Entre toga e grife: como ministros do STF usam a moda para comunicar poder

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No pescoço, gravata da Hermès. No pulso, relógios avaliados em até R$ 400 mil da Patek Phillipe. Esses foram alguns dos acessórios já utilizados por Alexandre de Moraes, que rapidamente viraram pautas e conteúdos virais nas redes sociais.
Para alguns, é "surpreendente" o luxo ostentado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal - geralmente visto, assim como os colegas de trabalho, coberto pela toga - roupa predominantemente preta, solene e discreta que carrega uma tradição que atravessa séculos. Essa indumentária clássica, no entanto, é bem mais complexa do que parece.
Moda-toga
Embora popularmente chamadas apenas de túnicas, as vestes dos ministros e ministras do STF são compostas por quatro peças: veste talar, cinto, capa e capelo, explica o Museu do Supremo Tribunal Federal.
O capelo, uma espécie de chapéu octogonal, caiu em desuso, mas o conjunto restante resiste como uma insígnia visual da instituição.
A fins de curiosidade, a palavra "toga" vem do latim talus, como referência aos tornozelos. Um lembrete da longa extensão do tecido que praticamente roça o chão.
"O uso das togas pelo Supremo Tribunal Federal está previsto nos seus regimentos internos, desde o de 1909 e o de 1940, em que eram exigidas a beca, a capa e o barrete para as sessões", contextualiza o Museu. Hoje, a norma flexibilizou: "A veste talar é obrigatória apenas nas sessões solenes. Nas sessões ordinárias, a utilização da capa é suficiente."
Nas posses e nas sessões que marcam os momentos de virada da história, a toga completa volta a ocupar o centro do palco - ou melhor dizendo, a Praça dos Três Poderes. Ali, ela cumpre sua função estética e simbólica: uniformizar os corpos, dissipar os estilos pessoais e reforçar a ideia de uma instituição que sobrevive ao tempo.
No acervo do Museu Ministro Sepúlveda Pertence, a moda do poder está registrada em peças que narram capítulos distintos da Corte. "Temos, por exemplo, a toga do ministro Carlos Thompson Flores, confeccionada pela tradicional Casa Sucena, do Rio de Janeiro", informa o Museu. "E também a toga utilizada pelo ministro Francisco Rezek na Corte Internacional de Justiça de Haia, que guarda uma conexão entre o Supremo e as práticas internacionais."
A coleção ainda preserva a toga da ministra Ellen Gracie, símbolo da chegada das mulheres à presidência da Corte.
Se a imagem do magistrado togado é um ritual quase universal em democracias constitucionais, no Brasil ela adquire contornos próprios.
A indumentária do STF se assemelha às vestimentas utilizadas em Cortes Constitucionais estrangeiras, mas apresenta características próprias, complementa o Museu.
O STF é fashion

Recentemente, Luís Roberto Barroso, do STF, anunciou a encomenda de gravatas e lenços personalizados para que, segundo ele, fossem utilizados para retribuir presentes de visitantes do Supremo.
Com "toque de seda" e composição 100% poliéster, os acessórios trazem a fachada da sede e a logomarca do tribunal como algumas das estampas, em cores, majoritariamente, azul e branca. O gasto para os itens, segundo reportagem publicada em fevereiro deste ano pelo UOL, foi de R$ 38,4 mil.
A razão real para isso é que nós recebemos muitas visitas ou visitamos lugares onde as pessoas nos dão presentes e, portanto, foi uma forma que nós encontramos gentil de retribuir com uma gravata que tem o símbolo do Supremo Tribunal Federal. Modéstia à parte, ficou muito bonitinha, afirmou o ministro.
Os registros fashion do STF têm ainda outros desdobramentos. Durante o julgamento da denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), no final do mês de março, Alexandre de Moraes viralizou por usar uma gravata da Hermès no modelo Lapindragon Tie.
Disponível por R$ 1,5 mil no site oficial da requintada grife francesa, conhecida pela produção das seletas bolsas Birkin, o acessório chamou a atenção - e gerou discussões sobre seu significado - por possuir em sua estampa a imagem de um coelho fugindo de um dragão que cospe fogo.

E essa não foi a primeira vez que Moraes se destacou por estar grifado. Há quatro meses, uma foto do ministro utilizando um relógio de luxo, da Patek Philippe, ganhou repercussão.
O modelo 5711G, de ouro branco e com pulseira de couro de crocodilo, deu o que falar por custar, atualmente, cerca de R$ 400 mil. Com fabricação descontinuada em 2011, época em que era comercializado por R$ 170 mil, hoje é possível comprá-lo apenas por meio de revendedores.
Vale destacar ainda que, além da marca suíça citada anteriormente, itens da Rolex e da Omega já apareceram nos pulsos de Alexandre.

Além do luxo e ostentação, a moda no Supremo também marcou rupturas. Em 2007, Carmen Lúcia "quebrou a tradição" e apareceu de calças em uma sessão plenária.

A peça, proibida para mulheres no STF até 2000, já carregava, desde quase um século antes, a marca da liberdade feminina — um símbolo consagrado por Coco Chanel. "A moda é sempre um reflexo da época, mas se a época for estúpida, esqueçam-na", disse uma vez a estilista. Carmen, ao que tudo indica, seguiu o conselho.
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