Parece ficção científica, mas não é: o plano para evitar que Veneza afunde
Colaboração para Nossa
17/05/2025 05h30
Considerada por muitos uma das cidades mais românticas do mundo, Veneza tem também uma característica que preocupa: construída em cima de estacas de madeira, a cidade vem afundando mais a cada ano. Para evitar que Veneza afunde completamente, um projeto curioso pretende elevar seu subsolo em até 30 centímetros.
Segundo o Royal Museums Greenwich, do Reino Unido, o nível do solo em Veneza está afundando cerca de 1 milímetro anualmente por conta de processos naturais. Junto à lenta imersão de suas estruturas, Veneza sofre também com o aumento do nível do mar — o nível médio pode estar de 17 a 120 centímetros mais alto na cidade até 2100.
Embora a lagoa veneziana tenha mais de 500 quilômetros quadrados no total, a área tem uma profundidade média de apenas um metro.
"A parte mais baixa da Praça de São Marcos está apenas 55 centímetros acima do nível médio atual do mar", diz o portal do museu britânico. Por conta dessas dimensões, a região está sujeita a marés cada vez mais altas.
Como impedir que Veneza afunde?
A combinação dos fatores que envolvem a cidade italiana mobiliza as autoridades há décadas. Veneza já conta com o sistema Mose, um complexo de barreiras móveis projetado para isolar a lagoa do mar e proteger o centro histórico de inundações mais extremas.
Desenvolvido ao longo de décadas, o sistema Mose já custou US$ 6 bilhões (quase R$ 34 bilhões, conforme cotação atual) ao governo italiano. Testadas pela primeira vez em 2020, as barreiras foram elaboradas para segurar uma quantidade baixa de inundações anualmente.
Em outubro de 2023, por exemplo, o acionamento das comportas impediu que uma inundação atingisse a cidade. Segundo a agência de notícias ANSA, a água em Veneza poderia ter aumentado entre 135 e 140 centímetros, mas as barreiras do Mose diminuíram este volume para 75 centímetros.
No entanto, com mudanças climáticas provocando de forma contínua o aumento no nível do mar, as estruturas instaladas podem não ser suficientes. De acordo com a CNN, marés maiores do que 110 centímetros já aconteceram mais de 150 vezes nas últimas duas décadas, sendo que as comportas já foram acionadas aproximadamente 100 vezes em menos de cinco anos.
Especialistas se dedicam a encontrar maneiras de contornar a situação. Pietro Teatini, professor associado de hidrologia e engenharia hidráulica na Universidade de Pádua, na Itália, é um deles. Em entrevista à CNN, Teatini explicou a possibilidade de bombear água para o subsolo profundo de Veneza. Segundo ele, o volume de água elevaria o solo abaixo da cidade.
O plano de Teatini indica que a água deve ser injetada em locais estratégicos. Para isso, o líquido seria direcionado a aquíferos específicos.
Segundo o Instituto Água e Terra, vinculado ao governo do Paraná, os aquíferos são formações geológicas em que a água pode ser armazenada e que tenha permeabilidade suficiente para permitir seu escoamento. No projeto de Teatini, os aquíferos localizados entre 600 e mil metros de profundidade e cuja água é salina seriam os alvos do bombeamento.
Para bombear a água, o projeto sugere a perfuração de cerca de 12 poços. Essas estruturas seriam instaladas ao redor de Veneza, em um círculo de 10 quilômetros de diâmetro. Os poços ficariam dentro da lagoa e não ultrapassariam os limites desta com o mar ou com o continente. A espessa camada de argila que descansa sob a lagoa impediria que a água injetada no subsolo da cidade volte à superfície.
Veneza afundou entre os anos 1950 e 1970 por conta da extração de água em Marghera. Então pensamos: por que não fazer o contrário? Criar poços para injetar água em vez de retirá-la Pietro Teatini, professor da Universidade de Pádua, à CNN
Como parte de um projeto-piloto, o especialista explica que o primeiro poço teria 20 centímetros de diâmetro. A estrutura seria colocada a um quilômetro de profundidade, onde um filtro e uma bomba seriam instalados para injetar a água até este nível, onde o líquido se infiltraria naturalmente no solo do aquífero, fazendo com o que o solo ao redor começasse a se elevar. Testes menores na lagoa devem legar, segundo o professor, de dois a três anos.
Caso o bombeamento de água seja interrompido, o solo volta a ceder. Teatini avalia a possibilidade de misturar aditivos à água, para que estes produtos mantenham o solo expandido. "Se houver rachaduras, é um desastre. A ideia é manter uma pressão baixa, com aditivos que expandem o solo sem rompê-lo", afirmou à emissora.
A sugestão de Teatini renderia entre 20 e 30 anos para Veneza, que deve ter boa parte de seu território submerso até 2150. O italiano indica que o método pode elevar a cidade em até 30 centímetros, e deve funcionar em conjunto com o sistema Mose.
"Podemos dizer que temos pela frente 50 anos —considerando também a vida útil do Mose — para desenvolver uma nova estratégia. Precisamos de um projeto muito mais ousado", declarou à CNN.