Doença 'apresentou' longboard, ela virou campeã e faz vaquinha por torneio

"É vencendo os limites, escalando as fortalezas / Conquistando o impossível pela fé". Esse é um trecho da música 'Conquistando o Impossível', interpretada pela cantora gospel Jamily e que embala a surfista Luana Soares.

Nascida em uma comunidade caiçara em Camburi, Ubatuba, ela sempre se sentiu à vontade no mar e, ainda bem cedo, passou a domar as ondas em cima de uma prancha. Um diagnóstico médico, porém, a afastou das águas. A jovem imaginava que o surfe ficaria apenas nas lembranças, mas foi neste cenário que surgiu o longboard e a segurança que precisava para retomar o sonho.

Tive contato com uma prancha pela primeira vez aos 5 anos. Subi e peguei minha primeira onda. A partir dali, comecei a participar da escolinha de surfe na vila onde moro. Aos 11 anos, passei a competir, mas quando tinha de 13 para 14 anos comecei a ter crises e fui diagnosticada com epilepsia. Parei de surfar por quase um ano.
Luana Soares

"No começo, foi bem difícil. O meu professor da época tinha ido para a Costa Rica. Depois, começaram as crises. Em minha cabeça, o surfe não era mais para mim. Sou criada no evangelho e mantive minha fé, orava e perguntava a Deus. Quando veio o longboard, voltei a me sentir leve", completou.

Ela relata que sentia dores de cabeça desde muito nova, mas exames não apontavam causas preocupantes, e pensava-se serem consequências da miopia. Uma tia materna já tinha sido diagnosticada, ainda na infância, com epilepsia.

O Longboard trouxe segurança para mim por ser uma prancha maior, ter mais espaço, trazer uma confiança de você fazer o drop, se sentir mais estável. Fui passo a passo, vendo outras pessoas também, observando o movimento dos pés, manobras, e tudo caminhou de forma natural.

Luana foi observada por Jefson Silva, um dos grandes nomes do longboard brasileiro. O tetracampeão brasileiro indicou o rumo à jovem, que passou a competir na modalidade aos 17 anos. No ano passado, com 20, ela levou o primeiro título nacional — é também bicampeã sul-americana.

"Sempre tive na pele essa coisa da competição, participo desde pequenininha. Estou aqui correndo atrás. É difícil, não é fácil ser atleta, mas luto com as minhas forçar para poder viver isso", disse.

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Uma das inspirações da brasileira é a surfista norte-americana Bethany Hamilton, que perdeu o braço esquerdo aos 13 anos em um ataque de tubarão. "A admiro pela determinação, por tudo que ela passou e, mesmo assim, nunca ter desistido do surfe, trouxe coisas novas para a vida. É uma guerreira, uma pessoa incrível. Não é do long, mas me inspiro muito nela. Apesar da limitação, o que ela faz na água..."

Vaquinha para torneio

Luana lançou uma campanha para conseguir disputar o Mundial de Longboard da WSL. Ela criou uma vaquinha online e busca recursos para poder disputar as etapas da Austrália, Abu Dhabi e El Salvador.

Atualmente, Luana conta com o patrocínio de uma marca de açaí e, com esse recurso, ela poderá estar no evento da Califórnia, Estados Unidos, mas a partir daí o calendário se torna uma incógnita.

São quatro etapas e é um custo muito alto. Fiz a vaquinha para poder correr todo o Mundial. Tenho essa primeira ajuda para Califórnia, mas não quero desistir. Colocamos uma meta de R$ 60 mil, mas acredito que os custos serão até mais altos que isso. e não temos tanto tempo, já que a segunda etapa começa em setembro.

A atleta lamenta que a ascensão do surfe no Brasil, capitaneado pela "brazilian storm", não tem tido reflexos no longboard. "O long é um surfe totalmente diferente da pranchinha, e há um olhar com certo preconceito. O surfe está crescendo, mas o long ainda está ganhando espaço, conquistando pouco a pouco. Não se é dado tanto valor. Fui à Califórnia e presenciei o quanto eles valorizam o longboard por lá. Não consigo entender essa desvalorização, principalmente em premiação das competições nacionais"

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Superou preconceito por tratamento

Luana faz tratamento com canabidiol, também conhecido por CBD, que, segundo documento do Ministério da Saúde, "é um dos constituintes químicos de uma planta denominada Cannabis, que apresenta potencial terapêutico para algumas doenças, dentre essas a epilepsia". Ele atua em uma parte do cérebro chamada "sistema endocanabinoide", que, entre outras coisas, exerce funções reguladoras no Sistema Nervoso Central (SNC).

"No começo das minhas crises epiléticas fiz vários exames e tomei várias medicações, e experimentei o canabidiol. Tive muitos episódios na minha vida que foram horríveis e o canabidiol mudou isso, trouxe um estado parecido ao que eu era antes dos 13 anos".

A surfista admite que teve de superar certo preconceito no começo do tratamento. "Foi uma parte difícil porque a minha família é religiosa. Até entenderem que era um estudo feito com a planta da maconha, ter toda uma informação correta e segurança... Eu queria que todo mundo soubesse o quanto isso mudou minha vida. A minha família demorou para ter essa certeza e acreditar, mas hoje eles estão todos comigo e acreditam na cura dessa planta".

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