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Muito além do hummus: o renascer da gastronomia palestina

Hummus, falafel, vegetais crus, feijão-fava com grão-de-bico servidos nos restaurantes tradicionais de Jerusalém - AHMAD GHARABLI/AFP
Hummus, falafel, vegetais crus, feijão-fava com grão-de-bico servidos nos restaurantes tradicionais de Jerusalém Imagem: AHMAD GHARABLI/AFP

da AFP

04/08/2022 14h29

Das ruelas milenares da Cidade Velha de Jerusalém às cozinhas luxuosas no exterior, um vento de renovação sopra sobre a gastronomia palestina que, sem se afastar de suas tradições ancestrais, começa a colher grande sucesso.

O aroma do pão assado no tradicional forno de terracota sai pela porta da frente do "Taboon", acariciando as narinas dos clientes que se aglomeram neste bistrô no bairro cristão da Cidade Antiga de Jerusalém.

No cardápio há focaccias italianas mas, sobretudo, pratos locais: berinjelas cobertas generosamente com tahine (creme de gergelim) e romã, manushe com zaatar (pão achatado semelhante à pizza temperado com o tradicional tempero à base de gergelim e tomilho) ou lahmayun, uma pizza armênia com carne picada.

Todos os pratos típicos e populares locais são vendidos como pão quente, destaca o proprietário do estabelecimento, Nassar Odeh, entrevistado pela AFP em julho. A cena gastronômica local está "mudando para melhor", acredita Odeh.

"Muitos palestinos estão ansiosos para promover sua culinária", muito diferente dos restaurantes da Cidade Antiga que geralmente se especializam em apenas um tipo de prato, como falafel ou shawarma.

Nassar Odeh, proprietário do restaurante e bar de vinhos Taboon, com a versão vegana do "lahmajun" (pão achatado geralmente servido com carne) - AHMAD GHARABLI/AFP - AHMAD GHARABLI/AFP
Nassar Odeh, proprietário do restaurante e bar de vinhos Taboon, com a versão vegana do "lahmajun" (pão achatado geralmente servido com carne)
Imagem: AHMAD GHARABLI/AFP

Ao abrir o "Taboon" no ano passado, no que era a loja de souvenirs da família, Odeh pretendia divulgar os produtos palestinos.

"É extremamente importante porque enfatiza a presença e o empreendedorismo palestinos. Devemos nos orgulhar de nossos produtos", diz. Vinhos e cervejas da Cisjordânia ocupada também são oferecidos neste restaurante e bar com decoração moderna e pedra exposta.

Tomates de Gaza

Para Dalia Dahdoub, gerente do "Taboon" e proprietária de outros bares em Belém e Jericó, trata-se também de cozinhar "produtos que as pessoas não conhecem" do pomar palestino.

Assim, seu cardápio será enriquecido em breve com berinjelas de Battir, perto de Belém, Patrimônio Mundial da UNESCO, e tomates de Gaza, enclave sob bloqueio israelense de onde apenas alguns produtos agrícolas estão autorizados a sair.

"Quando eles vêm de Gaza, são muito vermelhos e têm um sabor melhor", garante Dabdoub.

O guia Izzeldin Bukhari (no centro) conduz turistas em roteiros gastronômicos por Jerusalém, além de aulas de culinária local - AHMAD GHARABLI/AFP - AHMAD GHARABLI/AFP
O guia Izzeldin Bukhari (no centro) conduz turistas em roteiros gastronômicos por Jerusalém, além de aulas de culinária local
Imagem: AHMAD GHARABLI/AFP

Os estabelecimentos palestinos se espalharam recentemente, tanto na Cidade Antiga quanto no distrito palestino de Sheikh Jarrah, no setor leste ocupado e anexado por Israel, e até mesmo em Ramallah, na Cisjordânia.

"É um ótimo começo, estamos apenas no início", entusiasma-se Izzeldin Bukhari, que organiza aulas de culinária e passeios pela gastronomia local.

"Todo mundo estava fazendo mais ou menos a mesma coisa, mas ultimamente tenho visto pessoas lançando novas ideias", comentou à AFP.

"Falastin"

Renomado chef palestino que vive em Londres há mais de 20 anos, Sami Tamimi lembra que "há 10 anos, se você fosse a uma editora para publicar um livro de gastronomia palestina, eles diriam 'mas quem vai comprá-lo?'". Hoje, existem dezenas de livros.

Em 2020 ele assinou com Tara Wigley "Falastin" (palestino em árabe), inspirado em suas memórias culinárias, ele que é imbatível ao enaltecer o requinte das folhas de videira e da couve-flor frita no pão, seu lanche preferido quando era estudante.

Em Londres ele tem vários restaurantes chiques com seu parceiro de negócios, o chef israelense Yotam Ottolenghi.

Pratos de hummus, feijão-fava e falafel servidos a clientes na Cidade Velha de Jerusalém - AHMAD GHARABLI/AFP - AHMAD GHARABLI/AFP
Pratos de hummus, feijão-fava e falafel servidos a clientes na Cidade Velha de Jerusalém
Imagem: AHMAD GHARABLI/AFP

Os israelenses têm mais sucesso na promoção da culinária local, acredita Bukhari. "Estamos deixando um espaço para os israelenses falarem sobre nossa comida", lamenta.

Então, "quanto mais falamos sobre nossa cultura e nossa comida, mais preenchemos essa lacuna", diz.

E o movimento já começou: o chef Fadi Kattan, de Belém, vai abrir um restaurante em Londres este ano, enquanto Tamimi vai trabalhar por duas semanas em outubro no prestigiado hotel American Colony em Jerusalém.

Este é o segundo evento do tipo, depois de uma primeira experiência em que o chef observou o quanto mudou o panorama gastronômico da cidade. "Foi a primeira vez que trabalhei com uma equipe totalmente palestina", explicou.