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Simone Biles, quando falar libera a pressão da competição

28/07/2021 08h49

Tóquio, 28 Jul 2021 (AFP) - Por muito tempo, os atletas de alto nível guardaram suas tempestades para si mesmos, para revelá-las quando suas carreiras terminassem. Mas, seguindo o exemplo da tenista Naomi Osaka, a superestrela da ginástica Simone Biles revelou os "demônios em sua cabeça" na terça-feira (27).

Com sua impressionante coleção de recordes e títulos, Michael Phelps é uma lenda da natação e dos esportes, quase um alienígena. Até que o americano das 28 medalhas olímpicas, 23 de ouro, humanizou-se em 2018, dois anos após sua aposentadoria definitiva das piscinas, revelando que havia sofrido de depressão durante a carreira e abusado do álcool para tentar escapar da ansiedade.

"Eu simplesmente não confio tanto em mim quanto antes. Tenho a impressão de que não me divirto tanto quanto antes. Tenho que fazer o que é bom para mim e me concentrar na minha saúde mental", explicou Biles na terça-feira, entre lágrimas e sorrisos.

As imagens de Biles "partiram o coração" de Phelps, disse esta outra lenda do esporte, à rede de televisão americana NBC.

"Os Jogos são algo que pode sobrecarregar você, há muita emoção em jogo, eu poderia falar sobre isso por horas", afirmou o ex-nadador, que virou comentarista de televisão.

E, mesmo que tente há anos sensibilizar autoridades e atletas sobre a importância do acompanhamento psicológico, Phelps sabe que ainda há muito a melhorar. Para os atletas, em primeiro lugar, no que diz respeito a reconhecer suas fraquezas e fragilidades, sem que isso comprometa sua reputação, ou seu desempenho futuro.

"Você tem que poder pedir ajuda, quando está passando por períodos difíceis. É algo que tive dificuldade em fazer durante a minha carreira", aconselhou Phelps.

"Espero que o que acontece (com a Simone) permita que as pessoas abram os olhos. Ninguém é perfeito. Às vezes é bom não se sentir bem", acrescentou o atleta com mais ouros e medalhas da história olímpica.

Antes de Biles, foi a tenista Naomi Osaka que reconheceu ter sofrido períodos de depressão.

Em maio, a japonesa chocou em Roland Garros, recusando-se a participar de coletivas de imprensa antes de se retirar após a primeira rodada.

Ela então explicou que vinha passando por "longos períodos de depressão" desde que venceu o US Open 2018, o primeiro de seus quatro títulos de Grand Slam.

De acordo com Julie-Ann Tullberg, uma psicóloga esportiva da Monash University, na Austrália, "a questão da saúde mental há muito tempo tem sido subestimada como causa do mau desempenho em um ambiente esportivo tão intenso quanto as Olimpíadas".

"Agora, os atletas querem falar sobre essa pressão de forma aberta e livremente", acrescentou, em entrevista à AFP.

Em um contexto específico, devido à pandemia de covid-19, os atletas se sentem mais vulneráveis: primeiro, ficaram sem competir, ou treinar, e depois, ainda tiveram de fazer isso sozinhos.

Seus parentes não estão nesses Jogos, porque as autoridades japonesas decidiram limitar o número de visitantes ao máximo para evitar a disseminação do coronavírus.

Encontram-se instalados em uma Vila Olímpica em "modo pandêmico", com máscaras obrigatórias e interações muito limitadas, sem poderem sair do circuito dos Jogos, o qual se retringe às competições e à hospedagem.

"A bolha da Vila Olímpica tem um grande impacto nos atletas. Eles estão acostumados a sair e em Tóquio não podem", explica Julie-Ann Tullberg.

Longe de sua família, Biles parece ter perdido todo apoio que fez dela uma lenda. Sua recuperação nos próximos dias definirá sua continuidade em Tóquio-2020.

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