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ANÁLISE

Em nome do pai, filho e da casa Gucci: grife transforma tragédia em fortuna

Com coleções voltadas ao glamour Hollywoodiano apresentadas no mesmo ano do lançamento de "Casa Gucci", marca que completa 100 anos em 2021 caminha para fechar o ano como a "marca mais quente do mundo" e superar a Balenciaga - Reprodução
Com coleções voltadas ao glamour Hollywoodiano apresentadas no mesmo ano do lançamento de "Casa Gucci", marca que completa 100 anos em 2021 caminha para fechar o ano como a "marca mais quente do mundo" e superar a Balenciaga
Imagem: Reprodução

De Nossa

17/12/2021 04h00

O filme "Casa Gucci" certamente era um dos mais esperados para 2021. Com a cantora Lady Gaga dando vida à viúva Patrizia Reggiani, acusada de comandar o assassinato do marido, Maurizio Gucci, a produção acabou por ser um grande triunfo da grife italiana para conquistar o topo da indústria de moda como uma das labels mais influentes atualmente. Na mais recente avaliação, a marca fica atrás apenas da Balenciaga. O que não deve durar muito tempo.

Antes de qualquer coisa, é importante ressaltar que, embora a Gucci seja a guia de toda a trama, a empresa em si não tem qualquer envolvimento com o filme. Os herdeiros, inclusive, ameaçam processar Ridley Scott, diretor da produção, "para proteger seu nome e imagem, assim como os de seus familiares", como reportado pela agência de notícias italiana ANSA.

Toda a polêmica, no entanto, parece ser bem orquestrada. Isso porque a produção hollywoodiana tem a presença de Salma Hayek, esposa de François-Henri Pinault, presidente da Kering, dona da Gucci, e Jared Leto, embaixador do marca e amigo pessoal do diretor criativo Alessandro Michele. Estranhamente, a comparência de ambos aparentemente não foi um problema.

Salma Heyek e o marido, o presidente e CEO da Kering François-Henri Pinault - Getty Images - Getty Images
Salma Hayek e o marido, o presidente e CEO da Kering François-Henri Pinault
Imagem: Getty Images
Alessandro Michele, diretor criativo da Gucci, e o ator Jared Leto - Getty Images - Getty Images
Alessandro Michele, diretor criativo da Gucci, e o ator Jared Leto
Imagem: Getty Images

Além disso, a tragédia retratada promete render bons frutos para a marca. Sendo esses "bons frutos", melhor dizendo, dinheiro. De acordo com o "The Guardian", na primeira semana de lançamento, as buscas por peças da Gucci na internet aumentaram em 73%.

No Brasil, a semana de lançamento também aqueceu as buscas pelo nome da etiqueta, como é possível ver no gráfico abaixo, disponibilizado pelo Google Trends:

Essa alta em pesquisas segue outro ponto que destacou a Gucci no terceiro trimestre de 2021 — e a fez conquistar o segundo lugar entre "as marcas mais quentes do momento": o aumento de 86% na receita financeira da marca.

Tal sucesso econômico se deu em consequência de dois eventos: o primeiro deles, a abertura de uma loja digital com base no passado, presente e futuro da casa; e o segundo o lançamento do trailer de "Casa Gucci".

Mais uma vez, a narrativa da empresa, mesmo que não endosse o filme, se aproveita bem de sua repercussão.

Os atores protagonistas do filme Salma Hayek, Jared Leto, Adam Driver e Lady Gaga na premiére de "Casa Gucci" - Getty Images - Getty Images
Os atores protagonistas do filme Salma Hayek, Jared Leto, Adam Driver e Lady Gaga na premiére de "Casa Gucci"
Imagem: Getty Images

Balenciaga e glamour de Hollywood
100 anos da Gucci

Essas teorias podem ser reforçadas com o lançamento das duas principais coleções para comemorar os seus 100 anos de vida, festejados neste ano.

A primeira delas, em abril, foi uma não-colaboração com a Balenciaga. A coleção, nomeada Aria e assinada pelo diretor criativo Alessandro Michele, "roubou" elementos e silhuetas da casa de moda espanhola. Tudo com a permissão de Demna Gvsalia, que a comanda atualmente.

"Roubei o rigor não-conformista de Demna Gvasalia e a tensão sexual de Tom Ford", disse Alessandro Michele em suas redes sociais, mencionando Ford, retratado no filme "Casa Gucci" e responsável por transformar e reviver a estética da grife nos anos 1990.

Me dediquei às implicações antropológicas daquilo que brilha, trabalhando com o brilho dos tecidos. Celebrei o universo equestre da Gucci, transfigurando ele em uma cosmogonia fetichista. Sublimei a silhueta de Marilyn Monroe e o antigo glamour de Hollywood. Por fim, sabotei o charme discreto da burguesia e os códigos da alfaiataria masculina."
Alessandro Michele

Gucci | Aria - Divulgação - Divulgação
Gucci | Aria
Imagem: Divulgação
Gucci | Aria - Divulgação - Divulgação
Gucci | Aria
Imagem: Divulgação

Mais recentemente, em novembro, Gucci apresentou a coleção intitulada "Gucci Love Parade", em um desfile de moda realizado no icônico Hollywood Boulevard de Los Angeles. Tudo da forma mais conveniente possível.

Com a presença de famosos, com destaque para um inesperado aparecimento de um Macaulay Culkin fashionista, como nunca havíamos visto antes, estavam presentes também artistas como Jodie Turner-Smith, St. Vincent e Phoebe Bridgers.

Macaulay Culkin no desfile da coleção "Love Parade" da Gucci, em comemoração aos seus 100 anos - Divulgação - Divulgação
Macaulay Culkin no desfile da coleção "Love Parade" da Gucci, em comemoração aos seus 100 anos
Imagem: Divulgação

A primeira fila, por sua vez, reservava assentos para Gwyneth Paltrow, Serena Williams, Salma Hayek, Lizzo, Miley Cyrus, entre outros.

O glamour tomava conta do local para "celebrar o grande prazer de estar vivo", sendo esse o primeiro desfile presencial da Gucci desde o início da pandemia do coronavírus.

"Não apenas um desfile de moda, mas um 'desfile' no Hollywood Boulevard", afirmou Alessandro Michele ao apresentar vestidos de penas, tiaras de diamantes e sapatos plataformas brilhantes e os modelos foram representados como "deuses pagãos do cinema".

Quando comecei a pensar sobre como gostaria de comemorar esse novo capítulo em meu trabalho cheio de aventuras, pensei em minha mãe e seu precioso legado. Pensei na adoração da beleza com que ela me alimentava. Sobre o dom irrevogável do sonho e a aura mitopoética do cinema. É por isso que escolhi a Hollywood Boulevard."
Alessandro Michele

Peças apresentadas na Gucci Love Parade, voltadas para a Primavera 2022 - Divulgação - Divulgação
Peças apresentadas na Gucci Love Parade, voltadas para a Primavera 2022
Imagem: Divulgação

Com tudo isso relembrado, é quase impossível desassociar que, de alguma forma, existe uma estratégia por trás das coleções voltadas ao ar hollywoodiano. Pertinentemente, lançadas no mesmo ano do polêmico "Casa Gucci".

Se tudo foi pensado de forma engenhosa para faturar, talvez em um futuro não-tão próximo saberemos. Enquanto isso, é pertinente afirmar que a Gucci provavelmente deve encerrar 2021 com chave (e medalha) de ouro, enquanto se aventura em mostrar como a moda da casa italiana está disposta a enxergar o futuro pós-pandemia: seguramente mais glamouroso.