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Para especialista, 90% das manipulações de resultados são evitáveis

No meio do escândalo do tênis, o ex-atleta Nick Lindahl admitiu ter perdido de propósito em sua participação no torneio Toowoomba Futures, em 2013 - STRINGER/REUTERS
No meio do escândalo do tênis, o ex-atleta Nick Lindahl admitiu ter perdido de propósito em sua participação no torneio Toowoomba Futures, em 2013 Imagem: STRINGER/REUTERS

26/01/2016 12h02

Doutor em criminologia e autor de várias obras sobre manipulação de resultados, o jornalista canadense Declan Hill estima que a maioria dos casos de falcatruas no esporte poderia ser evitada se a luta contra a corrupção fosse responsabilidade de uma agência independente e não das próprias entidades esportivas.

P: Essas novas acusações de manipulação de resultados no tênis são mesmo algo surpreendente ou fazem cada vez mais parte do esporte?

R: "Sempre houve manipulação de resultados no esporte, desde os Jogos Olímpicos da antiguidade... Mas, nesses últimos dez anos, estamos assistindo a um fenômeno inédito com a mundialização do mercado das apostas on-line. Centenas de bilhões de dólares circulam pelo mundo via apostas em campeonatos e esportes em que ninguém jamais pensou em apostar no passado. De todos os esportes, o tênis é sem dúvida o mais fácil de se manipular".

P: Por quê?

R: "O futebol é intrinsecamente difícil de se manipular. É um esporte de equipe com muitas variáveis, 11 jogadores com um goleiro, muitos árbitros, técnicos, espectadores... Isso não significa que não exista manipulação, mas é difícil. No tênis, é muito simples: são dois indivíduos que jogam um contra o outro e, em algum momento da partida, um dos dois pode torcer o tornozelo, virar para o árbitro e dizer: 'Sinto muito, não posso continuar'. Bingo!".

P: Devemos temer pela credibilidade do esporte?

R: "Ou resolvemos o problema, ou de fato a credibilidade do esporte estará seriamente ameaçada. E mais do que pelo doping. Está acontecendo a mesma coisa do que com doping antes da criação da Wada (Agência Mundial Antidoping): os dirigentes esportivos ou são incompetentes, ou são corruptos. Quem são os encarregados de pagar os responsáveis pela ética no esporte?".

P: Você é favorável à criação de uma agência mundial independente contra a manipulação de resultados, seguindo o exemplo da Wada?

R: "Sim, as empresas de apostas deveriam repassar uma ínfima parte de suas receitas, talvez 0,25%, à criação de uma agência independente nos mesmos moldes da Wada para o doping. Todos os avanços significativos em relação ao doping foram realizados por pessoas independentes, não pelo meio esportivo. Este último poderia exigir coisas das empresas de apostas, que, em sua maioria, buscam legitimidade. 'Se vocês querem apostar no nosso esporte, se vocês querem patrocinar nossas equipes, então queremos as seguintes informações: quem aposta no nosso esporte e como? Se um famoso técnico do Campeonato Inglês aposta em jogos, queremos saber. Nós queremos que eles saibam que nós sabemos'. Isso são coisas simples de realizar. A indústria do jogo é parte da solução. Ela só precisa ser abordada da maneira certa".

P: Você acredita que é possível, então, acabar com essas práticas nefastas?

R: "Sim. 90% das manipulações de resultados podem ser evitadas, 90% das vezes, mas os responsáveis pela luta contra a corrupção não querem, eles ficariam desempregados. Sempre haverá corrupção no esporte, é da natureza humana, mas sim, é possível acabar com as manipulações maciças que são resultado do colossal mercado das apostas on-line. Podemos fazer isso com facilidade".