Topo

Carne, pimenta e chocolate num prato só: conheça o potente mole poblano

Mole poblano: tão valorizado no México quanto a feijoada no Brasil - Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto
Mole poblano: tão valorizado no México quanto a feijoada no Brasil Imagem: Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto

Gabrielli Menezes

De Nossa

22/03/2022 04h00

Chocolate com pimenta não é só nome de novela. E chocolate com carne não é só atração do reality MasterChef. No México, esses três ingredientes dão origem a um prato carregado de história e com repercussão internacional, o mole poblano.

Típica de Puebla, estado no centro-sul do país, a receita que utiliza conhecimentos ancestrais astecas ganhou popularidade há cerca de 300 anos. Desde então, ela é tida como um símbolo de miscigenação cultural por associar ingredientes nativos e europeus.

O peruano David Lechtig, que cresceu na Guatemala e comanda o restaurante mexicano El Paso em Brasília desde 1995, resume:

O mole poblano é um representante oficial mexicano, como se fosse a feijoada para o Brasil".

Carne em molho escuro: frango, peru ou porco são comuns - Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto - Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto
Carne em molho escuro: frango, peru ou porco são comuns
Imagem: Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto

O prato, geralmente servido em comemorações pelo grau de dificuldade, consiste em pedaços de carne servidos sob um molho denso e escuro.

Pode ser feito com frango ou porco, mas o mais tradicional é de peru. "O animal foi introduzido pelos espanhóis e era consumido apenas pela elite". Seja qual for a carne, ela é cozida à parte e finalizada no molho, que é a grande estrela da refeição.

Mole: identidade e trabalheira

Mole Poblano - Juanmonino/Getty Images/iStockphoto - Juanmonino/Getty Images/iStockphoto
Até hoje, receita leva 15 ingredientes ou mais
Imagem: Juanmonino/Getty Images/iStockphoto

A lista de ingredientes do preparo muda de acordo com a tradição de cada família. "No início, a receita contava com mais de 100 itens. Hoje, o número fica entre 15 e 20", conta David.

Em comum está a presença de chocolate (sempre amargo), de pimentas secas, defumadas ou in natura (chipotle, malagueta, pasilla, etc), de frutas (tomate, banana, uva passa), de especiarias (canela, cravo, anis) e de sementes ou castanhas (gergelim, abóbora, amendoim, amêndoa), além de alho, cebola, tortilla e pão — os dois últimos entram na mistura como espessantes.

Para dar conta de extrair o melhor sabor possível, o preparo é trabalhoso. "Inicialmente era feito no pilão, amassando tudo em pedra aquecida". Hoje, tacho de ferro e liquidificador ajudam a tornar o processo um pouco mais simples.

A ideia é tostar e triturar cada ingrediente um a um para intensificar o gosto. Alguns vão direto na panela e outros precisam de banha de porco. Ainda pensando na concentração de sabor, o líquido reduz em fogo baixo junto da água do cozimento da proteína.

Mole Poblano - Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto - Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto
Pasta é trabalhosa de fazer, mas pode ser comprada quase pronta
Imagem: Marcos Elihu Castillo Ramirez/Getty Images/iStockphoto

A carne escolhida (frango, peru ou porco) costuma ser mergulhada no molho vinte minutinhos antes de ir ao prato coberto por gergelim e ao lado de arroz e tortillas. O mexicano Eduardo Ortiz, chef do restaurante paulistano Metzi, diz:

O sabor é levemente adocicado, picante e tem forte presença de especiarias", diz.

Para encurtar o caminho da receita, mercados e feiras pelo México vendem moles prontos. Com eles, os cozinheiros amadores e profissionais só precisam diluir a pasta no caldo de carne.

As lendas sobre a origem

Mole Poblano - Maogg/Getty Images - Maogg/Getty Images
Mole Poblano servido com arroz e tortillas
Imagem: Maogg/Getty Images

A discussão sobre a origem do mole poblano é a mesma de outras especialidades tradicionais: muita suposição e nenhuma certeza.

A história mais contada é a de que teria nascido quando um arcebispo espanhol foi visitar um convento em Puebla. Empenhadas em impressionar, as freiras cozinharam o peru com o molho que reunia ingredientes da colônia e da metrópole.

Outra lenda diz que o chocolate e as especiarias foram misturados ao prato por acidente. Criado propositalmente ou não, o molho teria agradado ao superior e ganhado fama pelo país.

Frida Kahlo era fã

Cozinha de Frida na casa azul: tachos de ferro para mole poblano - Divulgação - Divulgação
Cozinha de Frida na casa azul: tachos de ferro para mole poblano
Imagem: Divulgação

Uma das pessoas que difundiu a receita do mole poblano ao longo da história foi Frida Kahlo (1907-1954). A artista mexicana mais famosa do mundo recebia amigos para jantar em sua casa e servia o prato típico.

Os utensílios do mole foram parar nas paredes do Museo Frida Kahlo, na Cidade do México, onde a pintora nasceu, cresceu, morou com o artista e marido Diego Rivera e morreu. Também conhecido como Casa Azul, o lugar celebra a vida obra da pintora por meio de objetos, fotografias e itens pessoais.

O passo a passo da receita foi publicado no livro Frida's Fiestas, publicado em 1994, e pode ser conferido no site no museu.