pandemia terá um impacto irreversível nas reuniões curtas, que provaram ser eficazes por videoconferência. Entretanto, ele crê na recuperação do segmento ligado a grandes feiras e seminários.

"A longo prazo, não acredito nem um pouco no fim das convenções porque precisamos continuar nos vendo. Já faz quase 30 anos que estudamos esse mercado e percebemos que as reuniões virtuais, que melhoraram muito com o desenvolvimento de tecnologias, são perfeitas para reuniões de duas horas no máximo", afirma. "Se você tem muitas reuniões em um dia ou tem um evento que vai durar vários dias, não é possível. É insuportável."

Nas redondezas dos centros de convenções, hotéis às moscas

Em bairros como Porte Maillot ou Porte de Versalhes, onde se localizam importantes centros de eventos profissionais, hotéis gigantescos estão às moscas. Para Watkins, esse cenário ilustra o que era uma evidência bem antes da pandemia: a multiplicação de estabelecimentos dependentes de encontros empresariais foi um erro estratégico das redes hoteleiras.

"Em 12 anos, reduzimos em média um dia a duração de eventos com reuniões, inclusive em convenções de seminários, que agora duram em geral dois, e não mais três dias. Por consequência, há menos necessidade de hotéis e as pessoas também estão dispostas a percorrer menos distâncias para as viagens profissionais", constata o especialista. "Antigamente, era legal fazer uma convenção no Marrocos ou na Grécia, mas isso já estava acabando. Ir de Paris à Irlanda, a duas horas daqui, já é algo a ser evitado."

No Brasil, país de dimensões continentais, o presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens Corporativas (Abracorp), Gervasio Tanabe, acompanha essa tendência. "Se a gente tiver uma notícia boa da vacinação, por exemplo, talvez o cenário mude bem. Fazer negócios por vídeo ainda não pegou. Ainda não acontece. Mas na nossa percepção, sim, haverá uma redução do número de viagens", assume Tanabe.

"Por enquanto, ainda não conseguimos dizer que vai ser 15, 20 ou 30%. Mas os nossos associados estão reduzindo estruturas porque anteveem uma queda do volume de viagens. No que antes precisavam de cinco viagens para viabilizar a assinatura de um contrato, talvez agora esse número caia para duas", indica o presidente da Abracorp.

Reuniões mais enxutas

Desde a pandemia, os empresários demonstram a intenção de descentralizar grandes reuniões presenciais das equipes espalhadas pelo país. Tanabe conta o exemplo do CEO de uma multinacional que, duas vezes por ano, costumava reunir centenas de colaboradores em São Paulo. A partir de agora, é ele quem vai se deslocar às cinco regiões do Brasil.

"É uma expectativa positiva porque movimenta o turismo regional e a infraestrutura de eventos corporativos. Por mais que tenha a vacina, a gente acha que as grandes aglomerações de pessoas vão diminuir", avalia Tanabe.

Neste contexto, a adaptação de hotéis ao famoso "novo normal" é uma exigência - não apenas com adoção de rígidas normas sanitárias, mas também com melhorias na oferta de tecnologias, como uma internet eficiente. O presidente da Abracorp lembra ainda que o turismo corporativo abrange muito além de hotéis e transportes.

"Esse é um ponto crucial: não estamos só impactando hotelaria, agências corporativas e companhias aéreas. Estamos impactando uma cadeia enorme que flutua nessa rede corporativa", ressalta. "Por isso a nossa preocupação de que esse mercado tem que voltar - por mais que seja em 50% ou 40%."

Na Europa, a França é o país que mais recebe congressos internacionais, longe à frente de Lisboa e Berlim. A pandemia significou a anulação de 800 feiras e congressos no ano passado, conforme a Secretaria de Turismo e de Congressos. Os cancelamentos geraram um prejuízo estimado em 4 bilhões de dólares para a capital.