Histórias do Mar

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Reportagem

26 anos depois, identidade de barco histórico afundado é confirmada

Em 1999, ao cabo de anos de buscas no fundo do mar do porto de Newport, no estado americano de Rhode Island, pesquisadores australianos levantaram suspeitas de que os restos de um antigo casco ali encontrado poderiam ter pertencido ao famoso barco Endeavour, do lendário capitão James Cook, considerado um dos maiores navegadores da história e primeiro europeu a chegar à Austrália, Nova Zelândia e outras tantas ilhas do Pacífico, no final do século 18.

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Imagem: Reprodução

E começaram a analisar aqueles escombros, em parceria com pesquisadores americanos do Projeto de Arqueologia Marinha de Rhode Island.

Mais de 20 anos

A análise de restos de madeira carcomidos pelo tempo e fragmentos de objetos levou mais de 20 anos, porque era preciso compará-los rigorosamente com materiais e formatos da época, um trabalho tão exaustivo quanto lento.

Até que, três anos atrás, em 2022, arqueólogos do Museu Marítimo Nacional Australiano vieram a público informar o que há muito já era esperado: que aqueles escombros eram, de fato, da icônica embarcação do Capitão Cook, usada por ele para explorar o Oceano Pacífico entre 1769 e 1771, e acrescentar lugares como Austrália, Nova Zelândia e ilhas do Taiti aos mapas da época.

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Imagem: Georgios Kollidas - stock.adobe.com

Mas a euforia durou pouco.

"Confirmação precipitada"

Tão logo os australianos fizeram aquele comunicado, seus colegas americanos do Projeto de Arqueologia Marinha de Rhode Island rebateram, informando que "apesar das muitas evidências" ainda não podiam garantir de que se tratava realmente do Endeavour, e que consideravam aquele comunicado "precipitado", embora as análises tivessem durante mais de duas décadas.

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Imagem: Reprodução

Mais três anos

Embora parecesse um típico caso de ciumeira, mais do que rigor científico - já que tinham sido os australianos que divulgaram a tão esperada notícia -, foi preciso esperar mais três anos até que os pesquisadores americanos concordassem com seus colegas australianos e admitissem que aqueles escombros encontrados no fundo do porto de Newport eram, de fato, do lendário barco do Capitão Cook, o que só foi feito dias atrás - mais de um quarto de século após a sua descoberta.

"Com base na abordagem acordada, critérios suficientes foram atendidos pelo Museu Marítimo Nacional Australiano para a identificação positiva do antigo barco do capitão James Cook", informaram os australianos em um novo comunicado dias atrás, desta vez, finalmente, com o aval dos americanos.

Foi o fim de uma novela que se arrastou por 26 anos.

Como a caravela de Cabral

Agora, já se sabe oficialmente - e pela pegunda vez - o paradeiro final da lendária embarcacão do maior explorador marítimo do século 18, um barco que, para os australianos, tem o mesmo significado histórico da caravela de Pedro Álvares Cabral para os brasileiros.

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Tanto que uma réplica fiel do Endeavour é a principal atração do Museu Nacional da Marinha da Austrália, no porto de Sydney, que também pode ser visitado, de forma virtual e interativa, mas com impressionante detalhismo, clicando aqui.

Já tinha outro nome

O curioso é que quando o Endeavour afundou, em 1778, ele já era tecnicamente outro barco.

Após retornar da viagem de Cook, ele foi vendido pela coroa inglesa para proprietários privados radicados no que viria a ser os Estados Unidos, e rebatizado Lord Sandwich.

Lá, ele foi usado como barco prisão durante a guerra pela independência dos Estados Unidos, e, a despeito da sua relevância histórica, foi propositalmente afundado na entrada do porto de Newport, para servir de barreira contra os barcos das forças americanas, que lutavam pela independência da ex-colônia.

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Só 15% dele

Atualmente, segundo os arqueólogos, restam apenas 15% do barco original, já que o Endeavour está no fundo do mar há quase 250 anos.

Seus escombros estão espalhados por uma área de 18 metros de comprimento por 7 metros de largura, no fundo da baía do porto, e consistem apenas em pilhas de pedras que no passado eram usadas como lastro nos barcos, quatro canhões de ferro e pedaços de madeira da estrutura do casco - as mesmas que serviram para comprovar a autenticidade da embarcação, através de comparações com o material usado na Inglaterra do século 18 para construir a nau do famoso capitão.

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Barco emblemático

O Endeavour foi um barco tão emblemático para a história da navegação mundial que seu nome foi usado para batizar o último ônibus espacial americano, e sua estampa ilustra até hoje uma das moedas da Nova Zelândia.

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Daí a felicidade dos arqueólogos do museu australiano que conduziu a investigação em poder afirmar oficialmente - e finalmente - a identidade daquele barco, que não fosse a renitência dos americanos, talvez não precisasse ter levado mais de um quarto de século para ser anunciada.

Caso semelhante no Brasil

Guardadas as proporções, foi mais ou menos o mesmo que aconteceu também no Brasil este ano, envolvendo outra embarcação que fez parte da história recente do nosso país: o navio auxiliar da Marinha Brasileira Vital de Oliveira, único navio militar brasileiro afundado durante a Segunda Guerra Mundial, quando navegava na costa do Rio de Janeiro e foi torpedeado por um submarino alemão, em julho de 1944.

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Embora encontrado por pescadores no fundo do mar do Cabo São Tomé, na divisa entre o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, em 2011, aquele navio levou 14 anos para ser oficialmente reconhecido pela Marinha do Brasil como sendo o Vital de Oliveira, o que também só aconteceu recentemente.

Mas por outro motivo: a falta de recursos técnicos para autenticar a identidade daquele achado.

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Só quando um navio de pesquisa equipado com modernos sensores e radares (curiosamente, também chamado Vital de Oliveira, já que ele sucedeu o navio sinistrado) foi enviado ao local, em janeiro deste ano, é que a Marinha do Brasil confirmou a identidade daquele naufrágio como sendo o do navio afundado 81 anos atrás, que custou a vida de 100 brasileiros - número que podia ter sido bem menor, não fosse um estranho fato envolvendo o barco que deveria ter dado apoio do navio atacado, nunca foi devidamente explicado, como pode ser conferido clicando aqui, ou neste vídeo recém-lançado sobre o caso.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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