Histórias do Mar

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Reportagem

Vitória da natureza: o curioso naufrágio que está virando ilha na Austrália

Os visitantes da pequena Baia Cockle, na turística Ilha Magnetic, na costa leste da Austrália, costumam ficar intrigados com o formato curioso de uma ilhota que existe bem diante da praia.

Mas existe um motivo para isso: não se trata de uma ilha e sim dos restos de um velho navio encalhado, que ao longo dos anos foi sendo tomado pela vegetação, até virar uma espécie de canteiro verde no meio do mar.

Ou uma ilha artificial.

Da época do Titanic

A curiosa ilha da Baia Cockle é, na verdade, o que restou do ex-transatlântico australiano City of Adelaide, um navio movido a vapor construído no final do século 19, que durante muitos anos fez viagens regulares entre a Austrália e a Inglaterra, levando e trazendo passageiros.

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Imagem: Wikipedia

Até que um incêndio, em 1912 (mesmo ano da tragédia do Titanic), decretou o seu fim - felizmente sem nenhuma vítima, ao contrário do seu tristemente famoso transatlântico contemporâneo.

Só restou o casco

Quando isso aconteceu, o City of Adelaide já havia sido transformado em mero deposito flutuante de carvão, depois de ter sido adaptado para transportar apenas cargas.

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O incêndio ocorreu justamente por conta do carvão que ele armazenava, levou dias consumindo todo o interior do navio e deixou apenas o casco, de 75 metros de comprimento, parcialmente preservado.

Seria afundado, mas...

Sem mais nenhuma utilidade, o que restou do City of Adelaide foi comprado, como sucata, por um empresário da Ilha Magnetic, com o intuito de ser propositalmente afundado na Baia Cockle, a fim de servir como quebra-mar para conter a força das marés.

Mas não chegou a servir a este propósito.

Quando estava sendo rebocado para o local onde seria afundado, o ex- transatlântico encalhou em um banco de areia da baia e de lá nunca mais saiu.

Foi quando a natureza começou a agir.

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Imagem: Getty Images

Patrimônio Marítimo da Austrália

Tempos depois, arbustos de vegetações cujas sementes foram levadas até o navio pelas aves da Ilha Magnetic - um local tão rico em pássaros que, mais tarde, seria transformado em refúgio da vida silvestre pelo governo da Australia - começaram a brotar no interior do casco do ex-transatlântico, e foram dando forma a um curioso manguezal, que hoje domina os escombros do navio de tal forma, que, visto de longe, ele mais parece, de fato, uma ilha.

Além do verde intenso, a ilha artificial na qual se transformou o casco enferrujado do City of Adelaide, hoje abriga uma impressionante quantidade de aves marinhas e terrestres, o que levou o governo australiano a nomeá-lo Patrimônio Marítimo do país, com severas multas para quem danificar a débil estrutura do navio, ou retirar qualquer pedacinho dele como suvenir - algo que os visitantes da Ilha Magnetic sempre ficam tentados a fazer, quando ficam sabendo que aquela estranha ilha que veem no horizonte é o que restou de um grande transatlântico.

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Imagem: Reprodução/Andy Green Instagram

Para o governo australiano, o City of Adelaide é um interessante exemplo de como os escombros de um velho naufrágio podem se tornar bem mais do que simples resquícios do passado.

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Virou alvo na guerra

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Imagem: Getty Images

Antes disso, porém, o próprio governo da Austrália quase decretou o completo extermínio do navio ao usá-lo como alvo para exercícios de tiro da Força Aérea Australiana, durante a Segunda Guerra Mundial - quando, inclusive, ocorreu a única tragédia envolvendo o ex-transatlântico.

Em fevereiro de 1942, um dos aviões que participavam dos treinamentos colidiu com os restos de um dos mastros do City of Adelaide e matou seus quatro ocupantes.

Foi o único acidente envolvendo a longeva vida do City of Adelaide, que já soma mais de 160 anos - embora, agora, como uma improvável ilha.

Vai virar ilha de fato

Apesar dos contornos do casco ainda estarem mais ou menos preservados, o que restou do outrora elegante vapor vem sofrendo as ações do tempo e da natureza, e é bem provável que daqui há alguns anos ele vire, de fato, o que já aparenta ser: uma ilha, com o manguezal brotando diretamente do solo lodoso da baia, em vez do fundo do casco, cada vez mais desintegrado.

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A cada ano, os ciclones habituais da costa leste australiana fazem a sua parte, e ajudam a deteriorar ainda mais os escombros já colapsados do casco do City of Adelaide.

A cada nova tormenta, mais parte do navio desabam, até que, em um futuro não muito distante, restará apenas a vegetação que hoje já domina praticamente todo o casco carcomido pelo tempo.

Já aconteceu antes

Quando isso acontecer, o City of Adelaide terá completado a sua mutação de navio para ilha, algo que no passado já foi posto em prática intencionalmente pela tripulação de um navio, na Segunda Guerra Mundial.

Mas por outro motivo: enganar o inimigo.

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Imagem: Abraham
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Em fevereiro de 1942, ao se ver cercado pelos aviões japoneses no mar da Indonésia, o caça-minas holandês Abraham Crijnssen usou o recurso de se camuflar de ilha para escapar dos ataques, em uma espetacular manobra, que entrou para a história e que pode ser conferida clicando aqui.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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