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Por que bolsos de calças jeans femininas são menores do que os masculinos?

Acontecimentos históricos ao longo das décadas transformaram a importância dos bolsos femininos nas calças das mulheres  - Getty Images/iStockphoto
Acontecimentos históricos ao longo das décadas transformaram a importância dos bolsos femininos nas calças das mulheres Imagem: Getty Images/iStockphoto

Gustavo Frank

De Nossa

22/10/2021 04h00

Pode parecer uma mera impressão, mas os bolsos das calças das mulheres, de fato, são menores do que os dos homens. Uma pesquisa realizada pelo The Pudding mostrou que, em média, os bolsos dos jeans femininos são 48% menores e 6,5% mais estreitos do que os dos jeans masculinos.

Para chegar aos resultados finais, os pesquisadores analisaram o tamanho de 80 jeans de 20 grandes marcas da moda, incluindo grandes nomes do mercado, tais como Calvin Klein, H&M, Levi's, Wrangler e Ralph Lauren.

O estudo foi ainda além, mostrando que apenas 10% dos jeans femininos estudados teriam espaço o bastante para acomodar uma mão feminina dentro. Já os pares de jeans masculinos suportam facilmente uma mão masculina ou feminina no bolso.

Ou seja, em um breve resumo: os bolsos das calças para as mulheres, ao contrário do esperado, são pouco úteis e muitas vezes exclusivamente estéticos.

A origem do bolsinho

A história por trás desses espaços de armazenamento (mínimos) nos trajes é antiga. No início do século 17, a lógica era inversa. Isso porque, durante esse período, as mulheres usavam bolsos em um cinto em volta da cintura, geralmente por baixo das saias, acessando-os por meio de camadas do vestido. Uma espécie de pochete "escondida", como contou Ariane Fennetaux, coautora do livro "The Pocket: A Hidden History of Women's Lives, 1660-1900", ao "Outside".

Essa mudança para o bolso quase no estado zero começou a acontecer no final do século 17, quando as peças de vestuário começaram a se moldar mais ao corpo das mulheres. Consequentemente, repercutindo em uma questão errônea de dependência da mulher ao homem.

Como noticia a "BBC", houve uma época em que uma mulher dependia do marido para carregar dinheiro e outras necessidades, então os bolsos não eram considerados necessários. O que todos sabemos, claramente, não ser uma verdade. Ainda mais em tempos atuais.

No "The New York Times", um artigo publicado em 1899 tratava do assunto da seguinte forma: "Na medida que ficamos mais civilizados, precisamos de mais bolsos [...]. Ninguém que não usa bolsos se tornou importante depois que eles foram inventados, e o sexo feminino não será páreo para nós [os homens] enquanto usar roupas sem bolsos".

A praticidade e a estética

Os bolsos femininos passaram por altos e baixos durante a história, em consequência de acontecimentos históricos, como as Guerras Mundiais.

Na Primeira Guerra Mundial, os bolsos começaram a se tornar mais presentes no vestuário feminino — em consequência da presença das mulheres em fábricas, uma vez que os homens estavam batalhando. O bolso passa então a sinalizar uma "emancipação", como se simbolizasse o fato de que, agora, elas ganham o seu próprio dinheiro.

"As roupas femininas tornaram-se mais práticas e funcionais, em decorrência da escassez de tecidos e também da entrada das mulheres no mercado de trabalho", diz Maíra Zimmermann, historiadora de moda e professora da FAAP, em entrevista para Nossa.

A historiadora conta ainda que as Guerras tiveram grande impacto na moda do dia a dia — vestidos cotidianos e conjuntos utilitários muitas vezes tinham bolsos. E na alta-costura não foi diferente.

Em 1939, a estilista Elsa Schiaparelli criou um conjunto com bolsos externos grandes, na intenção de facilitar a eventual necessidade de deslocamento para abrigos subterrâneos em noites de bombardeio.

Conjunto criado por Elsa Schiaparelli com grandes bolsos - Reprodução - Reprodução
Conjunto criado por Elsa Schiaparelli com grandes bolsos
Imagem: Reprodução

No entanto, é no final dos anos 1940 para os 1950 que a história sofreria uma reviravolta. A proposta de Christian Dior para a sua primeira coleção, a "New Look" (1947), é o retorno ao glamour e à feminilidade exuberante. Onde os bolsos grandes não teriam vez.

"As roupas voltaram a ter cinturas marcadas, saias rodadas e saltos altos, em uma clara reafirmação do binarismo de gênero", diz Maíra, ao reforçar o argumento de que a praticidade deixava de ser uma prioridade, para dar lugar a estética nos looks femininos.

Em 1954, Christian Dior teria dito que os "homens têm bolsos para guardar as coisas, enquanto as mulheres, para decoração". O que pode explicar a existência dos inúmeros "bolsos falsos" que as roupas ainda possuem hoje em dia.

"New Look", de Christian Dior - Reprodução - Reprodução
"New Look", de Christian Dior
Imagem: Reprodução

Os grandes nomes da moda passariam, a partir daí, a priorizar a silhueta do corpo em vez da necessidade de ter um compartimento para guardar objetos do cotidiano. Para resolver esse "problema", os acessórios externos, como as bolsas, seriam uma aposta para suprir essa lacuna e criar um novo mercado de consumo.

Por que isso ainda acontece atualmente? Ao "The Atlantic", Sara Kozlowski, do Conselho de Estilistas de Moda da América, culpa as marcas de fast fashion por perpetuar a ausência da praticidade nas roupas femininas: "Essas etiquetas fazem cópias de designs sofisticados que não estão adaptados à vida de uma pessoa normal".

Afinal, nas passarelas, ninguém precisa carregar o celular, a carteira e as chaves de casa.