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Rio-2016 sob o fantasma da crise política brasileira

26/04/2016 13h02

Rio de Janeiro, 26 Abr 2016 (AFP) - Os fantasmas do impeachment, da corrupção, da recessão e da incerteza pairam sobre os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, que começam a contagem regressiva dos 100 dias para seu início.

Ninguém duvida de que os Jogos vão acontecer, a dúvida é saber em que condições isso se dará.

"Estes Jogos Olímpicos serão uma mensagem de esperança em tempos difíceis", afirmou o presidente do COI, Thomas Bach, antes do acendimento da tocha olímpica na Grécia.

Mas ainda restam muitas perguntas, em um horizonte sombrio.

. Quem inaugurará os Jogos - O chefe de Estado do país sede é quem declara aberto o evento. A rainha Elizabeth II, por exemplo, se vestiu de "Bond girl" para inaugurar a edição de Londres-2012.

No Brasil, o Senado deve votar, com grande grau de possibilidade, a abertura do julgamento de impeachment de Dilma Rousseff, em meados de maio. A presidente seria, neste caso, afastada do cargo, deixando para seu vice, Michel Temer, a responsabilidade de inaugurar os Jogos.

Dilma foi vaiada durante a abertura do Mundial-2014. Temer tem índices baixíssimos de aprovação (1% a 2% de intenção de voto, segundo o Datafolha) e poderá sofrer o mesmo vexame.

E tampouco será recebido de braços abertos pela comunidade internacional, como explica Michael Mohallen, doutor em direito público e professor da FGV.

"Aumentaram as críticas da OEA, Unasul, e alguns países veem com reservas o processo brasileiro. E é provável que muitos líderes não queiram participar nos Jogos", afirmou.

. Risco de manifestações -Dilma denuncia o impeachment como golpe, orquestrado pelo "conspirador" Temer. O PT diz que, no caso de saída da presidente, levará a luta para as ruas, evocando o fantasma das manifestações de 2013 contra os gastos com o Mundial e a exigência de melhores serviços públicos.

Atualmente, as manifestações a favor e contra Dilma ocupam mais os brasileiros do que os preparativos para os Jogos.

Mohallen descarta que o PT convoque manifestações contra os Jogos, pois sempre foi muito crítico em relação aos protestos contra a Copa. Além disso, Dilma sancionou recentemente uma lei contra o terrorismo, que, segundo seus críticos, "criminaliza" o direito ao protesto.

De qualquer forma, "os movimentos sociais certamente farão protestos, como farão se Dilma estiver no poder", afirma o especialista.

. Vista grossa à corrupção - A fraude na Petrobras foi realizada pelas maiores construtoras do país, que pagaram subornos a executivos e políticos para garantir contratos na companhia petrolífera.

Muitas destas empresas são precisamente as responsáveis pelas obras olímpicas e de melhorias da cidade, no âmbito do evento.

A operação Lava Jato, que investiga o caso Petrobras, revelou no fim de março suspeitas em torno a uma destas obras no Rio: a revitalização da zona portuária, convertida em polo turístico, e a expansão do metrô. As autoridades negaram qualquer irregularidade.

Uma comissão investigará a suposta fraude nos contratos destas obras, incluindo a de uma ciclovia que desabou apenas três meses depois de ter sido inaugurada, deixando dois mortos.

Pedro Trengrouse, assessor da ONU durante a Copa e coordenador do curso de direito esportivo na FGV, disse à AFP que o COI deve questionar os contratos olímpicos e "não fazer vista grossa com isso, porque é depositário dos valores éticos e morais que o esporte deve transmitir".

. A recessão afeta os Jogos - O Brasil está longe de ser aquela potência que em 2009 foi escolhida como sede dos primeiros Jogos da América do Sul.

O PIB brasileiro caiu 3,8% em 2015, sua maior redução em 25 anos, e o mercado e o FMI estimam que a contração será da mesma magnitude em 2016.

A crise tem grande impacto no estado do Rio de Janeiro, onde a falta de liquidez levou inclusive a atrasos no pagamento de salários de funcionários públicos, como policiais, assim como de seus aposentados, que já protestaram.

O governo do estado explica que sua situação "trágica", segundo a definição do governador interino Francisco Dornelles, responde à queda dos preços do petróleo e à paralisação da indústria pelo escândalo da Petrobras, mas se comprometeu a pagar todas as suas obrigações.

A este panorama, se somam os mais de 30.000 trabalhadores das obras olímpicas que passarão a engrossar o desemprego do país (6,8% no fim de 2015) que tenta sobreviver ao buraco da crise.