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Final da Copa do Rei: quando a política entra em campo

20/05/2016 16h45

Barcelona, 20 Mai 2016 (AFP) - O debate político irrompeu nas arquibancadas do futebol espanhol, a dois dias da final da Copa do Rei entre Barcelona e Sevilha pela polêmica proibição de entrar com bandeiras independentistas catalãs, que logo foi descartada.

A polêmica estourou na quarta-feira, quando a delegação do governo de Madri decidiu proibir a entrada destas bandeiras no estádio Vicente Calderón, do Atlético de Madri, onde será disputada a final no domingo às 21H30 locais (16H30 de Brasília).

A medida foi justificada por uma lei de 2007 que proíbe a entrada de símbolos "que fomentem a violência" ou "constituam um ato de desprezo às pessoas participantes do espetáculo esportivo".

Mas nesta sexta-feira, um tribunal de Madri, considerando um recurso apresentado por uma associação independentista, decidiu tirar a proibição, alegando que não está provado que esta bandeira "possa incitar a violência, o racismo, a xenofobia ou qualquer outra forma de discriminação".

A decisão, entretanto, não é definitiva, pois o Barça, que comemorou nesta sexta a decisão judicial, apresentou seu próprio recurso. Este deve ser julgado por outro tribunal madrilenho e o veredito poderia ser contraditório à primeira sentença.

- Barça, um clube político -Nos últimos anos de auge independentista na Catalunha, estas bandeiras, formadas por um triângulo azul com uma estrela branca sobre franjas amarelas e vermelhas, se converteram em um mosaico habitual no estádio Camp Nou.

Também, desde 2009, torcedores acompanhavam o símbolo de sonoras vaias durante hino da Espanha e ao Rei em cada final que disputam nesta competição, o que gerou aborrecimento por parte dos partidários da unidade do país.

A decisão de proibir a bandeira independentista "pretende que não existe outra rivalidade que não a estritamente esportiva", defendeu nesta sexta-feira a vice-presidente do governo conservador espanhol, Soraya Sáenz de Santamaría.

Mas a Catalunha entendeu como um ataque à liberdade de expressão. O presidente catalão Carles Puigdemont e a prefeita de Barcelona Ada Colau ameaçaram não assistir à partida e inclusive o líder do partido conservador, Xavier García Albiol, discordou da decisão.

"É uma partida de futebol, temos que desfrutar do futebol. Deixemos de politizar todas essas coisas", insistiu a vice-presidente.

Mas no caso do Barcelona, é difícil dissociar o esporte da política.

Durante a ditadura de Francisco Franco (1939-1975), que reprimia severamente os nacionalismos, o Camp Nou se converteu em um reduto de liberdade onde se podia falar catalão e onde as escassas conquistas esportivas se viviam como uma vitória política sobre o regime.

"O lema do Barcelona 'mais que um clube' está certo, representa algo além do esporte e isso é inegável", assegura o jornalista inglês John Carlin.

- Política e esporte de mãos juntas - "Seria estúpido sugerir que esporte e política não podem se misturar (...) Não pode separá-los, os que pensam isso não muito inocentes", assegura à AFP o professor de Política e Esporte da Universidade de Birmingham (Reino Unido), Paul Michael Brannagan.

Os exemplos históricos são inúmeros: Adolf Hitler e sua tentativa de mostrar o domínio da "raça ariana" nos Jogos Olímpicos de Berlim em 1936, o boicote dos Estados Unidos a Moscou em 1980 e depois a resposta soviética em Los Angeles em 1984, ou a vitória da Argentina sobre a Inglaterra nas quartas-de-final da Copa do Mundo em 1986 após a guerra das Malvinas.

"E agora veja a Rússia, Catar ou Brasil: Por que querem receber um Mundial ou as Olimpíadas? Para demostrar quem são e que podem ser atores globais", acrescentou Brannagan.

"O esporte, especialmente o futebol, move as emoções como pouquíssimas atividades conseguem fazer e é muito fácil utilizá-las para fins políticos", explica Carlin, que em seu livro "El Factor Humano" relata como o presidente sul-africano Nelson Mandela utilizou a Copa do Mundo de rúgbi em seu país para reunificar uma sociedade dividida pelo apartheid.

"Ainda que neste caso seja gerado o contrário do que fez Mandela. Isto vai gerar todavia mais antagonismo entre a Espanha e a Catalunha", explicou.