Histórias do Mar

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Falha mecânica? Negligência? Por que barco mexicano bateu na ponte de NY?

Quatro dias depois de o barco de treinamento da Marinha Mexicana Cuauhtémoc ter colidido com a ponte do Brooklin, em Nova York, causando a morte de dois tripulantes e ferimentos em outros 22 alunos marinheiros, as autoridades marítimas mexicanas e americanas ainda não chegaram a uma conclusão sobre o motivo do acidente. Mas trabalham com algumas hipóteses.

Uma delas — a mais óbvia — é que tenha havido um problema no sistema de propulsão do barco, que impediu o comandante da embarcação de avançar no sentido desejado.

Ao contrário disso, o veleiro passou a navegar de ré (não se sabe ainda se impulsionado pelo próprio motor ou apenas pelo vento e correnteza), logo após desatracar do porto, colidindo quatro minutos depois com a ponte, cuja altura era inferior a dos três mastros do veleiro — e em cujas travessas havia marinheiros perfilados, um tipo de saudação habitual nos barcos de treinamento ao entrar e sair de portos, razão pela qual dois deles morreram no acidente, ao despencarem dos mastros derrubados no choque com a ponte.

Pelo menos foi isso que o comandante do barco relatou rapidamente às autoridades, nos depoimentos preliminares do inquérito conduzido pelo Conselho Nacional de Segurança nos Transportes, dos Estados Unidos, que está investigando o caso, juntamente com autoridade mexicanas.

No entanto, para confirmar a tese de falha mecânica, serão necessárias inspeções mais aprofundadas no sistemas de controle e prosulsão do barco, que agora será levado para um estaleiro, para reparos — embora seus tripulantes tenham retornado ao México, de avião, no dia seguinte ao acidente.

Outra possibilidade é que tenha havido uma falha elétrica, que desabilitou os comandos do barco, tornando-o impossível de ser controlado, o que também será avaliado pela comissão de inquérito.

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Imagem: Reprodução/x.ccom/TrystanNFT

Rebocador não atuou?

Outro fator a ser analisado pela comissão será a participação - ou não - do rebocador americano Charles D. McAllister na manobra de desatracação do veleiro do porto do Pier 17, em Manhattan, onde o Cuauhtémoc ficou quatro dias exposto ao público.

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Vídeos gravados por inúmeras testemunhas do acidente, que aconteceu na noite do último sábado, durante a comemoração pela partida do barco rumo à Islândia, mostram claramente que o veleiro não estava atado ao rebocador por nenhum cabo, embora isso não faça parte do procedimento padrão nesse tipo de operação, e sim usar apenas a força do rebocador para, por meio de contatos entre os cascos, ajudar a posicionar a embarcação no rumo desejado — o que, como também mostram os vídeos, foi efetivamente tentado, mas sem resultados.

Empurrado pelo vento e pela correnteza — ou eventualmente também pelo próprio motor, no caso de uma falha no sistema de controle do barco —, o Cuauhtémoc seguiu avançando no sentido oposto ao da saída do porto, sem que o rebocador tenha conseguido detê-lo ou executado alguma manobra efetiva para corrigir o rumo do veleiro, que acabou atingindo a ponte instantes depois.

Análises dos vídeos mostram que a velocidade do veleiro no instante da colisão era de 6 nós, mas navegando de ré, quando o correto seria já estar se movimentando para frente.

O que também será analisado é se o comportamento do comandante do rebocador foi adequado, frente a uma situação de emergência como aquela.

Por que não zarpou mais cedo?

Outro aspecto a ser investigado é o motivo pelo qual o barco mexicano não saiu do porto um par de horas antes, quando o movimento da maré era vazante e corria de encontro ao mar, e não no sentido oposto, como na hora da partida do veleiro.

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Quando isso aconteceu, a correnteza contrária não chegava a ser forte (pouco mais de 1 km/h), mas o vento, que soprava no sentido igualmente oposto ao da saída do porto, beirava os 20 km/h, o que contribuiu para empurrar ainda mais o barco de encontro à ponte, sem que por algum motivo que ainda será apurado fosse possível detê-lo.

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Imagem: ANGELA WEISS / AFPTV / AFP

Três linhas de investigação

O inquérito deverá focar em três linhas de investigação: possíveis falhas mecânicas, atuação da tripulação do veleiro e ações do rebocador nas manobras de partida do porto.

Mas o mais provável é que a conclusão final seja a de que não houve um motivo para o acidente, mas sim — como geralmente acontece — a combinação de alguns deles. Ou, eventualmente, todos os três.

O resultado do inquérito está previsto para sair em cerca de 30 dias, "com total transparência e responsabilidade", como garante o comandante da Marinha Mexicana, Almirante Raymundo Pedro Morales Ángeles, que tampouco arrisca dizer o que pode ter acontecido.

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"Toda viagem de barco envolve riscos inerentes à nossa vocação marítima", por hora diz apenas o Almirante mexicano.

Acidentes inexplicáveis

A até agora incompreensível colisão do veleiro com a famosa ponte na Nova York foi mais um dos acidentes quase inexplicáveis que, vira e mexe, acontecem em águas americanas.

Dois meses atrás, um navio cargueiro bateu — e derrubou — uma ponte na saída do porto de Baltimore, sobre a qual passava uma estrada, causando a queda de diversos carros na água e a morte de seis pessoas.

Na ocasião, a conclusão foi que um problema elétrico afetou os meios de condução do cargueiro, que ficou praticamente à deriva, até colidir com a ponte — um tipo de acidente quase inadmissível nos dias de hoje, com base em toda a tecnologia já presente nos grandes navios.

No passado, porém, não era assim, o que favorecia ainda mais os acidentes no mar, inclusive os menos prováveis.

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Um dos mais absurdos acidentes marítimos já registrados na costa dos Estados Unidos aconteceu quase 70 anos atrás, em julho de 1956, quando dois navios transatlânticos — o italiano Andrea Doria e o sueco Stockholm — colidiram de frente em pleno oceano, onde o que não falta é lugar para desviar, nas proximidades da ilha de Nantucket, quando um saía e outro chegava ao porto de Nova York.

Foi um dos mais estúpidos casos de imprudência simultânea de dois comandantes, e resultou no naufrágio de um dos navios, o Andrea Doria, então o mais famoso transatlântico da Itália, como pode ser conferido clicando aqui e também em um vídeo sobre o caso que acaba de ser lançado.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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