Navio com 3.000 carros zero km queima há 8 dias no mar e não há como apagar
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Oito dias após começar a pegar fogo e ser abandonado no mar pelos seus 22 tripulantes - que foram resgatados e nada sofreram no incidente -, o navio transportador de automóveis Morning Midas, que ia da China para o México, segue ardendo à deriva no oceano Pacífico, a cerca de 500 quilômetros da costa do Alasca, já praticamente sem condições de ser salvo de um naufrágio dado como inevitável. E com 3 159 automóveis zero quilômetros dentro dele.
O incêndio começou na terça-feira da semana passada, quando os tripulantes do navio, que mede 180 metros de comprimento e é do tipo próprio para transportar automóveis, detectaram fumaça vindo de um dos seus deques internos onde estavam estacionados os 65 veículos elétricos e outros 681 modelos híbridos de diferentes marcas chinesas que ele transportava.
Apesar dos esforços da tripulação para extinguir o fogo e deter a propagação das chamas, não houve como debelar o incêndio e o navio foi abandonado no mar, onde segue queimando até agora, embora a maior parte dele ainda esteja intacta.
Inclusive alguns deques repletos de automóveis que ainda não queimaram.

Socorro só chegou agora
Na segunda-feira, seis dias após o início do fogo, o primeiro rebocador acionado pela Guarda Costeira Americana - e com capacidade para lançar jatos de água de encontro ao casco -, chegou ao local, mas pouco pode fazer a não ser monitorar a movimentação à deriva do navio em chamas.

Outros dois rebocadores do mesmo tipo estão previstos para chegar nos próximos dias, já que a região onde o navio se encontra é bem distante da costa.
A esperança é que os jatos de água consigam controlar o fogo, ou que ele se auto-extingua, o que, no entanto, praticamente ninguém acredita que possa acontecer.

Culpa dos carros elétricos?
Como vem se tornando cada vez mais frequente - e preocupante -, o incêndio no Morning Midas teve início no compartimento destinado aos automóveis elétricos e, ao que tudo indica, seria consequência das baterias de íons de lítio que equipam aquele tipo de veículo.
Foi o 12º caso de incêndio em navios transportadores de automóveis nos últimos 10 anos e o oitavo em apenas cinco envolvendo veículos elétricos - uma taxa incomum de incidentes, o que tem gerado extrema preocupação tanto para as empresas do setor quanto para as seguradoras marítimas, que até já cogitam não aceitar coberturas para o transporte daquele tipo de veículo.
O principal problema estaria nas baterias de íons de lítio que equipam os veículos elétricos. Elas contêm eletrólitos inflamáveis e materiais altamente reativos, que podem gerar curto circuitos se não forem corretamente desativadas durante o transporte.
Além disso, uma vez atingidas pelo fogo (de outro veículo, por exemplo), as baterias de íons de lítio chegam a atingir temperaturas superiores a 2 700 graus Celsius, agindo como um acelerador e potencializador das chamas, daí a dificuldade em controlar incêndios desse tipo em navios - mesmo os especializados no transporte de automóveis, os chamados roll-on/roll-off, nos quais os veículos são embarcados rodando, ou seja, com o motor em movimento, o que exige que as baterias sejam desconectadas após o processo.
Há suspeitas que nem sempre isso ocorra da maneira correta, gerando faíscas e curtos-circuitos mais tarde. Ou que falhas na fabricação das baterias as deixem mais vulneráveis a explosões espontâneas, como aconteceu na maioria dos casos abaixo, todos ocorridos nos últimos anos.
Fremantle Highway

Pegou fogo na costa da Holanda em 25 de julho de 2023, quando transportava 3783 automóveis japoneses. Dos seus 23 tripulantes, 16 foram resgatados por um helicóptero, sete se atiraram ao mar e um morreu. O navio conseguiu ser rebocado até a costa e o fogo debelado. Cerca de 1 000 veículos que ele transportava foram salvos, e mais tarde vendidos normalmente no mercado europeu.
Grande Costa D'Avorio

5 de julho de 2019, o navio italiano de carga mista (carros e contêineres) Grande Costa D´Avorio foi vítima de um incêndio no porto de Newark, nos Estados Unidos, quando recebia 1 200 veículos usados, nenhum deles elétricos. Mas um havia sido adulterado pelo antigo dono. O fogo durou seis dias e custou a vida de dois bombeiros.
Felicity Ace

Em 16 de fevereiro de 2022, quando navegava próximo às ilhas dos Açores, vindo da Alemanha com destino aos Estados Unidos, com cerca de 4 000 automóveis - muitos deles de alto luxo, como Porsches, Bentleys e Lamborghinis -, o Felicity Ace pegou fogo e as chamas não puderam ser contidas. Ele afundou em seguida. A suspeita foi que o incêndio tenha começado em dos poucos carros elétricos que o navio transportava.
Höegh Xiamen

O Höegh Xiamen havia acabado de receber um carregamento de 2 420 veículos usados, no porto de Jacksonville, na Flórida, no dia 4 de junho de 2020, quando surgiram labaredas no seu interior. A investigação concluiu que o incêndio foi causado pela bateria de um dos automóveis, que havia sido incorretamente desconectada para a viagem. A decisão do comandante do navio de não acionar o sistema interno de extinção de incêndio logo nos primeiros instantes, quando o fogo ainda poderia ser contido, para não danificar os demais veículos, foi decisiva para a perda total do navio e de todos os veículos que nele estavam.
Grande Europa

Em 15 de maio de 2019, outro navio da mesma empresa do Grande Costa D'Avorio, o Grande Europa, que transportava 1 687 veículos novos e usados, foi vítima de um incêndio total próximo à costa de Palma de Maiorca, na Espanha. Segundo a empresa, o fogo também começou no deque reservado aos veículos elétricos.
Grande America

A imagem de um grande navio de transporte misto (carga e veículos), o Grande America, também da mesma empresa Grimaldi, envolto em uma espessa fumaça negra no Golfo da Biscaia, entre a Espanha e a França, no início de março de 2019, correu o mundo. Até porque, dentre dele, havia 2 100 veículos novos e usados - quatro deles, as últimas unidades construídas de um modelo superesportivo da Porsche, o GT2 RS, que haviam sido vendidas para compradores brasileiros. Mais tarde, a fábrica reabriu a linha de produção para atendê-los. Aparentemente, o fogo foi causado porque parte da carga que o navio transportava era inflamável - uma combinação bombástica de automóveis elétricos e mercadorias perigosas. O Grande America ardeu por dois dias, até que por fim afundou.
Sincerity Ace

No último dia do ano de 2018, o Sincerity Ace pegou fogo no Oceano Pacífico, quando navegava do Japão para os Estados Unidos, com 3 500 veículos zero quilômetro da marca Nissan, que foram totalmente perdidos - embora o navio tenha sido salvo e rebocado de volta ao Japão. Mas o pior de tudo foi que cinco dos seus 21 tripulantes morreram no incêndio.
Um caso que fez história

Bem antes, porém, do advento dos carros híbridos e elétricos, outro navio que transportava milhares de automóveis zero quilômetro - e que também foi dado como perdido, bem como sua preciosa carga -, fez história.
Mas por outro motivo: a tentativa das pessoas de saquear os veículos que ele transportava.
Em 1988, o encalhe e perda total do navio japonês Reijin no litoral norte de Portugal transformou uma das praias da região, a da Margarida, em ponto de peregrinação dos portugueses, já que dentro do navio, tombado bem diante da praia, havia 5 000 automóveis zero quilômetros - e todos sonhavam em poder resgatar algum deles, ainda que não soubessem como.
Mas o desfecho do caso foi o pior possível, e os portugueses viram o sonho coletivo de conseguir um carro de graça morrer literalmente na praia, como pode ser conferido clicando aqui.
Aproveite para conhecer outra impressionante história envolvendo mar e automóveis clicando aqui, para assistir a um vídeo que acaba de ser lançado.
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