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10/10/2008 - 07h00

"Era Nuzman" ajuda a perpetuar cartolas eternos no esporte olímpico

Bruno Doro *
Em São Paulo
Carlos Arthur Nuzman ficará no comando do Comitê Olímpico Brasileiro até 2012, quando completará 17 anos como maior mandatário do esporte nacional. Esse modelo de dirigentes que se eternizam no poder, porém, não é invenção de Nuzman. Ao contrário.



É um modelo enraizado na tradição esportiva brasileira, permitido por lei e que encontra paralelo também na estrutura esportiva internacional. É, também, um formato que permite a permanência de cartolas desmotivados nos cargos, que não estimula novos formatos de gestão e, em casos extremos, pode estimular o clientelismo para a manutenção de status.

LARS GRAEL VÊ TURMA DO VÔLEI
NA LINHA DE SUCESSÃO A NUZMAN
Marcelo Ximenez/Folha Imagem
Eleito para comandar o esporte brasileiro até 2012, Carlos Arthur Nuzman disse, ao final da eleição, que oposição enfraqueceria o Comitê Olímpico Brasileiro. Não é de se espantar, portanto, que apontar nomes para a sucessão do dirigente seja tão difícil.

Questionados sobre quem poderia fazer frente ao cartola, dirigentes e ex-atletas têm dificuldades em apontar nomes. Lars Grael, que quando assumiu a Confederação Brasileira de Vela e Motor em 2007 ouviu rumores de que o seu nome poderia virar uma alternativa para o COB, foi um dos poucos que deu nomes aos possíveis sucessores.
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"Eu não faço críticas nominais, mas sou contra o atual formato. Eu admito que a pessoa pode se perpetuar e mesmo assim fazer um bom trabalho. Mas eu sou a favor da oxigenação", diz Aurélio Miguel, primeiro brasileiro campeão olímpico do judô, em Seul-1988, e um dos maiores críticos do formato.

Lars Grael, medalhista olímpico e ex-presidente da Confederação Brasileira de Vela e Motor, é outro crítico. "É sempre saudável ter oposição. Temos de fugir da imagem de capitanias hereditárias no esporte. Com rodízio, vem também o desenvolvimento", afirma o velejador.

Segundo ele, o sistema atual é pouco participativo, excluindo o principal "ator" do esporte: o atleta. "O colégio eleitoral que escolhe os dirigentes esportivos é muito pequeno. A confederação é eleita pelas federações estaduais e esse formato permite o clientelismo. O protagonista do esporte, o atleta, não tem acesso ao voto", completa Grael.

Os dois, inclusive, apresentam a mesma proposta para solucionar o problema: obrigar, por lei, um rodízio de dirigentes. Aurélio e Lars já apoiaram uma proposta, que não foi aprovada, que regulamentaria eleições nas confederações esportivas. No projeto, o presidente eleito só poderia se candidatar a uma reeleição, cada mandato teria apenas quatro anos e o número de votantes aumentaria, com a inclusão de clubes, associações e atletas - hoje, só as federações estaduais participam da eleição na maioria das entidades.

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"Um dirigente que faz um bom trabalho fica quatro anos, pode se eleger para mais quatro, fazer seu sucessor e depois voltar ao cargo. Se o Fernando Henrique quiser voltar em 2010, ele pode voltar (para a Presidência). A mesma coisa acontece com o Lula para 2014. Esse processo é democrático", explica Aurélio.

Quem está no comando das entidades, surpreendentemente, também concorda com o fato, como Luiz Boselli, na Confederação de Boxe há 11 anos. "A continuidade tem vantagens e desvantagens. A vantagem na permanência é a experiência e o reconhecimento internacional. Com isso, o dirigente pode ocupar cargos nas federações internacionais e isso é benéfico para o esporte. Mas é claro que uma mesma pessoa em um mesmo cargo acaba freando a entrada de sangue novo, de novas idéias. Não há renovação nem mudança".

O dirigente, porém, coloca entraves para deixar o poder. "Mas é bom frisar: quem entra, tem de fazer um trabalho melhor. Se é para fazer um trabalho pior do que o que está sendo feito, é melhor nem mudar".

Esse discurso encontra ecos na maioria das entidades. Ao final do ciclo de Pequim-2008, o esporte olímpico brasileiro ostenta uma série de cartolas longevos. Em algumas entidades, dirigentes estão no poder há 21 anos, caso de Roberto Gesta de Mello, do atletismo, e Yong Min Kim, o Mestre Kim, do taekwondo.

Internacionalmente é a mesma coisa. Na Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos, por exemplo, Coaracy Nunes já leva 20 anos como presidente. No período, a Fina, o correspondente mundial da CBDA, também teve só um mandatário, Mustapha Larfaoui, da Argélia, eleito em 1988 como Coaracy.

"Essa é uma questão polêmica. Um argumento favorável a essa situação é que as confederações espelham a realidade internacional e no COI e nas federações, dirigentes também se perpetuam por mais de 20 anos. Mas como atleta e dirigente, eu defendo um rodízio maior", diz Lars Grael.

*Colaborou Rodrigo Farah e Fernando Narazaki

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