Poço 'sem fundo' com água azul e lenda intrigam visitantes de caverna em GO

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Com fama de "sem fundo", águas que mudam de cor e a lenda de um vaqueiro desaparecido, o Poço da Camisa se tornou um dos lugares mais intrigantes de Goiás.
A atração fica em uma área privada de Divinópolis de Goiás, a 14 km do núcleo São João do Parque Estadual de Terra Ronca. O acesso é por dentro de uma fazenda, mas o atrativo não integra oficialmente a unidade de conservação, apesar de fazer parte do mesmo circuito espeleológico.
Curiosamente, o poço é, na prática, uma cratera formada pelo desmoronamento natural do terreno de pedra calcária — fenômeno que os geólogos chamam de dolina de colapso.
A profundidade conhecida chega a 90 metros: 30 metros de paredão seco até a água e outros 60 submersos. Em mergulho técnico, uma equipe alcançou esse limite e encontrou um conduto lateral ainda inexplorado. Esse túnel reforça a fama de "sem fundo", alimentada há décadas por histórias locais.
Lenda de desaparecimento
Já o nome do poço vem de uma lenda repetida de geração em geração.
Conta-se que um vaqueiro sumiu na região e sua camisa foi encontrada presa em um galho perto do poço. Por isso o lugar ficou conhecido como Poço da Camisa, disse o espeleólogo e espeleofotógrafo Alexandre Lobo, que fez parte da equipe que explorou o local até 60 metros de profundidade.
A história aparece em múltiplas versões. Há quem diga que o vaqueiro teria sido devorado por uma onça, outros relatam que ele caiu do cavalo, e há também narrativas de assassinato. Em todas, a imagem final é a mesma: a camisa presa no galho. Para Lobo, mito e ciência caminham juntos:
A caverna é a última fronteira de exploração na Terra. Assim como o espaço sideral, ela nos dá a sensação de desejo e medo ao mesmo tempo.

Água que muda de cor
As águas variam entre azul-turquesa e verde, conforme estação e luz solar. O efeito resulta da combinação entre a transparência da água em terreno calcário, a presença de calcita, o volume de chuvas e a luz que entra por uma abertura no topo do poço, como uma claraboia natural.
Na seca, a água fica mais cristalina e azulada; na cheia, mais esverdeada, explicou Lobo.
O acesso exige uma descida de rapel de 40 metros direto para a água. Não há ponto de apoio, e todo o equipamento — cilindros, lanternas e até um bote inflável — precisa ser içado por corda.
Cada mergulho requer uso de tecnologia e treinamento específicos. "Cada minuto a 60 metros compromete o tempo de descompressão. É preciso usar misturas de gases e circuito fechado (CCR) para minimizar a janela de descompressão", relatou Lobo. Ele ressalta que o poço não é adequado para mergulho recreativo: apenas mergulhadores técnicos, com equipamentos especiais, conseguem explorar o local.
O terreno é instável e pode ter desprendimento de blocos de rocha. Lobo defende que, antes de qualquer abertura ao turismo, seja feito um plano de manejo espeleológico com estudos de segurança geológica, hidrologia, biota e química da água.
Tentativa de turismo comercial
A agência Peregrino Aventura avaliou explorar o poço turisticamente, mas desistiu antes de começar.
É um atrativo de altíssimo risco e de acesso difícil, indicado para um público muito específico. Avaliamos e decidimos não seguir adiante, para não sobrecarregar o local, disse Marcelo Peregrino, dono da empresa.
A logística inviabiliza passeios regulares. A trilha até o poço tem 1 km por dentro da fazenda e, ao final, é necessário fazer o rapel direto na água. "Não é um atrativo comercial para grande público. É um ambiente muito delicado, e a gente prefere preservar", afirmou Peregrino.
O interesse pelo Poço da Camisa vem desde os anos 1990. Peregrino lembra que exploradores franceses já haviam catalogado o local e levantado a hipótese de ligação com o aquífero Urucuia, que abastece parte do Centro-Oeste.
Gestão ambiental
O Poço da Camisa não tem manejo oficial nem fiscalização pública. Em nota, a Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás) informou que o atrativo está em área privada, fora de unidades de conservação estaduais. Por isso, não há diretrizes de manejo, fiscalização ou conservação definidas pelo Estado.
Hoje, o acesso depende exclusivamente do proprietário da fazenda. Sem plano de manejo aprovado, a visitação permanece restrita a expedições pontuais de exploradores e pesquisadores autorizados.



























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