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COI cede à pressão, admite adiar Olimpíada e pede um mês para tomar decisão

Thomas Bach, presidente do COI - Denis Balibouse/Reuters
Thomas Bach, presidente do COI Imagem: Denis Balibouse/Reuters

Demétrio Vecchioli

Do UOL, em São Paulo

22/03/2020 14h52

Resumo da notícia

  • Presidente do COI enviou carta admitindo possibilidade de adiamento da Olimpíada
  • Bach afirma que COI estipulou prazo de quatro semanas para tomar uma decisão
  • Entidade foi pressionada nos últimos dias por atletas, federações e comitês olímpicos
  • Dirigente afirma que ainda não é possível uma decisão final devido ao covid-19

A pressão dos atletas parece ter feito o Comitê Olímpico Internacional (COI) repensar sua posição. Neste domingo, em reunião extraordinária por videoconferência, o Conselho Executivo da entidade decidiu iniciar as discussões para que os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 sejam adiados e não comecem na data prevista de 24 de julho.

O próprio COI se deu quatro semanas, pouco menos de um mês, para que a decisão final seja tomada. Nesse meio tempo, deve alinhar os interesses de federações, comitê olímpicos, detentores dos direitos de televisão, patrocinadores, do governo japonês e de dezenas ou centenas de outros envolvidos. Há muitos pontos a se resolver, como a entrega dos apartamentos da Vila Olímpica aos novos proprietários e as milhares de reservas de hotel.

"Juntamente com todas as partes interessadas, iniciamos discussões detalhadas hoje (22) para concluir nossa avaliação do rápido desenvolvimento da situação mundial da saúde e seu impacto nos Jogos Olímpicos, incluindo um cenário de adiamento. Estamos trabalhando muito e estamos confiantes de que teremos finalizado essas discussões nas próximas quatro semanas", disse, em carta aos atletas, o presidente Thomas Bach, após a reunião. Ele ressaltou que cancelar a Olimpíada de Tóquio está fora de cogitação.

De forma geral, porém, a carta é mais do mesmo: Bach defendendo cautela para manter os Jogos como planejados. Criticado por não olhar o dilema sob a ótica do atleta, Bach, que foi medalhista olímpico na esgrima pela Alemanha, usou seu exemplo pessoal para defender a cautela do comitê.

"Em circunstâncias muito diferentes e por razões muito diferentes, tive uma experiência de incerteza como atleta nos preparativos para os Jogos Olímpicos de Moscou, em 1980. Não sabíamos se os Jogos aconteceriam e se poderíamos participar. Francamente, eu preferiria que os tomadores de decisão tivessem levado mais tempo para decidir sobre uma base de informações mais sólida", pontuou.

Em um recado que parece ser a quem reclama estar impedido de treinar, Bach lembrou que, da mesma forma que há quem esteja sendo prejudicado pelo coronavírus, há também quem queira a Olimpíada em julho.

"O caminho para Tóquio é muito diferente para cada um de vocês, vindo de 206 comitês olímpicos nacionais. Muitos de vocês não podem se preparar e treinar da maneira que estão acostumados, ou nem mesmo por causa das medidas anti-Covid-19 em seu país. Muitos de vocês estão treinando e estão ansiosos para tornar seu sonho olímpico realidade. Muitos de vocês já estão qualificados para os Jogos", lembrou.

A nova postura do COI fecha uma semana em que o comitê teve diversas reuniões no sentido exatamente o oposto, de que ainda era cedo para discutir o adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio. Mas os planos foram alterados depois que diversos stakeholders importantes do movimento olímpico começaram a se pronunciar publicamente a favor do adiamento para 2021, o que inclusive não é previsto na "constituição" do COI, a Carta Olímpica.

Após a primeira das muitas reuniões da semana, na segunda-feira (16), com as federações internacionais olímpicas, diretamente interessadas na manutenção dos Jogos por questões financeiras (o adiamento para 2021 geraria sobreposição com o calendário de Mundiais previstos para o ano que vem), o COI soltou comunicado afirmando que era cedo para tomar qualquer decisão. O presidente do órgão, Thomas Bach, chegou a pedir que os atletas continuassem treinando.

A postura do COI, reforçada nos dias seguintes, após reuniões com os comitês olímpicos nacionais (NOC's, na sigla em inglês) e com um grupo de atletas, causou revolta. O nadador brasileiro Bruno Fratus e o comitê olímpico espanhol foram dos primeiros a negar que houvesse unanimidade na decisão do COI e passaram a defender publicamente o adiamento dos Jogos para 2021. No Brasil, o COB (olímpico) e o CPB (paraolímpico) se declararam favoráveis.

Nos Estados Unidos, tanto a federação de atletismo quanto a de natação enviaram cartas ao Comitê Olímpico e Paraolímpico norte-americano pedindo que intercedesse junto ao COI pelo adiamento. Somadas, essas federações venceriam os Jogos do Rio no quadro de medalhas, com mais ouros do que qualquer outro país, incluindo todo o resto dos Estados Unidos.

Outros comitês olímpicos também se juntaram à campanha Tóquio-2021, como da Noruega. Na Alemanha, a poderosa associação de atletas olímpicos, talvez a mais influente do mundo, pediu publicamente o adiamento. Federações nacionais com a francesa de natação e a espanhola de futebol também.

A Olimpíada em 2020 é cada vez mais insustentável por uma série de razões, a começar que atletas estão proibidos de treinar em diversos países. Continuar treinando, desafiando as normas sanitárias, é perigoso e, em muitos casos, ilegal. Mas há outras razões: a opinião pública japonesa começa a se posicionar de forma contrária aos Jogos, com medo de estrangeiros levarem o vírus de volta ao Japão. Países tendem a ampliar as barreiras em fronteiras. A Austrália, por exemplo, estará trancada até depois dos Jogos. Além disso, o controle antidoping está paralisado, o que não permite que os Jogos em julho aconteçam sob o "jogo limpo".